Por: Silvério da Costa Oliveira.
Christian Wolff
(1679-1754), nasceu em Breslau (Breslau em alemão, e Breslávia em polaco), Polônia
(nos dias atuais), filósofo alemão que teve grande influência e repercussão no
meio acadêmico e filosófico em sua época e região. Para ele a filosofia se
mostra como um saber organizado e baseado no exame racional de conceitos. O
campo de estudo da filosofia abarca todas as coisas possíveis, ou seja, que não
sejam contraditórias, bem como das causas e modos da possibilidade destas
coisas. Além da influência da filosofia de Leibniz, há com certeza em Wolff a
presença da tradição filosófica da escolástica e podemos mesmo pensar no
trabalho filosófico de Wolff como uma tentativa de renovação desta tradição
diante do confronto provocado pela propagação da obra de Descartes e de sua
ênfase sobre a necessidade do conhecimento se pautar em ideias claras e
distintas. Quando Wolff apresenta os princípios de sua filosofia primeira, ele
o faz se colocando diante deste embate e realçando a importância dos princípios
de contradição e de razão suficiente.
Dentre suas
principais obras, podemos destacar: “Metafísica alemã”, 1720, “Discurso
preliminar sobre a filosofia em geral” (Lógica latina), 1728, “Filosofia
primeira, ou ontologia, tratado do método científico” (Ontologia latina), 1730.
Sua obra é bem vasta e inclui diversos manuais e cursos de filosofia e
matemática elaborados para atender as necessidades de sua atividade como
docente. Fizeram muito sucesso à época, pois antes dos mesmos não havia
material semelhante em língua alemã.
Além de sua
importância na filosofia e no movimento do Racionalismo, bem como na Ilustração
alemã, cabe destaque também sua importância na história da psicologia e de ter
sido o introdutor de alguns conceitos nesta área, tais como: “atenção”, “consciência”,
“representação”, além de sua divisão entre psicologia racional e empírica, que
irá ter repercussão nas discussões e trabalhos posteriores e na estruturação da
formação da psicologia enquanto ciência. Mesmo a psicometria há de ter uma
dívida para com este filósofo.
Importante para
a história da psicologia é o trabalho desenvolvido por Wolff em particular em
dois de seus livros, “Psychologia empírica”, de 1732 e “Psychologia
Rationalis”, de 1734. Na primeira obra se propõe a organizar de modo
hierárquico as nossas faculdades mentais, tais como a sensação, a memória, a
imaginação e a vontade. Já na segunda obra, Wolff se mantem mais próximo de
Leibniz ao defender a ideia de harmonia pré-estabelecida entre corpo e alma,
bem como aos seus conhecimentos sobre escolástica. A novidade da popularização
do termo “psicologia” cabe a Wolff com suas obras e trabalho.
No período de
tempo entre Leibniz e Kant podemos afirmar que Wolff foi o mais importante e
reconhecido filósofo alemão, tendo exercido considerada influência no meio
acadêmico e filosófico. Pouco antes de seu falecimento, no entanto, digamos,
após 1740, sua influência na Alemanha de então começou rapidamente a ceder
lugar aos filósofos ingleses e franceses.
Fato
interessante e também marcante para o século XVIII foi a ordem dada pelo rei da
Prússia, Frederico Guilherme I, de expulsão de Wolff da universidade de Halle
onde lecionava, e do território prussiano. Ele deveria sair da Prússia em 48
horas ou seria enforcado. Seus livros foram proibidos e não se podia vende-los
ou serem usados nos estudos universitários. Isto mobilizou muito os meios
acadêmicos e filosóficos do século XVIII, sendo provavelmente o assunto mais
debatido e que mais escandalizou o século até o advento da revolução francesa.
Wolff se mudou para a universidade de Marburg, onde lecionou por 17 anos até a
morte do rei e sua substituição por seu filho, Frederico o grande, que o chamou
de volta e nesta ocasião foi recebido com grande pompa no ano de 1740. Apesar
de sua grande fama e prestígio e de seu retorno triunfal, a partir desta data
sua obra e pessoa vai aos poucos cedendo lugar a um interesse cada vez maior
nos filósofos ingleses e franceses.
Wolff escrevia
em alemão e também em latim. Seus escritos em latim visavam comunicar sua obra
filosófica ao restante do mundo erudito, pois, o latim era uma língua de uso
comum entre os eruditos e filósofos de sua época, já seus escritos em alemão
vieram a marcar profundamente a língua alemã, criando termos novos e
proporcionando que esta se tornasse uma linguagem própria para a instrução
acadêmica e a pesquisa.
Wolff apresenta
como prova de nossa existência um silogismo, no qual temos:
Quem tem
consciência de si mesmo e de outras coisas, existe.
Somos
conscientes de nós mesmos e de outras coisas.
Logo, nós
existimos.
Deste modo e por
tal silogismo, temos na primeira premissa algumas definições cujo entendimento
torna a premissa clara e verdadeira, na segunda premissa temos uma experiência
indubitável e por último um axioma, formando uma prova da qual não é possível
restar qualquer dúvida.
Segundo o
pensamento de Wolff, toda verdade se origina, em uma ordem, de sua precedente,
sendo as primeiras verdades o princípio de contradição e a razão suficiente
(segundo o qual, tudo o que existe ou acontece possui uma razão para tal), no
entanto, Wolff não negligencia o papel da experiência, entendendo que todo
conhecimento possui uma origem sensível, não havendo ideias inatas. Segundo o
pensamento de Wolff, todo o real é racional e todo racional é real. Já a
finalidade da filosofia se encontra em obtermos a felicidade, a qual pode ser
obtida por nós, seres humanos, por meio do conhecimento claro, onde temos ordem
e disposição regular. Cabe destacar, também, que Wolff não admite a harmonia
pré-estabelecida proposta por Leibniz, há aqui um quase consenso entre os
estudiosos de Wolff que apesar dele ter sido influenciado pelo seu contato
inicial com Leibniz e de poder ter feito uso da harmonia pré-estabelecida em
escritos iniciais, aos poucos vai se afastando e abandonando esta abordagem.
Na ética, no
tocante ao relacionamento com outras pessoas e dentro da sociedade, Wolff
buscava encontrar regras de convivência que pudessem valer mesmo na ausência de
um deus para lhes dar suporte, tal o caso, por exemplo, do argumento: “Faz o
que te torna mais perfeito e ao teu próximo, e abstém-se do contrário”. Por tal
regra percebemos uma ética com base no indivíduo e na natureza, onde basta a
autoridade da razão. Segundo o pensamento de Wolff, dever e direito são coisas inter-relacionadas,
pois, a cada direito que possuímos, corresponde um dever. O ser humano moral é
sujeito de obrigações e direitos. Há, portanto, obrigações e direitos naturais,
oriundos de nossa condição humana, e outros adquiridos pelo convívio em
sociedade e decorrentes de um contrato pelo qual os seres humanos se propõe a
contribuir para o bem comum. Disto podemos deduzir a seguinte regra de conduta
social: “Faça tudo quanto possa para contribuir com o bem-estar geral e a
manutenção da ordem pública e a prosperidade comum”.
O conhecimento
humano pode se dar por três níveis, sendo o primeiro chamado por Wolff de
História, mas não se trata da ciência da História como a entendemos hoje e sim
do conhecimento baseado na experiência cotidiana dos fatos observados, como o
nascer e pôr do sol, dentre outros. Em segundo teríamos a filosofia e em
terceiro a matemática. Enquanto para muitos basta constatar a experiência comum
e diária dos fatos que ocorrem, para outros é necessário entender o porquê dos
mesmos e é aí que entra a filosofia, em seguida, cabe mensurar tais fatos e
neste momento temos a presença da matemática. O modelo ideal de conhecimento
ultrapassa o meramente dado pela observação dos fatos pelos sentidos e requer a
união entre a filosofia e a matemática. Deste modo, temos três gêneros do
conhecimento: histórico, filosófico e matemático, ou se preferirem, o conhecimento
dos fatos, o conhecimento da razão dos fatos e o conhecimento da quantidade dos
fatos.
Wolff divide a
filosofia teórica em três partes, visando estudar os três entes por nós
humanos, conhecidos, a saber: Deus, a alma humana, e as coisas materiais. Para
cada um destes entes teremos uma ciência para o seu estudo, deste modo, para
Deus teremos a teologia natural, para a alma humana teremos a psicologia e para
as coisas materiais (os corpos) teremos a física.
Os princípios da
contradição e da razão suficiente são de suma importância para o bom
entendimento da filosofia de Wolff. Uma de suas principais obras para o
entendimento de sua filosofia é o livro “Discurso preliminar sobre a filosofia
em geral”, de 1728.
O princípio de
contradição é deveras importante no desenvolvimento de sua filosofia e na ideia
de possibilidade de que algo seja real, pois, por tal princípio o ser não pode
ser e não ser ao mesmo tempo. A contradição elimina a possibilidade de sua
existência. Sendo contraditório, torna-se impossível. Quando algo não é
contraditório, torna-se possível a sua existência, mas isto só não basta para
que este ente de fato exista. Por exemplo, uma mesa quadrada pode se tornar
redonda e isto não é contraditório, basta cortar os cantos de modo que encontremos
o círculo dentro do quadrado, portanto é possível, mas isto por si só não faz
que exista esta mesa redonda. Tomando por base o princípio da contradição,
podemos entender que segundo Wolff, todo julgar significa, também, afirmar um
predicado com a exclusão do seu oposto.
Segundo Wolff o
princípio da contradição é anterior ao princípio da identidade e ao princípio
do terceiro excluído e consiste na fonte de toda certeza do conhecimento
humano. A filosofia primeira ou ontologia de Wolff se atém ao estudo do ente
que seja possível e não contraditório, deste modo, o princípio da contradição
está na base de sua ontologia.
Pelo seu
trabalho filosófico Wolff propõe a unificação da razão com a experiência, bem
como, proporcionar à filosofia as mesmas certezas encontradas na matemática,
entendendo a importância de demonstrar afirmações por meio de princípios já
estabelecidos.
Mais do que uma
ponte entre Leibniz e Kant, ou mesmo alguém que tenha reestruturado e dado uma
nova expressão a antiga escolástica medieval, Wolff é um filósofo que busca a
construção de seu próprio sistema filosófico, mesclando abordagens distintas de
modo coerente e proporcionando por meio de seus livros, verdadeiros cursos e
manuais sobre filosofia e matemática, todo o instrumental que a cultura alemã
irá utilizar nos anos e séculos seguintes. Irá introduzir na língua alemã
termos e conceitos fundamentais para o desenvolvimento não só da ilustração
alemã, mas da própria evolução da filosofia com características próprias que
ocorrerá em terras germânicas, portanto, quando pensarmos no papel e
classificação do filósofo Christian Wolff, não basta rotula-lo como um membro
do movimento Racionalista em filosofia ou da Ilustração alemã ou mesmo como um
continuador e renovador da escolástica, pois, se bem que ele possa ser tudo
isto, é de fato muito mais, na medida em que suas obras escritas em língua
alemã irão estruturar a evolução da filosofia nesta região.
Silvério da Costa Oliveira.
Prof. Dr. Silvério da Costa
Oliveira.
Site: www.doutorsilverio.com
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