Professor Doutor Silvério

Blog: "Comportamento Crítico"

Professor Doutor Silvério

Silvério da Costa Oliveira é Doutor em Psicologia Social - PhD, Psicólogo, Filósofo e Escritor.

(Doutorado em Psicologia Social; Mestrado em Psicologia; Psicólogo, Bacharel em Psicologia, Bacharel em Filosofia; Licenciatura Plena em Psicologia; Licenciatura Plena em Filosofia)

Sites na Internet – Doutor Silvério

1- Site: www.doutorsilverio.com

2- Blog 1 “Ser Escritor”: http://www.doutorsilverio.blogspot.com.br

3- Blog 2 “Comportamento Crítico”: http://www.doutorsilverio42.blogspot.com.br

4- Blog 3 “Uma boa idéia! Uma grande viagem!”: http://www.doutorsilverio51.blogspot.com.br

5- Blog 4 “O grande segredo: A história não contada do Brasil”

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6- Perfil no Face Book “Silvério Oliveira”: https://www.facebook.com/silverio.oliveira.10?ref=tn_tnmn

7- Página no Face Book “Dr. Silvério”: https://www.facebook.com/drsilveriodacostaoliveira

8- Página no Face Book “O grande segredo: A história não contada do Brasil”

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9- Página de compra dos livros de Silvério: http://www.clubedeautores.com.br/authors/82973

10- Página no You Tube: http://www.youtube.com/user/drsilverio

11- Currículo na plataforma Lattes: http://lattes.cnpq.br/8416787875430721

12- Email: doutorsilveriooliveira@gmail.com


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sábado, 25 de abril de 2020

Eternidade


Por: Silvério da Costa Oliveira.

O conceito de eternidade encontra-se presente em religiões e na filosofia, mas é algo que possui uma definição que foge de nossa experiência cotidiana, pois, cabe argumentar em direção a algo que não teve começo e não terá fim, ficando, portanto, além e aquém do tempo, não podendo ser medido por qualquer medida que se faça do tempo. Dentro da teologia cristã a eternidade se apresenta como um dos atributos de Deus, este estaria fora do tempo e teria criado a tudo, inclusive o próprio tempo. Por sua vez, se pensarmos por um prisma filosófico, eterno seria o cosmos tendo toda a matéria e energia nele presente de algum modo, mesmo que somente em potência, pois, do nada nada se cria. Em filosofia podemos ter a eternidade como um atributo exclusivo do “Ser” ou do “Uno”, isto se formos buscar uma contribuição em Parmênides ou em Plotino, por exemplo.
Somos seres temporais e ao tempo pertencemos e mesmo aqueles cujas crenças admitam a imortalidade da alma, a reencarnação de espíritos ou a ressurreição da carne hão de convir que um dia nasceram, que um dia foram criados, e antes disto não existiram, portanto, a eternidade não é algo que nos pertença. O conceito de eternidade não pode ser visto como meramente um tempo de longa duração, pois, se assim o fizermos não cabe outra palavra senão o “tempo”, longo ou curto, linear ou circular, quanto faz. No entanto, cabe lembrar que o tempo é algo que requer ser medido e que esta medida pode variar quando incluídas outras variáveis, como, por exemplo, a velocidade pela qual percorremos uma sucessão de fatos. Lembremos de Einstein quando este teoriza que quanto mais próximos da velocidade da luz viajarmos mais iremos nos distanciar temporalmente daqueles que não se locomoverem na mesma velocidade. Estamos dentro de um todo englobante muito maior do que as medidas que hoje possuímos e todo este cosmos em expansão desde o big bang percorre um certo tempo. O todo, esta totalidade em sua unicidade nos mostra uma realidade cuja intuição filosófica ou científica procura abarcar diante de conceitos fabricados a partir de nossas limitações e também capacidades. Cada qual mantenha a sua crença, mas esta não deverá impedir de usarmos de nossa razão, intuição e reflexão.
O tempo cristão é entendido como linear, ou seja, nesta reta houve um dia um começo e haverá um final, deste modo, o conceito de algo intemporal caberia somente ao Criador, a este único Deus e não a sua criação, pois, esta um dia teve um começo, havendo, portanto, a não existência antes do fato que gerou sua criação. Já os antigos falavam em outro tempo, uma noção provavelmente oriunda dos ciclos observados na natureza, que nos fala em um tempo e mundo onde não haja uma criação e sim um eterno retorno ao mesmo, algo circular, onde passaríamos de novo e de novo pelo mesmo percurso, volta após volta. Pensemos no clima, primavera, verão, outono e inverno e depois tudo novamente, assim são as fases da vida, de nossa vida e de todo universo.
Já no amor e nas relações humanas, eterno é o sentimento que temos enquanto o mesmo durar, uma eternidade que possa caber em um tempo reduzido, mas que por nós ainda assim é percebido como eterno, pelo menos enquanto dure. No amor e no fogo da paixão uma fagulha da eternidade não deixa de estar presente. Já a dor presente quando perdemos algo muito querido pode até parecer eterna, mas em algum momento há de findar como tudo em nossas humanas vidas. Neste tocante, é aconchegante saber que a dor terá um fim, infelizmente a felicidade e tudo que amamos também segue o mesmo caminho.
O ser humano é um ser temporal e isto torna muito difícil o entendimento de uma realidade outra, atemporal. Nós somos filhos da presença transitória do tempo dentro de uma vastidão eterna cujos contornos não temos como perceber. Os físicos falam em big bang, mas tanto para estes como também para os filósofos, do nada, nada se cria, logo, matéria e energia estavam ali anteriormente em algum dado formato, mesmo antes da explosão que criou a tudo. Um cientista físico que conceba em seu credo particular um deus, para ser honesto consigo mesmo o teria de fazer não como um deus cristão criador e sim com um deus organizador, construtor, arquiteto, uma inteligência que molda, mas não cria.
Para nós, seres humanos, a única realidade que faz sentido é o momento presente, o momento único no qual vivemos o aqui e agora e não o passado, pois este já passou e também não o futuro, que ainda não existe para nós. Nesta visão de mundo, a eternidade passa a ser enxergada como o presente tempo que não pode ser sequer medido, pois ele o é somente enquanto nós o vivemos. Abstraindo da questão humana, a eternidade é algo que não pode ser mensurável, pois, se o fosse, uma parte da mesma seria gasta. Neste sentido, apesar de inter-relacionados, eternidade e tempo são conceitos distintos. Posso medir o tempo, mas não posso medir a eternidade. Quando falamos no tempo, em verdade fazemos alusão a uma sucessão de eventos que ocorre dentro do que entendemos por tempo. Estamos deste modo nos referindo a uma dada extensão que se faz quantitativa e ordenadamente presente na realidade, mas a eternidade terá por definição de existir mesmo na inexistência de qualquer ordem ou organização sucessiva material.
Separando os conceitos de tempo e eternidade, torna-se sem sentido falar em presente, passado ou futuro para a eternidade, pois se o fizéssemos a estaríamos mensurando e esta deixaria de ser eterna, tendo um ponto de origem, um percurso de passagem e um ponto de chegada, havendo também o desgaste e o consumo de uma parte da mesma durante este percurso, deste modo, a eternidade não foi e não será jamais, ela simplesmente é, para todo o sempre. Todo tempo se dá em uma sucessão transitória de fatos e eventos, já a eternidade imensurável se dá na total permanência. Poderíamos não ter o tempo para medir, sem que isto afetasse, fosse de que modo fosse, a eternidade. O tempo pode ser entendido como linear ou circular, mas sempre se reportará a uma passagem por algo, mesmo que repetida. A eternidade é um conceito muito mais amplo e abrangente que o tempo.
A eternidade pelo prisma religioso que coloca diante do ser humano a possibilidade de sua própria imortalidade em um momento posterior a sua morte física não pode e não deve ser usada como uma forma de abrigo cotidiano de onde o paraíso prometido proporciona a aceitação de uma vida medíocre, de natureza inconsciente e adormecida, sem ousadia ou realizações significativas e reais. Não pode servir como negação da dor pelo que, ou quem, um dia perdemos, na esperança do reencontro. Cabe a nós, criaturas humanas dotadas da consciência de sua finitude e individualidade, usarmos este tempo para criarmos, crescermos e nos desenvolvermos com toda a dramaticidade cômica que este ato merece e nos reserva quer queiramos ou não. Deste modo, encontraremos a conquista não somente do sucesso ao atingirmos as metas por nós mesmos propostas, mas a felicidade plena de um ser realizado. Dentro da perspectiva humana podemos falar em eterno por um dia, uma vida, um momento único enquanto dure em sua total e emocional intensidade. Fazer algo valer a pena, mesmo este algo sendo nossa vida, é proporcionar tal significado e importância ao fato que este poderia por nós ser eternamente imortalizado.
Se quisermos vir a desenvolver algo a que possa metaforicamente chamar de uma consciência da eternidade, então temos de transcender a sucessão temporal, a esta visão quantitativa de nosso mundo para em seu lugar colocarmos uma visão qualitativa, onde por sua vez a extensão seja substituída pela intensividade, ser intenso em tudo dentro de nossas limitações nos aproxima, da forma como o podemos fazer e vivenciar, deste conceito e por que não dizer, desta incógnita obsessão humana, que é o eterno, a eternidade.

Silvério da Costa Oliveira.

Prof. Dr. Silvério da Costa Oliveira.
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domingo, 19 de abril de 2020

Religião e crenças


Por: Silvério da Costa Oliveira.

Falar em religião é algo aparentemente fácil para a grande maioria das pessoas que só enxergam a sua própria como certa e outras que ou estão erradas ou são por demais estranhas para sequer serem chamadas com seriedade pela palavra religião, mas será algo tão simples e fácil assim ou algo tão complexo, cuja complexidade encubra a simplicidade de um grão de mostarda?
Por regra a religião, seja ela qual for e independente de seu conjunto de crenças, adota para si verdades inquestionáveis e absolutas enquanto que a ciência e a filosofia não trabalham com verdades absolutas e sim transitórias. Aquilo que entendemos como verdadeiro em ciência e filosofia se dá pelo uso de um método, de uma dada metodologia, racional na filosofia, experimental na ciência, e como tal, seu conteúdo é sujeito a questionamentos, mudanças, revisões e modificações que proporcionem a evolução do conhecimento humano, o que não ocorre na religião cujo passar dos séculos não envelhece suas verdades eternas, se bem que todos os crentes de uma data época possam perecer e não serem substituídos por outros nas gerações futuras. Há religiões que morrem por falta de adeptos, mas não por falta de verdades incontestes.
Poderíamos questionar se poderia haver uma religião sem a morte, pois é diante da finitude da vida e da compreensão que um dia nós e tudo ao nosso redor terá um fim, que torna-se imperioso uma explicação que dê sentido ao conjunto destas vivências e uma vez atuando no mistério maior, sim, pois a morte traz sentimentos diversos e por vezes não agradáveis de medo, perda, luto e outros, que temos também o encontro de outros mistérios que requerem uma explicação, tais como o nascimento e a vida. Diante da ausência de um conhecimento formal e acadêmico, da ausência de uma metodologia científica ou filosófica, só resta ao humano primitivo se agarrar a uma explicação que por meio da crença em dogmas religiosos, proporcione sentido e significado a sua existência, aliás, será também pela busca de sentido e significado diante de uma vida vazia e insípida que muitos ainda hoje irão buscar conforto nos braços ternos das mais diversas crenças religiosas. Judeu, muçulmano, cristão ou uma infinidade de centenas ou talvez milhares de outras crenças convivem ou já conviveram conosco durante o transcurso da história de nossas civilizações, todas certas e verdadeiras em sua unicidade míope, onde as demais conjuntamente com seus adeptos incorrem em erro mortal.
Não se trata somente de espiritualidade ou da crença na existência de uma ou mais Divindades sobre humanas, temos aqui presente a própria origem de nossas civilizações, o comportamento socialmente aceito e esperado, a moral a ser adotada, a estrutura social, o papel que cada um deve representar enquanto ator no grande palco da vida. Mesmo hoje, muito do que entendemos por direito, ciência, filosofia, ética, carrega em si o peso de valores culturais originados dentro de um contexto moral derivado de um arcabouço religioso. Provavelmente não seria possível o surgimento da filosofia no mundo grego antigo sem um ambiente religioso onde a multiplicidade de deuses e cultos permitisse que a razão se desenvolvesse a ponto de questionar o mundo religioso circundante.
Ter uma religião e ser uma pessoa religiosa são coisas muito diferentes. Um cientista ou filósofo que guie sua vida unicamente pela razão pode ter uma atitude religiosa diante da vida. Não devemos confundir a fé ou crença individual com a religião pública e socialmente organizada. A pessoa pode ter a sua fé e seu conjunto particular de crenças, mas isto compete unicamente a ela e não se iguala à religião, seja qual for, enquanto instituição social.
Seria uma ilusão acreditar que mesmo uma pesquisa histórica, um tratado filosófico, uma teoria científica ou mesmo a escolha do tema deste artigo e sua abordagem metodológica pudesse ocorrer isolados do contexto sócio cultural no qual estão inseridos e do qual aspectos religiosos estão inexoravelmente presentes. Mesmo o ateu, na sua necessidade de negar a deus, faz presente sua existência e de todo um conjunto de crenças religiosas dadas naquele momento histórico. Usando de uma metáfora, reconhecer que nado na água não faz de mim água ou peixe e também não nega a água que faz parte de meu próprio corpo, mesmo eu não sendo água.
A religião é pública e institucionalizada e deste modo em muito se afasta do sentimento religioso das pessoas do povo, bem como da intenção de seus fundadores históricos. A religião enquanto instituição, esteve à frente de verdadeiros genocídios no passado de nossa civilização, dentre outros crimes contra a dignidade humana e neste sentido há os que sonham com uma sociedade cuja evolução social leve ao final de toda e qualquer religião. Pode ser, no entanto, não creio que seja algo tão simples e não prevejo um futuro, por mais longínquo que seja, na qual alguma religião não venha a existir. As pessoas precisam dar sentido e significado as suas vidas e muito do conteúdo presente nas diversas religiões proporciona tal experiência. Por sua vez, o sentimento religioso não nega a ciência, medicina ou filosofia. Podemos crescer e evoluir, mas para isto não precisamos deixar de sonhar. Se pela religião a pessoa comete crimes contra a individualidade, liberdade e dignidade de outros seres humanos ou de si própria, então esta interpretação dada por ela do fenômeno religioso é algo doentio e deveras ruim, mas se por meio de uma atitude religiosa diante da vida a pessoa desenvolve valores positivos, sentimentos de bem-estar e felicidade, bem como uma atitude social produtiva que não interfira com a liberdade e dignidade sua e de outras pessoas, então pode ser algo bom. Há, portanto, e ao meu ver, uma relatividade no tocante a religião e não um todo absoluto.
A liberdade social democrática não justifica ou validalida que pessoas ou grupos ridicularizem a crença de outros. Em passado recente podemos observar que mesmo sofrendo críticas um grupo ou trupe cômica possa montar um espetáculo qualquer visando ridicularizar a religião cristã, seus dogmas e textos sagrados, no entanto, o mesmo grupo ou outro qualquer não faz o mesmo com religiões e crenças religiosas provindas em sua origem da África ou da cultura indígena, pois, atualmente isto seria politicamente incorreto. Tal trupe não ridiculariza a religião do Islã, pois bem sabe que pode sofrer algum atentado sério, muito sério, se brincar com o Corão ou Maomé, então temos aqui o medo, que toma o lugar do direito defendido de poder ridicularizar uma religião qualquer, que deixa de ser qualquer para ser uma em particular a ser atacada. Nesta busca de liberdade artística encontramos em verdade a cegueira ideologicamente determinada e altamente seletiva quanto ao que pode e deve ser ou não ridicularizado com o aval, inclusive, dos próprios sacerdotes de tal culto. Não penso que devamos brincar com tudo e todos e que o conceito de liberdade possa ser usado para justificar ridicularizar uma dada crença religiosa qualquer, neste caso fere-se outro princípio, que é o respeito.
Cada sociedade desenvolve uma cultura na qual a religião faz parte de um conjunto de crenças devidamente elaboradas e estruturadas de modo singular e no qual é pautado o comportamento esperado das pessoas e instituições, bem como da moral, de modo a não ser mera e casual a semelhança encontrada entre os deuses e os valores socialmente adotados, negados ou valorizados, pelos crentes. As práticas religiosas irão, portanto, serem tantas quantos povos socialmente distintos houver. Pelo prisma racional, se formos honestos diante da filosofia e da ciência, somente seria aceita a posição agnóstica que não permita aceitar de modo justificável a comprovação da existência ou não de um ou mais deuses, bem como a veracidade de uma ou mais crença religiosa. E claro está que os povos se movimentam no tempo e espaço, propiciando a junção de idéias e valores, de modo que crenças e deuses diferentes em religiões distintas possam ter seu equivalente em outra religião. Nos primórdios de uma nova sociedade ou grupo social, a religião, por mais simples e básica que possa ser, além de oferecer respostas para perguntas difíceis e enigmáticas diante de nossa experiência de vida, fornece também um modelo de comportamento aceito e incentivado para cada pessoa dentro do grupo, disciplinando e organizando um modelo dado de convivência e trabalho.
Independente de determinada religião ser monoteísta ou politeísta, deísta ou teísta, seu estudo comparado pode ser útil na compreensão da civilização humana. Não penso que devamos adotar ou descartar crenças distintas pelas mesmas não encontrarem acolhida na metodologia científica ou filosófica, muito pelo contrário, seu estudo se faz necessário e o entendimento em maior profundidade da mesma pode tanto enriquecer nossa vida individual e social, como também nos precaver contra o surgimento ou proliferação do mesmo fenômeno religioso formal sem o invólucro de religião e sob o disfarce de alguma doutrina progressista que visualize o paraíso na terra e a deus em um ser-humano, esteja este vivo ou seja um personagem mumificado que um dia existiu ou alguém que inexoravelmente será trazido pelo futuro vindouro. Penso que muito temos a temer diante de religiões e deuses que não se assumam como tal, cujo disfarce faça que caiamos em uma armadilha que nos conduza em total retrocesso aos gritos de progresso social.
Independente da veracidade ou falsidade do conteúdo em dada religião ou conjunto de crenças, ou do simbolismo ali envolvido, ou do significado e sentido social e histórico, ou do possível valor econômico ali presente, não podemos deixar de reconhecer o real valor da experiência única vivenciada pelo crente em sua vida e suas relações, atuando na plenitude de seu ser, emoções, sentimentos e cognição diante dos fatos e problemas que se lhe apresentam. Independente de tudo o mais, a experiência vivenciada pelo crente é real em sua vida e moldará e direcionará os rumos da mesma.

Silvério da Costa Oliveira.

Prof. Dr. Silvério da Costa Oliveira.
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sábado, 11 de abril de 2020

Tirando a própria vida


Por: Silvério da Costa Oliveira.

Tirar a própria vida por meio de uma decisão individual é algo por vezes estranho e que parece que vai de encontro a busca natural pela sobrevivência, no entanto, é comum encontrarmos este comportamento não somente na atualidade, mas mesmo no decorrer da história da humanidade. Alguns suicídios são, inclusive, bem famosos e constantemente relembrados ou mesmo estudados, como é o caso de Cleópatra ou de Sócrates. Neste tocante, vários termos são possíveis de serem usados, cada qual com seu contexto e particularidades que os diferenciam drasticamente uns dos outros, como é o caso do termo suicídio, eutanásia, ortotanásia, suicídio assistido, seppuko ou harakiri, dentre outros possíveis termos que visam descrever uma ou outra forma de retirada da própria vida.

Se incluímos um médico ou uma equipe de saúde no processo de suicídio, neste caso, caberia falar em: ortotanásia, eutanásia e suicídio assistido, três coisas diferentes e que geram discussão nos meios políticos e de saúde pública nos mais diversos países. Quando usamos o sufixo “tanásia” estamos nos referindo a morte. Ortotanásia é o procedimento no qual o paciente terminal tem a possibilidade e o direito de decidir se deseja ou não ter sua vida prolongada artificialmente, sendo motivo de discussão, mas não constando como dolo no código penal brasileiro ou havendo proibição no código de conduta dos profissionais de saúde no Brasil, pois, neste caso o médico não teria um papel ativo, mas deixaria de tentar manter artificialmente a vida do paciente ou incluir processos de ressuscitação, deixando que a morte natural sobrevenha. Já eutanásia e o suicídio assistido são ilegais no Brasil. Por eutanásia entende-se a morte do paciente ocasionada por intervenção médica a partir de autorização dada pelo próprio paciente, por vezes se dá com o uso de uma injeção letal, sendo considerado crime no Brasil, homicídio doloso. Já por suicídio assistido temos que a parte ativa é feita pelo próprio paciente, estando o médico ali unicamente para auxiliar e minimizar a dor, usualmente neste caso o paciente ingere algo que o levará a morte, quem assiste neste caso também está cometendo um crime no Brasil. Apesar de não ser parte direta de nosso atual estudo, cabe comentar também o termo distanásia, que é a prolongação da vida por meios artificiais, independente da dor e sofrimento do paciente e mesmo não havendo meios possíveis de uma recuperação do paciente, seria somente adiar a morte que já deveria ter ocorrido por meios naturais ou pela interrupção dos aparelhos que estão mantendo a vida do paciente de modo artificial. E claro, cabe lembrar que no campo da saúde, com o envolvimento do médico ou de uma equipe de saúde no acompanhamento do paciente terminal, qualquer intervenção, seja por ação ou omissão, poderá gerar discussão social e judicial podendo acabar gerando penalidades para os profissionais envolvidos por não ser um tema completamente pacífico e ainda propenso a muitos debates futuros.
Cabe, claro, lembrar também do seppuku ou harakiri, que é um suicídio ritual feito inicialmente por um samurai no Japão em determinadas e específicas ocasiões onde honra e coragem estavam vinculados à possibilidade de morrer ou viver uma vida em desonra. Até hoje é comum a prática de suicídio no Japão por motivos semelhantes, mas sem o ritual adotado pelos samurais. Durante a segunda guerra mundial vários pilotos japoneses jogaram seus aviões em navios aliados em uma forma moderna de suicídio honrado. Aqui sempre deverão estar presentes motivos nobres como o amor, a honra e o patriotismo. Historicamente o suicídio nesta modalidade contem características que o diferenciam radicalmente do suicídio praticado no resto do mundo não só na atualidade, como também no decorrer histórico. Claro que outras sociedades podem também ter adotado formas semelhantes, mas talvez não tão difundidas ou conhecidas em nossa atual sociedade ocidental. No início desta prática no Japão, estava presente uma visão religiosa zen budista que dava suporte a prática, bem como as possíveis consequências de ser capturado vivo pelo exército inimigo durante batalha, estando morto impedia-se torturas e humilhações.
Em nossa sociedade contemporânea podemos com relativa facilidade apontar alguns fatores como mais proeminentes no tocante ao risco real de alguém vir a cometer suicídio. Geralmente, tentativas de suicídio estão mais presentes diante de distúrbios psiquiátricos, uso de drogas, anteriores tentativas de suicídio do próprio indivíduo ou histórico do mesmo em sua família, idade muito avançada, alguma perda recente considerada de grande importância para o sujeito, solidão ou ausência de suporte dado por outras pessoas, estados de depressão, etc.
Estatisticamente a Ásia apresenta as maiores taxas mundiais de suicídio. Já no Ocidente temos que embora as tentativas de suicídio sejam bem maiores para as mulheres, são os homens que obtém maior número de êxitos nestas tentativas, isto em decorrência dos métodos usados pelo sexo masculino serem mais violentos e eficazes, tais como o uso de armas de fogo, enforcamento, saltar de lugares altos e por sua vez as mulheres acabam optando por consumir substâncias venenosas ou mesmo remédios em quantidade tal que se torne mortal. Ressalvando-se que no Brasil, em regiões agrícolas, predomina em homens a tentativa de suicídio por meio de envenenamento por agrotóxicos.
No Brasil as estatísticas apontam para uma prevalência de suicídios na faixa etária entre 15 a 24 anos de idade, já no mundo como um todo a prevalência se dá entre 15 e 30 anos e após os 70 anos de idade.
Pensar o suicídio é também pensar nos que ficam após a morte, pois, há os familiares e amigos íntimos, há o luto e a presença das fases estudadas por Elisabeth Kübler-Ross sobre a perda. Há também a mudança de cenário da morte, pois, esta tende a não ocorrer de modo tranquilo em casa ou como mais comumente ocorre, nas instalações de um hospital, para ocorrer de modo violento e abrupto que marca o local com lembranças no mínimo desagradáveis, para não dizer chocantes diante do gosto social de nosso tempo presente. Normalmente podemos afirmar que não há uma causa única para alguém cometer o ato de suicídio, em verdade, estamos diante do desfecho de um processo onde tanto por parte do indivíduo que tentou o suicídio, como por parte das pessoas mais próximas a ele, tivemos grande dose de dor e sofrimento, sendo este o marco derradeiro de um lento drama existencial.
A quem pertence a vida que temos? Pode a vida do corpo ser propriedade da pessoa que possui o corpo e esta tese é coerente com teorias individualistas que defendam a propriedade privada, neste caso a vida deste corpo pertence a pessoa e ela pode decidir por colocar fim a mesma. Mas também podemos entender que o Estado é o proprietário deste corpo e desta vida e que há um social que deva ser consultado, neste caso estaríamos mais próximos de doutrinas coletivistas que questionariam a propriedade privada, inclusive de si próprio. Claro que também temos diversas doutrinas religiosas que irão se manifestar neste tocante, falando também sobre direito e propriedade, bem como do sentido e significado da vida, da morte e do pós morte. Então, penso que falar sobre suicídio não é um tema que algum dia obterá um consenso e mesmo que o faça diante de um grupo ou população reduzida, jamais o terá diante da história de nossa civilização, dos escritos e tratados que algum dia abordaram e discutiram o tema.
Pelo que sabemos hoje, uma pessoa que tente cometer suicídio, apesar de estar mais propensa a cometer nova tentativa nas semanas seguintes, não necessariamente irá manter esta postura pelo resto de sua vida, podendo se arrepender da tentativa e passar a viver sua vida da melhor forma possível. Também sabemos que algumas condições passageiras podem levar a tentativas de suicídio, tais como a depressão, o uso de drogas, o sentimento de perda, etc. Logo, entendo que é obrigação das demais pessoas e da sociedade como um todo, impedir, sempre que possível, que uma tentativa de suicídio obtenha êxito. Mesmo em caso de pacientes terminais, temos o registro de pessoas cuja morte era eminente e inclusive onde cogitou-se algum método de diminuir o sofrimento pondo fim a vida e que, no entanto, superaram tal fase e posteriormente por alguma descoberta ou nova tecnologia, conseguiram viver bem ainda por alguns anos. Há pesquisas atuais sobre métodos que poderão no futuro prolongar a vida por um tempo muito mais longo do que atualmente dispomos, vide, por exemplo, a possibilidade do uso de nanotecnologia no tratamento de doenças e de problemas associados ao envelhecimento. É provável que em futuro próximo o tema do encerramento voluntário da vida tenha de ser revisto por outro prisma, decorrente da morte por causas naturais ou envelhecimento praticamente ser abolida ou retardada por um tempo muito mais longo do que dispomos hoje.
Há em diversas cidades o serviço composto por um número de telefone para o qual a pessoa que está pensando em suicidar-se pode ligar e conversar anonimamente com alguém do outro lado da linha que tentará lhe ajudar, escutar e prevenir uma tentativa de suicídio. Há também o caso de a pessoa se colocar em alguma situação de perigo, como jogar-se da janela de um prédio, estando a uma altura considerada do solo, e haver tempo da chegada de algum auxílio, seja por parte de uma pessoa que se encontre próximo ao local ou por meio de algum serviço de emergência e socorro que tenha sido chamado, tal como o corpo de bombeiros ou a polícia. Em geral a tática usada por serviços profissionais, tais como polícia e bombeiros, consiste em conversar e havendo possibilidade e estando o suicida distraído, intervir fisicamente para impedir o ato. Penso, no entanto, que caberia aqui o preparo destas equipes para uma abordagem mais persuasiva e que não envolvesse necessariamente uma intervenção física para impedir o ato. Difícil saber o que falar, mas talvez o mais importante seja de fato escutar empaticamente, tentando se colocar na posição emocional e cognitiva do outro diante dos fatos por este narrados. Muitas vezes o ato de falar e ser genuinamente escutado possui conotações terapêuticas fazendo a pessoa sentir-se melhor e repensando sua vida e o que pretende fazer a seguir. Neste caso, o socorrista dizer o que fazer ou o que faria no lugar da pessoa pode não ser eficaz, e sim a escuta ativa. A decisão é da pessoa e isto não podemos mudar, mas podemos fazer a nossa parte quando presentes, nos mostrando solícitos a lhe escutar com dignidade e atenção. Podemos não querer que ela cometa este ato, mas somos limitados diante de nossas reais alternativas e não podemos nos culpar por tentar e correr o risco de falhar. Fazer a nossa parte, isto é importante.
Há alguns fatores de risco que podem sem observados antes de uma tentativa de suicídio se concretizar e que amigos e familiares colocados diante dos mesmos tem a possibilidade de intervir de modo a evitar a consumação do ato. Uma boa intervenção se dá pela empatia e conversa pautada na escuta, onde menos do que dar-se conselhos, procura-se entender e compreender a outra pessoa, demonstrando nosso real interesse por ela. Em geral, temos alguns sinais denunciadores, tais como o uso imoderado de álcool ou o abuso de demais drogas, a depressão, isolamento, mudança de comportamento, falar que vai se matar, preocupação e interesse constante pela morte, suicídio e formas de tirar a própria vida. Internalizar a situação vivida é um modo de obter ajuda.
Há vários modos de suicídio e não necessariamente este se dá do modo clássico como as pessoas em geral imaginam, que é a pessoa escrevendo uma carta de despedida e depois usando algum meio para tirar sua própria vida. Pode ocorrer do comportamento escolhido para viver sua vida seja um comportamento de tão alto risco que por si só já seja uma tentativa de suicídio, onde, no entanto, a retirada da vida não se daria diretamente pela própria pessoa e sim pelas circunstancias envolvidas ou por outras pessoas. Podemos falar, portanto, de um comportamento de risco que envolva um suicídio disfarçado. Em certas profissões, como, por exemplo, a de policial, podemos ter situações nas quais um comportamento de risco desnecessário possa levar ao final da vida por outros meios, onde mesmo um homicídio possa disfarçar a prática real de um suicídio.
Em termos de prevenção, o dia 10 de setembro é o dia mundial de prevenção ao suicídio, daí o setembro amarelo, no qual no decorrer deste mês se realizam diversas ações visando esclarecer sobre o tema e evitar que pessoas assim procedam, orientando quem possui tais ideias e quem possa conviver com tais pessoas. A cor amarela foi escolhida por ser a cor do carro dirigido por um jovem rapaz americano que cometeu suicídio, tendo sua família e amigos, posteriormente, iniciado uma campanha de prevenção.
Há quem defenda teses distintas, já escutei uma médica psiquiatra defender que o suicídio não é uma escolha e sim um sintoma de uma doença psiquiátrica. Eu não penso assim. No meu entendimento tudo em nossas vidas é fruto de uma escolha, o que muda são as informações que possuímos, pois estas delimitam as opções que conseguimos visualizar diante de uma decisão a tomar. Quanto mais sabemos sobre algo, mais opções se mostram disponíveis para escolhermos. Quando a pessoa opta pelo suicídio é por que naquele momento de sua vida ela vê tal atitude como o melhor caminho ou o único caminho possível a ser seguido, não conseguindo vislumbrar outras opções que lhe permitam viver. Entender e ajudar o paciente nestas condições é também proporcionar um aumento das alternativas que este enxerga, das possibilidades, da multiplicidade de escolhas possíveis, não sendo, portanto, o suicídio sua única alternativa. Não ver o suicídio como uma escolha e sim como um sintoma decorrente de uma doença é negar a autonomia individual da pessoa, e que sua decisão em tirar a própria vida pode ser convertida em uma decisão de viver a vida em sua total intensidade.
Se entendemos o suicídio meramente como sintoma de uma doença, então cabe ao profissional de saúde custodiar esta vida, internando o paciente, aplicando terapias invasivas que possam incluir vários procedimentos, as mais diversas drogas a título de medicação ou mesmo tratamento de choque, eletroconvulsoterapia. Neste caso retirou-se toda a autonomia deste paciente, portador de uma doença e incapaz de determinar os rumos de sua própria vida, seu caminho, seu destino. Por tal abordagem médica, questões culturais e sociais são deixadas de lado diante do corpo a ser tratado e recuperado. Mesmo o suicídio ritual diante de uma crença socialmente aceita, seria entendido como sintoma de uma doença. Menos do que certo ou errado, são abordagens ao problema visando uma solução, mas sem de fato discutir questões fundamentais que estão por trás de qualquer abordagem que possa ser dada ao tema, como, por exemplo, o que é a vida, o que é a morte, a quem pertence o corpo. Se o corpo desta pessoa pertence ao Estado e está submetido ao coletivo, ao social, ou se pertence ao indivíduo que o detém. Individualidade ou coletividade? Mesmo que tais questões e outras mais, não sejam abertamente respondidas ou reconhecidas, elas estão na base das decisões tomadas por todos os envolvidos e no fundo uma resposta foi dada a cada uma delas antes do profissional de saúde ou outro envolvido tomar uma decisão qualquer. Muitas vezes o profissional não está ciente da moral e do julgamento contido em suas decisões e dizendo que não devemos julgar ou ter atitudes moralistas e sim meramente tratar, esquece que suas decisões sobre o tratamento se baseiam em suas atitudes morais.
Também importante atentar que por vezes a morte é entendida pelo médico como a inimiga a ser combatida a qualquer preço e a morte do paciente como uma derrota pessoal. Diante deste quadro fica difícil qualquer abordagem que proporcione a menor liberdade para uma decisão contrária aos paradigmas socialmente vigentes ou mesmo para qualquer questionamento sobre a existência de tais paradigmas e sua base moral, religiosa e cultural.
Viver é mais do que meramente estar com suas funções vitais funcionando. Ao ser humano cabe ser feliz, ter êxito em suas tentativas, tecer planos e projetos, criar o seu futuro. Pessoas cometem suicídio matando seu corpo, mas muitas outras matam antes seu espírito e andam por aí como se vivas fossem, na verdade mortas vivas, zumbis sem vida, metas, ambições ou dignidade. Viver é também dar sentido e significado a sua vida, é cuidar de si e dos que estão a sua volta. Viver é ter experiências e prazer com as mesmas. Viver é tratar com carinho e emoção a tudo que nos cerca, a começar por nós próprios e reconhecer que a vida é algo amplo que em tudo está presente e que de tudo faz parte, gerando independente de sua religião ou mesmo da ausência de uma religião, uma atitude religiosa de respeito diante de tudo que nos cerca, bem como estender esta atitude a contemplação dos momentos presente, passado e futuro.

Silvério da Costa Oliveira.

Prof. Dr. Silvério da Costa Oliveira.
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