Por: Silvério da Costa Oliveira.
Escola Cirenaica
ou Hedonista – Aristipo de Cirene
A Escola
Cirenaica, por vezes também conhecida por Escola Hedonista, foi fundada por
Aristipo de Cirene (435-355 a.C.), discípulo do filósofo Sócrates. Tem este
nome por ter sido fundada na cidade de Cirene, Líbia, no norte da África. Aristipo
sofre influência de Sócrates e de Protágoras, o sofista. Nada restou dos
escritos de Aristipo, nosso conhecimento sobre esta escola se deve a pensadores
posteriores.
De Aristipo
sabemos ser discípulo de Sócrates, sobre a animosidade existente entre ele e
Platão, sua ausência na morte de Sócrates narrada no diálogo Fédon, sobre sua
presença na corte do rei Dionísio, o tirano de Siracusa, sobre cobrar por seus
ensinamentos do mesmo modo que os sofistas faziam, seu gosto por luxo e também
ficou famosa a relação com a prostituta Laís de Corinto, a bela.
A escola
cirenaica possui seu fundamental núcleo em três pessoas, Aristipo, o fundador
da escola, Areta, sua filha, e Aristipo, seu neto. Como avô e neto tem o mesmo
nome, este último ficou conhecido como Aristipo, o jovem. O conhecimento da
escola foi passado de pai para a filha e desta para seu filho, sendo este o
sistematizador do sistema de seu avô. Aristipo, o jovem, teve como filho
Teodoro, o ateu, que negava a existência não só dos deuses, mas de qualquer
divindade. Os deuses seriam invenções humanas e aceitos por convenções sociais
e tem como objetivo atemorizar os humanos que não são capazes de agir de acordo
com sua razão. Depois de Aristipo, o jovem, a escola se dividiu em três
correntes, cada qual com seus principais representantes.
O termo Cirenaicos
fica restrito a Aristipo e seus seguidores diretos, temos os Hegesíacos, que
são os seguidores de Hegesías, temos os Anicerios, que são os seguidores de
Aníceris, e temos os Teodorios, que são os seguidores de Teodoro, o ateu. A
escola tende a desaparecer, dando lugar a escola Epicurista, cuja temática há
também de se dar sobre o prazer e a ética, mas de modo distinto das propostas
da escola Cirenaica.
Enfocou uma
ênfase nos estados subjetivos, se afastando da especulação. Para esta escola a
ênfase maior se dá para a obtenção da felicidade, alcançada por meio do
conhecimento, da moderação e da virtude.
Segundo a
exposição de Sexto Empírico sobre a Escola Cirenaica, estes teriam interesse
somente pela vida prática e os aspectos morais e éticos da filosofia de
Sócrates, afastando-se da física e da lógica, uma vez que buscavam unicamente
alcançar uma vida feliz, no entanto, ao dividirem a ética em cinco partes (1-
os objetos a desejar e a fugir; 2- as sensações; 3- as ações; 4- as causas; 5-
as demonstrações) tornam a reintroduzir, pois, a física está presente quando
consideramos as causas, e a lógica está presente quando consideramos as
demonstrações.
Ainda segundo
Sexto Empírico, para os cirenaicos o único acesso a verdade se dá por meio das
sensações, sendo que o verdadeiro é a sensação que percebemos, como, por
exemplo, a cor branca de um objeto ou a doçura de algo que pomos na boca, mas
não o objeto em si, aquele que produziu o que percebo como branco ou doce é
para mim desconhecido, pois, não estão estes objetos livres de engano em meus
julgamentos. Não há como afirmar que o objeto que produziu determinada sensação
em mim seja idêntico a esta sensação, ou seja, não posso dizer que aquilo que
percebo como doce seja realmente doce, e o mesmo vale para outras sensações,
como a cor branca. Pessoas diferentes podem perceber o objeto de modos
diferentes. Outra pessoa poderia perceber o que percebo como doce ou branco de
modo distinto e diferente. Os fenômenos que percebemos enquanto percepções são
todos verdadeiros, mas enquanto causas produtoras das impressões, são sujeitos
ao erro.
O conhecimento
se limita ao mundo físico do qual temos percepção e as nossas sensações
subjetivas. Em virtude deste subjetivismo do conhecimento, todas as
denominações existentes não passam de convenções sociais. Cada percepção da
realidade é individual e não sujeita a comparação com a percepção de outra
pessoa. Cada percepção é sensorialmente única para aquele indivíduo que a tem.
Apesar de a referência para que possamos encontrar a verdade ser a nossa
percepção, esta mesma percepção nada nos diz sobre a essência mesmo da coisa
que percebemos e que produziu em nós esta sensação.
A escola
cirenaica apresenta uma teoria do conhecimento sensualista, pois, a única fonte
de conhecimento se dá por meio dos sentidos, e também subjetivista, pois, não
existe conhecimento que não seja individual.
A Escola
Cirenaica entende que a felicidade provém de nossas sensações, as quais podem
nos proporcionar prazer ou dor, logo, devemos evitar as sensações que nos
causam dor e favorecer o surgimento de sensações que nos proporcionem prazer,
sendo este o objetivo da vida. A virtude, e o homem bom ou virtuoso, passam a
ser identificados com a obtenção de prazer e a evitação da dor. Assim, o prazer
é associado ao bem e o desprazer ao mal, além de um estágio intermediário de
neutralidade. Em uma metáfora com o mar, quando este enfrenta uma tempestade e
apresenta ondas enormes, temos o desprazer, já o prazer seria uma leve onda em
um mar livre de tempestade e a neutralidade seria a calmaria. Vejamos neste
exemplo que tanto o desprazer, como também o prazer, implicam em algum tipo de
atividade e não de passividade. Os cirenaicos entendem que a felicidade
consiste na obtenção do prazer e por sua vez, exemplificam o prazer como sendo
um leve movimento enquanto que a dor é um movimento violento. Enquanto para os
epicuristas o prazer seria algo estático (ausência de dor e sofrimento), aqui,
para os cirenaicos, o prazer é algo dinâmico (prazeres físicos e sensoriais
momentâneos).
O prazer ocorre
no aqui e agora, no momento presente e não no passado ou no futuro. Com o
passar do tempo não temos mais o prazer sentido, e sim a recordação do mesmo.
Nisto há de se diferenciar da felicidade, a qual deve ser entendida como o
somatório dos prazeres particulares, tanto presentes quanto passados e futuros.
Esta escola não prega a subordinação total ou, ao contrário, a abstenção do
prazer, e sim sua dominação e emprego, tendo o sujeito a autarquia sobre seu
uso.
Para os membros
da escola cirenaica o prazer é entendido como o único bem intrínseco, deste
modo, entendiam que se devia não meramente evitar a dor, mas sim, ativamente
buscar o prazer e este se daria por meio de sensações físicas agradáveis e
momentâneas. Admitem, no entanto, que o prazer também pode ser obtido por meio
de um comportamento altruísta. O prazer é o único bem na vida e a dor é o único
mal.
Cabe atentar que
algumas ações que possam proporcionar prazer de modo imediato, podem a seguir
levar a dor e ao sofrimento e, portanto, devem ser evitadas. Cabe ao sábio
saber distinguir entre os possíveis prazeres que se apresentam e estar no
controle dos mesmos em vez de ser controlado por eles. Quando um determinado
prazer momentâneo viola as leis e costumes do local onde se está, a obtenção
deste prazer trará como consequência posterior a dor resultante de sofrer
penalidades impostas pelo grupo social. Também cabe ressaltar que tanto a
amizade, como também a justiça, tendem a serem úteis na medida em que
proporcionam prazer. Qualquer comportamento social, ético ou altruísta, tem um
componente hedonista que deve ser observado para que se busque o prazer e
evite-se a dor e o sofrimento.
Cabe ao sábio
saber dominar os prazeres e não se deixar dominar pelos mesmos. Os cirenaicos
também se entendem como cosmopolitas. Nesta escola a física, lógica e
matemática eram consideradas desnecessárias para o encontro do bem e da
felicidade e, portanto, deixadas de lado.
O prazer ocorre
no momento vivido, já a felicidade é o somatório do conjunto de prazeres
ocorridos no passado, presente e futuro. O prazer sempre ocorre no momento
presente, no aqui e agora. É preciso aprender a viver o prazer do breve momento
em que este ocorre, sem se preocupar com o passado ou com o futuro. Para ser
feliz é preciso saber apreciar o momento presente que se está vivendo. A virtude,
por sua vez, se dá pela moderação dos prazeres, de modo a que estes não se
transformem futuramente em fonte de dor.
Para Aristipo o
prazer pode ser entendido como um movimento leve, a dor como um movimento
violento e o êxtase como a ausência de movimento, não sendo este último
considerado prazeroso ou desprazeroso. Aristipo combinava o hedonismo na ética,
com o sensualismo e materialismo na teoria do conhecimento.
Silvério da Costa Oliveira.
Prof. Dr. Silvério da Costa
Oliveira.
Site: www.doutorsilverio.com
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