Por: Silvério da Costa Oliveira.
Escola de Frankfurt
Em suas origens a Escola de Frankfurt se reporta ao intelectual judeu argentino, radicado na Alemanha, Felix Weil, quem organizou no ano de 1922, na cidade de Frankfurt, Alemanha, a “Primeira semana de trabalho marxista”, evento este que reuniu diversos intelectuais da esquerda. Como proposta surgida neste evento, foi criado o “Instituto de pesquisa social”, o qual foi inicialmente patrocinado pelo pai de Felix Weil, Herman Weil, e também pelo então governo alemão. O nome inicialmente proposto, mas que foi deixado de lado por ser considerado muito provocativo, era: “Instituto para o marxismo”.
O instituto foi criado vinculado à Universidade de Frankfurt, daí o posterior nome dado ao movimento e a seus integrantes: “Escola de Frankfurt”. A gestão do instituto coube a Kurt Albert Gerlach, mas somente no primeiro ano, pois, este veio a falecer. Entre os anos de 1923 e 1930 a gestão do instituto coube a Karl Grümberg. Foi criado um escritório em Genebra, para onde se mudou a sede do instituto no ano de 1930, tendo sido o local inicial em Frankfurt definitivamente fechado em 1933, tudo em decorrência da ascensão nazista. O nome como o conhecemos hoje, “Escola de Frankfurt”, é originário da década de 1950, quando o instituto retorna a sua cidade de origem.
Em 1917 ocorre a Revolução Russa e, posteriormente, temos a criação da URSS. Com a implantação das ideias de Marx sobre o comunismo na Rússia, bem como, os governos de Lenin e depois Stálin, os intelectuais europeus tiveram de integrar esta nova realidade em suas discussões e estudos. Logo na sequência da Revolução Russa e os acontecimentos posteriores a mesma, ocorreu uma divisão entre os intelectuais de esquerda na Europa. Até que ponto caberia ou não aplicar as ideias socialistas e comunistas ao restante da Europa? Havia uma tendência, expressada pela Escola de Frankfurt, de entender que o marxismo como originalmente desenvolvido e aplicado na época na URSS, não estava de acordo com as novas necessidades presentes no século XX, pois, teriam surgido outras questões que ultrapassavam a relação presente entre o trabalhador proletário, e o burguês comerciante e proprietário dos meios de produção em um mundo industrializado.
A Escola de Frankfurt tem sua origem no entre guerra (1918-1938), nascendo oficialmente com a criação do “Instituto para a investigação social”, em fevereiro de 1923, agregado à Universidade de Frankfurt e fundado por um grupo de intelectuais de linha marxista, sendo quase todos judeus. A Escola foi formada basicamente por judeus e em um período de profundas mudanças sociais que impactaram o pensamento e vida destes integrantes.
Seu surgimento inicial se dá entre duas grandes guerras e com a crise de 1929 que daria origem a mudanças políticas profundas e o surgimento de governos fascistas e nazistas, bem como, o agravamento do antissemitismo presente no mundo, em particular na Europa. Com a ascensão do nazismo na Alemanha, a condição de um instituto que defendia ideias marxistas e formado basicamente por judeus foi se tornando cada vez mais inaceitável, a ponto de seus integrantes terem de, aos poucos, ir mudando para outros países e, inclusive, levando o que puderam de seus recursos e instalações. Em virtude da ascensão do partido nazista na Alemanha e do início das perseguições aos judeus, o instituto foi transferido de Frankfurt, para Genebra, depois Paris, e por fim Nova Yorque (1934), só retornando a Frankfurt após o conflito bélico. No pós guerra, mais exatamente em 1949, Horkheimer retorna a Frankfurt, levando consigo o a biblioteca e o Instituto, tendo sido o mesmo reaberto em 1950, agora com Adorno sendo seu novo diretor.
Alguns comentadores colocam a teoria crítica da escola de Frankfurt na década de 1950, ressaltando ser este período o de maior produção e repercussão de seus trabalhos, fazendo uma releitura de Marx e do marxismo, com uma crítica ao marxismo adotado na URSS e do capitalismo nos EUA. Neste grupo teremos os pensadores: Horkheimer (1895-1973), Adorno (1903-1969), Marcuse (1898-1980) e Habermas (1929-), dentre outros.
Ao nos referirmos à contribuição da Escola de Frankfurt temos de pensar dois parâmetros, o primeiro sendo a “teoria crítica” por ela desenvolvida, na qual temos uma postura crítica ao modo de pensar de nossa sociedade ocidental a partir do Racionalismo presente na filosofia de René Descartes e seus continuadores e também do movimento Iluminista do século XVIII, bem como, também, ao pensamento marxista-leninista. Já o segundo se dá com relação a “indústria cultural”, onde teríamos a padronização de produtos vinculados a cultura de massas.
O termo “teoria crítica” se origina de dois pontos presentes nesta Escola. O primeiro é a crítica do desenvolvimento social que se opõe às teses Iluministas, o segundo é a presença de uma leitura crítica do marxismo e das ideias então em voga na esquerda política. O termo “teoria crítica” tem em suas origens o livro de 1937, escritor por Max Horkheimer, “Teoria Tradicional e Teoria Crítica”.
O projeto de desenvolvimento de uma teoria crítica interdisciplinar está em germe já no início dos anos 20 e se apresenta mais fortemente a partir dos anos 30. Teríamos a base comum de pesquisas em ciências sociais e humanas objetivando entender o funcionamento da realidade circundante na sociedade, bem como, os meios de sua transformação a partir de suas potencialidades e contradições.
Algumas teses centrais ao Marxismo-Leninismo são abandonadas ou reformuladas, como tal é o caso de: Ser a teoria de Marx algo finalizado e perfeito, que não admitisse mudanças; o potencial revolucionário do proletariado; a ditatura do proletariado; a luta de classes como motor da história (esta luta passa a ser deslocada para a presença das contradições observadas na sociedade); o centro de toda análise social ser a subestrutura econômica. Apesar destas críticas, entendem tais autores que o socialismo é o único caminho possível para superar tudo que há de ruim no capitalismo e proporcionar uma nova vida ao antigo marxismo.
A Escola mantém a ideia marxista de que a sociedade se apresenta como uma totalidade histórica estrutural que é dominada pela existência de um conflito entre classes, no qual o mercado e o Estado apresentam mecanismos que se condicionam reciprocamente.
A metafísica presente na filosofia, bem como as religiões, são parte da superestrutura ideológica que permite a manutenção do atual sistema, originário da antiga opressão existente no feudalismo e também proporcionado pela ascensão da burguesia. Em geral se mostram teístas.
Seus pensadores questionam a ideia de que a par com os avanços científicos e educacionais observados na sociedade, teríamos também um avanço moral. Este questionamento bate de frente com a tese defendida pelos Iluministas e pelos Positivistas, os quais defendiam que o desenvolvimento social estaria vinculado ao desenvolvimento científico, cuja disseminação do conhecimento oriundo das ciências e filosofia, possibilitaria uma coerente reorganização social.
A Escola de Frankfurt, por meio de seus integrantes, faz uma crítica social tendo por base uma leitura e interpretação da obra de Marx. Quando tal crítica se volta para a cultura, identifica a existência de uma indústria cultural de massa que estaria exercendo um papel enquanto forma de dominação, formas estas também presentes na política, economia, psicologia e na cultura em geral.
O conceito de “indústria cultural” foi elaborado dentro da Escola de Frankfurt, tendo surgido por primeira vez no livro “Dialética do esclarecimento”, 1947, de autoria conjunta de Adorno e Horkheimer. A cultura pode ser entendida como uma forma de dominação do sistema social capitalista. Os autores dividiram a cultura autêntica em dois tipos: a erudita e a popular.
A cultura erudita é a produzida por uma refinada elite intelectual e possui um maior valor estético, por ser melhor elaborada, sendo também menos intuitiva. Permite um maior desenvolvimento da intelectualidade, de modo mais pleno, devendo ser ampliada. Já a cultura popular é formada pelas tradições populares, sendo formada com menor refinamento técnico e intelectual e bem mais intuitiva.
Enquanto a cultura erudita e a popular são consideradas manifestações autênticas, temos a cultura de massa, vista como inautêntica. Esta surge da união de elementos provindos das culturas erudita e popular, somados a alta reprodutibilidade técnica. A cultura é vendida pela indústria cultural como uma forma de entretenimento que permita manter a população sob controle, satisfeita em poder consumir arte de modo simples e agradável.
O foco das análises efetuadas pelos integrantes da Escola de Frankfurt se voltou para o que na linguagem marxista-leninista se chama de “superestrutura”. A mesma consiste em mecanismos que atuam visando manter a estrutura social, exercendo sua força sobre a formação e manutenção das personalidades individuais, das famílias e da forma como concebemos a autoridade. Estes elementos se fazem presentes na cultura de massa e no modo como elementos da arte são ali trabalhados. Deste modo, a arte presente na indústria cultural de massa se torna em principal responsável pela dominação. Do mesmo modo que uma fábrica, a indústria cultural tem uma atuação produtiva, sendo seu produto a arte. Aqui temos a formação cultural por meio de produtos artísticos, tais como: filmes, peças de teatro, livros, músicas, pinturas, fotografias, etc. Trata-se de uma padronização visando perpetuar na sociedade os valores capitalistas, burgueses e tradicionais.
A dicotomia presente entre classe operária, o proletariado, e a classe dos comerciantes e industriais, a burguesia, se mostra ineficaz diante da possibilidade de uma revolução na qual o proletariado venha a desempenhar um papel decisivo, em verdade, o proletariado perde seu protagonismo enquanto classe revolucionária, como anteriormente havia sido proposto por Marx. Saindo do eixo burguesia e proletariado, uma leitura dos trabalhos presentes nesta escola propõe que o eixo seja entre opressores e oprimidos. Visão esta apresentada por Marcuse em “O homem unidimensional”, na qual a revolução que irá mudar a estrutura social sai das mãos da classe operária, do proletariado. A esperança de mudança passa a ser dada por aqueles que não possuem mais nenhuma esperança, nada a perder. São os proscritos, os excluídos das benesses do sistema político econômico, que passam a ter um grande potencial destrutivo das estruturas então vigentes e, portanto, revolucionário.
A Escola de Frankfurt se mostra como um importante movimento intelectual ocorrido no século XX, de cunho social, político e filosófico que propõe uma re-leitura do pensamento marxista e sua adaptação a realidade vivida pelos integrantes desta escola em meio a grandes transformações sociais. A leitura que eles fizeram da situação pelo prisma da esquerda, visando uma renovação em busca de alcançar objetivos revolucionários, pode ser considerada atual hoje em dia e ser lida também pela direita política buscando, hoje, entender determinados posicionamentos políticos adotados pela esquerda. Se a arte pode ser usada pela indústria cultural capitalista como uma forma sutil para difundir propaganda sobre as benesses do sistema e, deste modo, perpetuar a submissão do trabalhador, evitando a formação de uma consciência revolucionária da classe operária, também pode ser usada para divulgar conteúdos que façam propaganda em prol de interesses defendidos pela esquerda nos dias atuais. Cabe, no entanto, a crítica sobre o quanto as pessoas são de fato tão passivamente afetadas por tal exposição de ideias e valores.
Silvério da Costa Oliveira.
Prof. Dr. Silvério da Costa Oliveira.
Site: www.doutorsilverio.com
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