O toque de Midas que lhe leva a fama instantânea – Big Brother, A Fazenda, etc.
O toque de Midas que lhe leva à fama instantânea
Por: Silvério da Costa Oliveira.
Vamos conversar, neste breve momento, sobre algo que também tem se mostrado por demais breve, refiro-me às celebridades instantâneas e efêmeras, que surgem tão rapidamente como também desaparecem. Penso nos anônimos de hoje que serão os super famosos de amanhã, para depois retornarem a mergulhar nas profundezas do total anonimato. Os reality shows e as redes sociais ajudam e muito pessoas sem conteúdo a obterem um pequeno intervalo de notoriedade e fama. Mas não confundamos, por favor, fama com sucesso. Fama é simplesmente ser conhecido e falado por todos, algo que pode ser breve ou duradouro e que não denota nenhuma virtude excepcional da pessoa, por vezes o que fala mais alto é o bizarro e grotesco mesmo. Já sucesso é fruto de um plano de metas, de esforço e dedicação, de estudos e planejamento, de investimentos e criação de conteúdo, tudo isto para propor metas e alcança-las. Quando atingimos nossas metas, obtemos sucesso, mesmo que no mais absoluto anonimato.
Ao olhar para o fenômeno que leva pessoas do anonimato para o estrelato, mesmo que por demais momentâneo, nos deparamos com algo realmente fascinante e também paradoxal. Estamos vivendo a era do “toque de Midas digital”, onde por meio das inúmeras mídias e redes sociais disponíveis, um vídeo ou foto ou situação pode se tornar altamente viral. Do escrito em um breve tweet até a participação em um reality show, dos muitos que hoje existem, podemos ter a mola propulsora que joga o indivíduo do total anonimado para o alto da fama, se bem que em geral esta seja passageira. Pelo toque de Midas se passa rapidamente da obscuridade para a fama, mesmo que efêmera por falta de conteúdo.
Aquele que ocupa o papel de atuar como celebridade se coloca em visibilidade intensa, sendo pelos fãs observado, idealizado e adorado. Com a enorme exposição resultante de ser catapultado para a total visibilidade, a pessoa passa a estar na boca de todos, passa a ser amada, mas também odiada. Mesmo as coisas mais banais de sua vida passam a ser discutidas como se sérias fossem. Uma trajetória que em muito lembra um truque de magia, onde de uma cartola vazia se tira um coelho. Antes não estava lá, agora está. Para a pessoa em sua fantasia, quando tocada por este Midas midiático, é como se um dedo invisível apontasse para ela e uma voz lhe dissesse: “vai, que agora é a sua vez”. Infelizmente, o esquecimento é tão rápido quanto a ascensão. Pode-se ter a ilusão da criação de uma superestrela da noite para o dia, mas em algum momento as luzes se apagam no palco da vida e é como se nada disso fosse de fato real.
Dentro de uma multidão de pessoas anônimas, eventualmente uma ou outra irá brilhar como se fosse uma estrela no céu azul noturno, algo momentâneo e efêmero, mas cujo brilho pode ser altamente intenso. Refiro-me a um fenômeno que surge no século XX e prossegue pelo século XXI, que recebeu o nome de “celebridade instantânea” no qual uma pessoa desconhecida do povo ganha momentâneo enorme destaque nas mídias, passando a ser por todos conhecida, para pouco tempo depois retornar ao total anonimato de sua vida.
Como bem retrata a frase atribuída a Andy Warhol (1928-1987) desde 1968, quando durante uma exposição de suas obras em Estocolmo, Suécia, ela foi impressa em um catálogo da exposição e atribuída a ele, temos que: “um dia, todos terão direito a 15 minutos de fama”, frase esta que bem retrata o mundo das celebridades efêmeras e postulantes a esta posição. Ideia esta também presente na música “A melhor banda de todos os tempos da última semana”, dos Titãs, no ano de 2001 em álbum homônimo.
Com programas de televisão tais como os reality shows, tal fenômeno passou a fazer parte de nossas vidas cotidianas. Às vezes, no entanto, são fatos outros que tornam alguém conhecido da noite para o dia, como, por exemplo, algo pertencente as páginas policiais de um jornal tradicional, ou uma disputa familiar que envolva aspectos por demais pitorescos e ao gosto do povo e da mídia.
A fama instantânea também pode ser almejada por bandidos violentos e terroristas sanguinários, pois, depois da tentativa ou consumação do ato, continuarão famosos, quer estejam vivos ou mortos. Seus nomes e rostos irão se eternizar nas mídias, redes sociais, capas de revistas, livros e filmes. De certo modo, um forte estímulo para uma vida criminosa.
Um vídeo postado, uma foto bizarra, a participação em um reality show, o cometimento de um crime, a participação em um ato terrorista, enfim, são inúmeros os motivos causadores de uma celebridade instantânea e efêmera, sim, pois, tão rapidamente nos chegam notícias sobre sua existência, esta também some do horizonte midiático para nunca mais voltar. Ética e conteúdo se tornam via de regra ausentes e o mérito por vezes é de ser mais idiota ou bizarro que a maioria, mérito por ousar fazer algo inusitado ou mesmo esdrúxulo. Com a colaboração intensiva das mídias, precisa-se cada vez menos de dedicação, preparação, formação, ou mesmo, de proporcionar algo relevante para a sociedade. Enfim, se é famoso porque se é famoso e isto basta. Mas a fama que vem rápido, rápido vai também embora, pois, a pessoa em questão não é verdadeiramente famosa e sim somente uma celebridade do momento.
Com o advento das redes sociais, a busca frenética por visibilidade abriu um novo mercado, o de empresas que vendem visualizações, curtidas, inscritos e compartilhamentos. Algo falso e irreal dentro de algo virtual. Ora, cada vez mais as pessoas se julgam e são julgadas menos pelo que são de fato e mais pelo que aparentam ser, em particular quando esta aparência se dá em grande escala dentro das mídias do momento.
Este tipo de fama vazio de conteúdo e focado nas aparências mostradas em diversas mídias sociais é algo deveras fluido, instável e por vezes momentâneo. O sucesso de hoje será a rejeição de amanhã.
As diversas mídias têm um papel importante para alavancar estas novas celebridades, mas como há sempre a necessidade de algo novo, as novas celebridades meio que apagam as antigas e quando falo em antigas, bastam poucas semanas para uma celebridade perder totalmente a validade de consumo. As mídias possuem grande poder de amplificação de fatos, situações, personagens, tornando mais fácil o rápido crescimento e projeção do total anonimato para os holofotes de toda a sociedade ou, pelo menos, de um específico nicho no qual circula esta celebridade. As mídias tem necessidade da fabricação destas celebridades, do mesmo modo que as celebridades tem necessidade da mídia para poderem existir, de fato, estamos diante de uma dinâmica por demais complexa.
Inocentemente muitos buscam esta inusitada notoriedade, como se acreditassem mesmo que todos os seus problemas mundanos seriam resolvidos pela mesma. A fama traria felicidade, resolveria os problemas, traria satisfação pessoal, forneceria muito dinheiro, tornaria a pessoa poderosa, abriria novos caminhos sociais, enfim, levaria a vencer na vida de um modo fácil. Uma mentira, nada mais. Esta não é a verdadeira fama e sim somente as luzes breves de uma celebridade repentina que pouco irá durar diante dos holofotes da mídia. Claro que quando se é famoso há também outros aspectos com os quais a pessoa terá de trabalhar e se adaptar, como a total perda de sua privacidade resultante de ser alguém por todos conhecido e constante notícia para as diversas mídias que possam nele estar interessado por ser algo vendável naquele momento. Se não há vida privada, tudo que se faz todos sabem, pois sua vida presente, passada e futura passa a ser fruto de uma constante investigação em busca de alguma nova notícia vendável e também escandalosa. Há necessidade de um preparo emocional, nem sempre disponível para quem caiu da noite para o dia na frente dos holofotes midiáticos. Pior, alterações no comportamento decorrentes de não saber lidar com a situação podem levar a situações que destruam a sua própria imagem diante de todo o mundo que lhe observa. As expectativas presentes no “antes”, nem sempre são corroboradas pelo “depois” da notoriedade.
Muito desta fama, quando dentro das redes sociais, não decorre de um conteúdo especial desenvolvido pela pessoa e sim de métricas presentes nos algoritmos que buscam ampliar o tempo de permanência na rede pelos usuários, oferecendo entretenimento barato, rápido e leve. O desenho projetado para as principais redes sociais leva em conta um ciclo rápido de consumo e descarte. Há um grito incessante clamando por novidades, sem parar, sempre buscando o próximo da lista. Tais celebridades são como ondas no mar, surgem e quebram na praia, olhamos para uma e depois a esquecemos por completo para olhar a próxima.
Os reality shows e as redes sociais se destacam como fábricas de celebridades instantâneas. Quando pessoas comuns, que podemos identificar em nosso dia-a-dia são colocadas em situações extremas e bizarras, mostrando suas fraquezas, manias e personalidades frágeis, tendem a se tornar um cruel espetáculo para um público cujo fascínio é justamente ver como se comporta sob tensão e pressão “alguém como eu mesmo”. Simultaneamente torcendo para o sucesso, mas também para o fracasso, afinal, se é como eu mesmo, como pode ele conseguir e eu não?
Infelizmente poucos, muito poucos mesmo, conseguem sustentar a fama por longo prazo e aquilo que acreditavam inicialmente ser o pontapé inicial para suas carreiras midiáticas mostra tão falso como tudo o mais ao seu redor, incluindo elas mesmas. Deste modo, após um ápice de momentânea fama, retorna-se para o anonimato de uma vida sem graça. Pode-se surfar a onda, mas virá logo a seguir alguém para lhe ocupar o lugar, uma novidade qualquer. E isto tem um custo que se mostra no impacto emocional nas pessoas. Claro que para muitos, ficar famoso da noite para o dia pode se apresentar como um conto de fadas com um final feliz, mas pode também se mostrar como uma armadilha cruel. Para se obter a fama real e nela permanecer é preciso ter conteúdo, ter uma base real, sólida, o que em geral não está presente em tais pessoas, tornando-as completamente despreparadas para o que está por vir.
Há uma forte pressão social e emocional para que a pessoa permaneça no topo, continuem a ser relevantes, mas, por vezes, o que temos é uma caída no anonimato, o que pode ter um impacto realmente devastador ao nível psicológico na pessoa que vivencia esta gangorra social do rol da fama efêmera. As mesmas redes sociais e midiáticas que elevaram a pessoa à fama, também podem atuar de modo implacável, abandonando-a na primeira oportunidade, como se nada nunca houvesse existido.
A indústria do entretenimento possui uma necessidade imperiosa de criar novo conteúdo para manter as pessoas assistindo passivamente, sem pensar, sem questionar, deste modo, a busca por algo constantemente novo movimenta o ciclo de criação e descarte de novas celebridades. Ciclo este cada vez mais rápido, sempre buscando alguém que mantenha o constante engajamento do público. Aqui quando falamos em tempo de permanência não cogitamos anos e sim meses ou algo bem menor.
Por trás da busca frenética pela fama se encontram várias motivações e por vezes uma vida vazia que precisa ser preenchida por algo, mesmo que este algo não tenha valor algum. Para alguns, o motivo conscientemente confessado é o dinheiro, trata-se de um aparente motivo monetário. Há algo de trágico e também de cômico em tudo isto. Os reality shows deixaram de ocupar a telinha da tv para virem a ocupar toda a sociedade, pois, de posse de um smartphone em suas mãos, independentemente de sua idade, você é o show. Todos nesta sociedade passam a ser simultaneamente atores, diretores, produtores e consumidores de um bizarro show. Nas redes sociais inúmeras pessoas estão todos os dias e minutos de modo frenético tentando captar aquele momento viral ou meramente construir um avatar que mostre ao mundo o que ela quer ser como se já o fosse, a construção de uma personalidade online não existente na vida real, pois na vida real dá trabalho, é arriscado, precisa de coragem.
Famosos hoje, anônimos amanhã. É realmente espantoso a velocidade com que suposta fama chega e desaparece nos dias atuais. Para cada nova estrela a brilhar há uma multidão de outras desejando ocupar o seu lugar. Para cada onda no mar há outra só aguardando a primeira quebrar na praia e sumir para sempre, para seguir seu percurso até as areias. A velocidade é tanta que algumas celebridades podem cair no esquecimento antes mesmo de perceberem que ficaram famosas. No fundo há uma ironia aqui, pois, apesar de todo o trabalho e desejo para “se tornar alguém”, a única constante nesta equação é a presença do anonimato. Estas celebridades construídas pelas distintas mídias muito nos lembra o voo das mariposas para a luz, estas são atraídas pelo intenso brilho, que infelizmente é justamente o que as consome e por vezes as mata.
Silvério da Costa Oliveira.
Prof. Dr. Silvério da Costa Oliveira.
Site: www.doutorsilverio.com
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