Por: Silvério da Costa Oliveira.
Pierre-Simon Laplace
Pierre-Simon Laplace (1749-1827), filho de camponeses (segundo a maioria dos comentadores, ou, segundo outra corrente, teria sua origem em família de advogados, médicos, burocratas ou comerciantes), nasce em Beaumont-en-Auge, na Normandia, e falece em Paris. Recebeu de Napoleão o título de nobreza de “conde” em 1806 e, mais tarde, obteve o título de “marquês”, dado por Luís XVIII em 1817, após a restauração dos Bourbons. Em 1789 foi eleito membro da Royal Society. Foi professor da Escola Militar (École Militaire), da Escola Normal (École Normale) e da Escola Politécnica (École Polytechnique). Laplace foi cientista, matemático, astrônomo, físico, político, filósofo, escritor e professor. Laplace ganhou a alcunha de ser o “Newton francês”.
Ao falecer aos 78 anos de idade, em 1827, alguns comentadores lhe atribuem como última frase, no leito de morte: "Ce que nous connaissons est peu de chose, ce que nous ignorons est immense.", ou em versão para o português: “O que sabemos é insignificante; o que não sabemos é imenso”.
Dos 7 aos 16 anos de idade estudou em uma escola Beneditina, em Beaumount-em-Auge, posteriormente iniciou seus estudos na Universidade de Caen, em Teologia. Foi na universidade que descobriu seu talento para as matemáticas, deixando a mesma sem se formar e indo para Paris tendo em seu poder cartas de apresentação e recomendação dadas por seus professores e endereçadas ao matemático francês Jean D’Alembert (1717-1783), mas este só o recebeu após Laplace lhe enviar um trabalho de sua autoria, que muito lhe chamou a atenção. D'Alembert reconheceu o talento de Laplace e o ajudou a obter um cargo como professor na Escola Militar de Paris, o que marcou o início da ascensão de Laplace no meio científico francês.
Laplace viveu a Revolução Francesa, período de sucessivos governos e no qual cada novo grupo que chegava ao poder eliminava os que apoiavam o grupo anterior. No meio de toda esta matança, é admirável a capacidade de Laplace de permanecer vivo, se adaptando a cada novo regime político, sempre mantendo seu status de importante cientista e dando continuidade à sua carreira com o apoio do governo no poder no momento. Neste cenário presente na França de então, Laplace conseguiu posição de destaque entre os revolucionários franceses que depuseram o rei, mais tarde foi bem acolhido por Napoleão e, quando este caiu e a monarquia dos Bourbons foi restaurada, manteve-se próximo ao poder, recebendo, inclusive, novo título de nobreza: marquês.
Desde os primórdios da Revolução Francesa, passando pelo Império de Napoleão e a restauração da monarquia no poder, Laplace soube se adaptar, conviver e crescer dentro do conturbado meio político no qual vivia. Seu trabalho como pesquisador e cientista sempre se mostrou útil para o regime político dominante, fosse qual fosse, como, por exemplo, durante o período da Revolução Francesa, sua habilidade para calcular a trajetória dos projéteis de artilharia e a orientar a fabricação de pólvora.
Na física matemática é famosa e muito usada até hoje a equação de Laplace, por ele formulada. Nos seus trabalhos no campo da astronomia, estudou os movimentos de Júpiter, da Lua, e de Saturno, descobriu leis sobre os movimentos e a natureza dos cometas e também sobre o fluxo e refluxo das marés. Possui trabalhos na área da biologia química, em colaboração com Lavoisier, nos quais demonstra que nos seres vivos a respiração atua como uma combustão resultante da reação de substâncias orgânicas com o oxigênio. Também em parceria com Lavoisier desenvolveu um instrumento para medir o calor dos corpos, o “calorímetro de gelo”. Na física efetuou estudos sobre refração, velocidade do som, pêndulos e dilatação dos corpos sólidos. Na matemática realizou estudos sobre a teoria das probabilidades e foi o primeiro a demonstrar integralmente o teorema de D’Alembert sobre as raízes das equações algébricas. Também buscou explicar a origem do sol e do sistema solar a partir da existência de uma nebulosa.
Mantém um posicionamento determinista, no qual, o momento presente deve ser entendido como o resultado natural e efeito de ocorrências passadas, bem como, a causa de ocorrências futuras. Se fosse possível conhecer todas as forças que regem tudo no universo e todas as posições ocupadas por todos os entes da natureza, seria possível ao analisar todas estas informações, tudo compreender, desde os movimentos dos maiores aos menores corpos, sendo todos os eventos futuros dados como certos, do mesmo modo que o passado seria entendido como uma consequência natural de todos os eventos que transcorreram no desenrolar histórico temporal. Um tal intelecto, com o somatório de todas estas informações, é frequentemente chamado de “demônio de Laplace”, ou, na tentativa de implementar fisicamente tal empreendimento, de “computador laplaciano”. Segundo o pensamento de Laplace, a ciência deve ser entendida como um instrumento que nos permita a predição dos fatos futuros.
Seu trabalho pode ser dividido em três principais áreas: mecânica celeste, teoria das probabilidades e física matemática. No campo da mecânica celeste, buscou expandir e formalizar o trabalho anterior de Issac Newton. Trabalhando a partir das descobertas de Newton, os estudos empreendidos por Laplace negaram a possibilidade hipotética de que forças gravitacionais complexas pudessem ocasionar a desestabilização dos planetas de nosso sistema solar. Esta hipótese negada era então aceita como viável pela comunidade científica de sua época. Segundo Laplace demonstrou, o sistema solar era estável a longo prazo. Laplace propôs a teoria de que a formação do sistema solar se daria a partir de uma grande nebulosa em rotação. Esta seria a origem do sol e de todos os planetas. Seu nome se encontra associado a conceitos fundamentais, tais como: a equação de Laplace, e a transformada de Laplace. Ambas com emprego amplo tanto na engenharia, como também na física e matemática aplicada. A transformada de Laplace, apesar de levar seu nome, não foi desenvolvida diretamente por ele, mas foram suas ideias que levaram a mesma. A transformada de Laplace tem seu uso na resolução de equações diferenciais, em especial em circuitos elétricos e análise de sistemas dinâmicos. Já a equação de Laplace foi de fato desenvolvida pelo próprio Laplace, sendo grande contribuição para a física matemática e para a teoria dos potenciais.
Em síntese, a obra de Laplace abarca a aplicação da matemática a problemas físicos e a formalização de novos campos do saber. Segundo o pensamento de Laplace, a matemática tem um potencial que pode ser aplicado não somente na resolução de problemas hoje existentes, mas também na exploração de novas ideias e na previsão de novos fenômenos que ainda nos são desconhecidos.
Na mecânica celeste forneceu uma base firme para a astronomia e a análise do movimento dos corpos celestes, de modo a permitir um maior entendimento sobre o comportamento dinâmico dos planetas e satélites. Este desenvolvimento feito por Laplace se deu a partir dos fundamentos presentes na obra de Newton. Na probabilidade e estatística coube a Laplace colocar as bases para a aplicação da estatística em diferentes áreas do saber humano, dentre as quais a vida cotidiana, bem como, trazer a probabilidade e estatística para dentro do método científico. Coube a Laplace apresentar um entendimento determinístico na ciência e na filosofia, que veio a influenciar muitos autores subsequentes. Este entendimento apresentou o universo como um sistema ordenado e previsível. O desenvolvimento posterior das ciências deve muito ao trabalho de Laplace, seja pela formalização matemática ou pela ampliação das fronteiras do conhecimento. O trabalho de Laplace forneceu às ciências os métodos e teorias que vieram a permitir avanços na física, na astronomia e na estatística até os dias atuais.
PRINCIPAIS OBRAS
1- Exposition du système du monde. Título em português: "Exposição do Sistema do Mundo". Ano da primeira publicação: 1796.
Trabalho onde é apresentada a hipótese na qual o sistema solar surge como resultado da contração e esfriamento de uma grande nebulosa em rotação, uma nuvem de gás incandescente. Trata-se de obra sobre astronomia e os princípios que governam o sistema solar. Aqui são tratados temas tais como: as leis do movimento dos planetas, e a gravitação universal. Esta é uma obra mais acessível ao público em geral.
2- Traité de mécanique céleste. Título em português: "Tratado de Mecânica Celeste". Ano da primeira publicação: 1799-1825 (em cinco volumes).
Aqui temos uma sistematização e generalização da mecânica de Newton. As leis propostas por Newton são aqui aplicadas ao movimento dos corpos celestes. Uma exposição matemática, com base na teoria da gravitação, dos movimentos dos corpos do sistema solar. Laplace desenvolve a teoria sobre o movimento dos planetas e satélites, de modo a explicar a estabilidade do sistema solar e aprimorar os sistemas astronômicos de sua época. Obra fundamental na histórica da mecânica celeste.
3- Théorie analytique des probabilités. Título em português: "Teoria Analítica das Probabilidades". Ano da primeira publicação: 1812.
Aqui Laplace trata do desenvolvimento da teoria das probabilidades. Laplace formulou princípios que permitiram o desenvolvimento do conceito de probabilidade bayesiana e estabeleceu métodos analíticos para resolver problemas envolvendo incerteza e estatística. Este trabalho teve o mérito histórico de vir a influenciar o subsequente desenvolvimento da matemática estatística e do cálculo de probabilidades.
4- Essai philosophique sur les probabilités. Título em português: "Ensaio Filosófico sobre as Probabilidades". Ano da primeira publicação: 1814.
Versão de cunho mais filosófico e também mais acessível da obra anterior, "Théorie analytique des probabilités". Laplace explica o conceito de probabilidade e suas aplicações em distintas áreas do saber. Temos aqui uma interpretação determinística da natureza, pela qual, conhecendo todas as forças e posições dos corpos no universo pode-se prever seus movimentos futuros e inferir sobre o seu passado. Esta tese determinista ficou conhecida como “demon de Laplace” (demônio de Laplace), fazendo aqui referência a uma criatura onisciente que pudesse ser capaz de conhecer todas estas forças e posições dos objetos e consequente conhecer os fatos do passado e prever os fatos futuros.
Silvério da Costa Oliveira.
Prof. Dr. Silvério da Costa Oliveira.
Site: www.doutorsilverio.com
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