Textos filosóficos, críticos, comportamentais e sobre arte da escrita, sucesso e auto-ajuda.
Professor Doutor Silvério
Blog: "Comportamento Crítico"
Professor Doutor Silvério
Silvério da Costa Oliveira é Doutor em Psicologia Social - PhD, Psicólogo, Filósofo e Escritor.
(Doutorado em Psicologia Social; Mestrado em Psicologia; Psicólogo, Bacharel em Psicologia, Bacharel em Filosofia; Licenciatura Plena em Psicologia; Licenciatura Plena em Filosofia)
E-mails encaminhados para doutorsilveriooliveira@gmail.com serão respondidos e comentados excluindo-se nomes e outros dados informativos de modo a manter o anonimato das pessoas envolvidas. Você é bem vindo!
LudwigAndreas Feuerbach
(1804-1872) nasce em Landshut, Baviera, e falece aos 68 anos de idade emRechenberg,
Nuremberg, ambas hoje na Alemanha. Ele foi o quarto de oito filhos de Paul
Johann Anselm von Feuerbach (1775-1833), renomado jurista e criminologista que
contribuiu significativamente para a reforma do direito penal na Alemanha, com Wilhelmine
Tröster Feuerbach (1774–1852), proveniente de uma tradicional família burguesa.
Tendo Feuerbach
concluído o equivalente de nosso atual ensino médio em Ansbach, em 1823, prossegue
no ano seguinte estudando teologia protestante em Heidelberg. Posteriormente,
em 1824, muda o curso para filosofia, que passa a estudar na Universidade de
Berlim, também estudou na Universidade de Erlangen, onde concluiu seus estudos
e escreveu sua tese de doutorado, “Da razão, una, universal, infinita” (1828).
Começou a lecionar em 1829 (de 1829 a 1832 atua como professor), na
Universidade de Erlangen, onde atuou como privatdozent (professor particular). Sua
carreira acadêmica tradicional veio a término a partir da publicação no ano de
1830 de “Pensamentos sobre a morte e imortalidade”, obra anônima na qual
critica a ideia da imortalidade pessoal e rejeita dogmas religiosos. Esta obra
foi na época considerada herética e ocasionou enorme polêmica, tornando sua
permanência como docente da universidade cada vez mais difícil e inviável. Em
1830 conhece Bertha Löw, com quem se casa em 1837, vindo a morar no castelo da
família de sua esposa, em Bruckberg.
Membro da
esquerda hegeliana, sendo o mais destacado e influente representante deste
grupo. Desenvolveu fortes críticas a teologia especulativa. Comentadores
destacam a influência que seu pensamento exerceu sobre Marx e Engels e mais
tarde, também sobre Freud. É considerado como tendo desenvolvido uma filosofia
humanista e antropológica de base ateísta. Como eram contemporâneos, Feuerbach
teve oportunidade de ler “O capital”, escrito por Marx e Engels, que irá
exercer alguma influência em seus últimos trabalhos. Alguns comentadores
entendem ser o pensamento e obra de Feuerbach uma transição entre o Idealismo
Alemão por um lado, e o materialismo histórico, por outro, ou seja, o veem como
um antecessor de Marx e Engels.
Para muitos
comentadores, a principal e essencial obra escrita por Feuerbach é “A essência
do cristianismo”, do ano de 1841, e no qual temos uma filosofia radical e
humanista que busca interpretar e criticar a religião, mas também traz
implícito uma crítica a filosofia da religião de Hegel. Apesar desta crítica
poder ser aplicada a todas as religiões, há um lugar de destaque para o
cristianismo e o conceito de encarnação de Deus, presente em Hegel.
Apesar de sua
influência e importância, Feuerbach tem contra ele alguns pontos que podem
prejudicar que este seja amplamente conhecido em nossos dias fora dos meios acadêmicos
onde o mesmo é estudado. Ocorre que este pensador se encontra historicamente
entre outros que são muito conhecidos, primeiramente Hegel e depois a dupla
Marx e Engels, isto somado ao fato de que sua filosofia apresenta uma forte
crítica tanto ao pensamento filosófico de Hegel, como também a teologia cristã.
Contrariando o conceito de “espírito”, de Hegel, entende que a coisa observada
precede a razão e a ideia que dela temos, por sua vez, no campo da teologia,
Feuerbach entende a mesma como sendo consequência da antropologia, ou seja,
Deus é criação e projeção do humano e a religião com suas crenças e dogmas é
algo da esfera do imaginário e não do real. Em seu trabalho argumenta que a
religião se apresenta como um tipo particular de doença mental, na qual os
conceitos do ideal humano são transformados em objeto, criando um ser supremo.
Aqui temos um tipo de alienação do humano diante da religião.
Seu trabalho nos
apresenta uma luta contra a opressão do humano, buscando que este obtenha uma
vida digna e livre da pobreza, mas aqui na Terra dos vivos e não após a morte
em um ilusório paraíso prometido pela religião. No pensamento desenvolvido por
Feuerbach temos a presença de um materialismo que se opõe aos ideais
metafísicos religiosos, apresentando as religiões e os deuses como criações
humanas. Trata-se de um pensamento que nega a verdade da religião, dos dogmas e
de qualquer idealismo. Ao priorizar este mundo, e não outro após a morte, e ao
entender ser o humano o criador de Deus, e não o contrário, isto torna este
autor materialista e ateísta.
Segundo o
pensamento de Feuerbach, o ser é matéria e o pensamento é seu atributo. O
humano é criado por meio da situação material na qual este vive. Primeiro temos
a coisa material e depois a ideia desta mesma coisa, uma fruta qualquer (maçã,
laranja, pera, etc.) antecede a ideia que temos dela. A natureza existe de modo
independente e autônomo em relação ao pensamento humano. A natureza possui
precedência ao “espírito” (“espírito” aqui no sentido dado por Hegel), sendo a
natureza o fundamento não deduzível, imediato, não criado, presente na
existência real, aquela que existe e consiste por si-mesma. Esta natureza é
dada ao humano por meio de seus sentidos.
Precursor do
materialismo filosófico, mas dentro de uma abordagem eminentemente
antropológica e humanista, e não econômica ou com ambições científicas, tal
como encontramos em Marx e Engels. Sua abordagem se mostra como antropocêntrica
e na prática representa uma crítica ao idealismo então presente na filosofia,
que nosso filósofo entendia ser excessivamente especulativo e longe das reais
preocupações humanas.
Feuerbach é
considerado por comentadores como sendo um dos fundadores da antropologia
filosófica. Para este pensador, o ponto central de estudo da filosofia deveria
ser a essência do humano e não as preocupações metafísicas tradicionais.
Feuerbach entendia que o humano é um ser natural e sensível, totalmente
vinculado ao mundo físico do qual provém. Sua essência é relacional, ou seja,
realizada a partir de suas interações com outras pessoas. Não é possível,
segundo Feuerbach, separar a consciência, seja individual ou coletiva, das
condições materiais e das relações sociais.
Feuerbach
entendia ser o sistema de Hegel uma total inversão da realidade, que colocava o
pensamento como sendo primário e a matéria secundária, quando o que ocorre na
realidade é que a matéria precede o pensamento. Entendia que caberia à
filosofia abandonar o trabalho com abstrações metafísicas e se dedicar ao
concreto: o humano, a natureza e as relações interpessoais. Todas as ideias e
conceitos se originam no mundo sensível, sendo o mundo material a única
realidade realmente existente. Propõe uma nova filosofia fundada na experiência
humana e na natureza, no lugar do idealismo metafísico.
O humano em
Feuerbach difere do humano em Hegel, pois, segundo Feuerbach o humano é um ser
real e concreto e não abstrato, está inserido dentro da natureza, possui um
corpo sensível e ideias próprias. Este humano cria seus deuses e religiões e
ali projeta a sua própria natureza, sua corporeidade, sua sensibilidade, suas
necessidades. Os atributos que o humano gostaria de ter, mas não tem, projeta
em Deus, deste modo, este apresenta qualidades tais como: onisciência, ser
ilimitado, onipotência, onipresente. O humano não é transcendente, eterno,
imutável e santo, mas Deus o é. Os atributos que este humano possa querer para
si, mas que se mostram impossíveis de serem atingidos, são projetos neste ser
que é Deus.
Encontramos em
seu pensamento uma busca de compreensão do fenômeno religioso por meio de uma
antropologia humanista, deste modo, a religião passa a ser explicada a partir
do próprio humano. Trata-se aqui de uma ruptura com a especulação filosófica
anterior, em particular Hegel, e com a teologia racional cristã. Na religião
cristã não é dado valor ao corpo humano, sendo o percurso da vida humana
entendido somente no sentido de seu futuro voltado para a imortalidade após a
morte, dada a alma humana. Há na base da religião cristã um certo desprezo ao corpo,
que encontra suas origens no mundo das ideias de Platão, bem como, da ideia do
corpo enquanto cárcere da alma. Feuerbach pensa o humano reintegrando-o a sua
sensibilidade, buscando a totalidade humana.
Em seu
pensamento, a natureza se mostra como sendo autônoma, sem a necessidade da
existência de um Deus criador. Cabe ao espírito humano criar todos os atributos
conferidos a Deus, o que conhecemos sobre Deus é fruto da cultura desenvolvida
pela humanidade. Na verdade, o mundo religioso é a duplicação do mundo real. As
diferenças entre os deuses são diferenças entre os humanos, isto porque deus é
uma projeção dos humanos. Os animais são diferentes dos humanos por estes
últimos possuírem uma consciência e é justamente esta consciência que permite
aos humanos terem uma religião e aos animais, não. Deus é uma entidade criada
pelo humano e todos os fenômenos tidos como sobrenaturais são, na verdade,
naturais. Segundo seu pensamento, não foi Deus quem criou o homem a sua imagem
e semelhança e sim o homem quem o fez em relação a Deus.
É a consciência
que o humano possui de Deus que nos permite compreender a crença que o humano
tem de Deus. Esta consciência que o humano possui de Deus é na verdade a
consciência que este possui de si mesmo. Deus é uma criação humana que expressa
seus sentimentos mais profundo e algumas características que em grau menor
podemos encontrar já no humano. Esta concepção transforma a teologia em uma
forma de antropologia, já que todos os discursos sobre atributos presentes em
deus ou nos deuses, são não sobre deus, mas sobre o humano. Nestas projeções,
temos presente e ampliadas as capacidades humanas e respostas as suas
frustrações na vida. Já que a natureza é o que é, sendo indiferente aos
sofrimentos e prazeres humanos, estes criaram deus para terem alguém que os
escute e defenda, bem como, que explique o que não conseguem explicar. Deste
modo, deus se apresenta como sendo o espelho do humano. A religião não é um
acontecimento divino e sim meramente humano. Para melhor compreendermos o
humano, basta conhecer em profundidade as religiões que estes professam, pois,
ao invés do mistério divino ser revelado aos humanos, pela religião é
justamente o mistério humano que nos é revelado por meio do divino, já que este
é criação humana.
Esta visão sobre
deus e a religião serem uma projeção humana, afeta também o modo como Feuerbach
vê a moral, pois, invertendo a relação, pensa que enquanto a moral religiosa
proclama o amor a Deus, a verdadeira moral deve destinar este amor ao humano em
nome dele próprio. Feuerbach nega a imortalidade pessoal, entendendo ser esta
crença um reflexo do medo da morte. A mortalidade humana é parte essencial de
nossa existência.
Feuerbach não
rejeita a religião individual, particular, de cada um, mas busca desmistifica-la
por meio de sua crítica, apresentando Deus e tudo que está presente nas
religiões, como criação e projeção humana. A religião atua de forma alienante,
pois, o humano transfere suas melhores qualidades ou ambições para um ser
externo e imaginário, enfraquecendo a si-próprio neste processo, pois, torna-se
dependente de algo externo a si, em vez de reconhecer sua própria força e
potencialidades, desenvolvendo-as. Estamos diante de uma antropologia
filosófica, pois, para melhor entendermos o humano, cabe entender a religião,
na qual encontraremos suas principais necessidades emocionais, seus desejos e
aspirações.
Busca
desenvolver em seus trabalhos uma ética humanista que enfatize o valor do amor
e da solidariedade humana como base na qual seja construída a vida moral. No
amor, segundo Feuerbach, encontramos a expressão máxima da essência humana,
sendo o princípio ético central e a força que liga todas as pessoas. A moral
não provém de legislações, sejam humanas ou divinas, mas de reconhecermos o
outro como um igual. Sua ética, portanto, não possui uma base religiosa, sendo
seus valores oriundos da experiência e necessidades humanas. Trata-se de uma
ética secular onde a realização do humano se encontra na interação com outros
humanos e a natureza.
ALGUMAS DE SUAS
PRINCIPAIS OBRAS
1- Pensamentos
sobre morte e imortalidade. Título original: Gedanken über Tod und
Unsterblichkeit. Data de publicação: 1830.
Originalmente
escrito sob pseudônimo. Apresenta a transição de Feuerbach em direção a um
pensamento crítico em relação à teologia. Nesta obra rejeita a ideia da
imortalidade pessoal, não havendo vida após a morte. A busca do sentido da vida
deve se dar neste nosso mundo finito. Obra fundamental para entender a passagem
em seu pensamento, do hegelianismo para a crítica da teologia.
2- Crítica da
filosofia hegeliana. Título original: Kritik der Hegelschen Philosophie. Data
de publicação: 1839.
Aqui temos o
rompimento definitivo do pensamento de Feuerbach com o pensamento de Hegel. Uma
crítica ao idealismo absoluto e o sistema hegeliano. A filosofia não deve se
basear em abstrações metafísicas e sim em experiências humanas concretas.
3- A essência do
cristianismo. Título original: Das Wesen des Christentums. Data de publicação:
1841.
Segundo o
pensamento do autor, a religião se apresenta como sendo uma projeção dos
desejos e aspirações humanas. Deus é uma criação humana que reflete as
qualidades mais elevadas que a humanidade aspira a ter. Deus não existe de modo
independente dos humanos que o criaram. Obra muito importante para entender em
Feuerbach sua filosofia antropológica e a crítica da religião.
4- Princípios da
filosofia do futuro. Título original: Grundsätze der Philosophie der Zukunft. Data
de publicação: 1843.
Nesta obra temos
uma síntese da filosofia antropológica desenvolvida por Feuerbach. Propõe
substituir a metafísica idealista por uma filosofia que seja pautada na
experiência sensível e nas reais necessidades humanas. Esta obra é decisiva no
contexto do afastamento deste filósofo da corrente idealista, sendo um resumo
de seu projeto filosófico, dando ênfase na antropologia filosófica e na
superação do idealismo.
5- A essência da
religião. Título original: Das Wesen der Religion. Data de publicação: 1846.
Esta obra se
apresenta como sendo um complemento a sua outra obra, “A essência do
cristianismo”. Nesta obra a religião é tratada como sendo um fenômeno
antropológico e o autor argumenta que todas as religiões refletem a projeção
das condições humanas.
6- Teogonia. Título
original: Theogonie. Data de publicação: 1857.
Trata-se da
última grande obra escrita por Feuerbach, na qual retorna e sistematiza suas
ideias sobre a origem e natureza dos deuses nas culturas humanas, priorizando
papel antropológico presente na religião.
Arthur Schopenhauer
(1788-1860) nasce em Danzig, atualmente "Gdańsk",
parte da Polônia, e falece aos 72 anos de idade em Frankfurt. Filósofo alemão
cuja principal obra é "O mundo como vontade e representação", 1819
(quando o filósofo contava 31 anos de idade), sendo, no entanto, que a obra que
fez mais sucesso e o tornou realmente conhecido ainda em vida foi “Parerga e Paralipomena”, 1851 (quando o filósofo
contava 63 anos de idade), obra esta adorada e enaltecida por seus
contemporâneos e último trabalho publicado deste filósofo.
Em vida,
Schopenhauer publicou um total de seis livros, a saber: 1- Sobre a Quádrupla
Raiz do Princípio da Razão Suficiente (Über die vierfache Wurzel des Satzes vom
zureichenden Grunde), 1813; 2- O Mundo como Vontade e Representação (Die Welt
als Wille und Vorstellung), 1819; 3- Sobre a Visão e as Cores (Über das Sehen
und die Farben), 1816; 4- Sobre a Liberdade da Vontade Humana (Über die
Freiheit des menschlichen Willens), 1839; 5- Sobre os Fundamentos da Moral
(Über die Grundlage der Moral), 1840; 6- Parerga e Paralipomena (Parerga und Paralipomena),
1851.
Seu último
livro, “Parerga e Paralipomena”, foi o que lhe trouxe fama e notoriedade.
Trata-se de coletânea de ensaios e aforismos sobre diversos temas que somaram
cerca de 1.300 páginas quando da primeira edição (dividida em dois volumes) e,
como em outras edições após a morte do autor foram acrescentados outros textos,
podemos ter hoje edições com 1.600 ou mais páginas. Este livro acabou gerando
inúmeros outros, pois, diversas editoras apresentaram seleções de textos
organizados sob algum tema específico e publicados como novos livros com
títulos diferentes, as vezes também mesclados com textos de outras de suas
obras. Alguns destes títulos são: 1- A Arte de Ser Feliz; 2- A arte de
insultar; 3- A arte de lidar com as mulheres; 4- A arte de ter razão; 5- A arte
de escrever; 6- Aforismos sobre a sabedoria de vida; 7- Pensamentos sobre
religião; 8- Estudos sobre o homem e a natureza; 9- A arte de envelhecer; 10- A
arte de escutar; 11- Sobre a dor e o sofrimento; 12- Sobre a vontade humana; 13-
Sobre política e sociedade.
Filho de Heinrich
Floris Schopenhauer (1747-1805) e Johanna Schopenhauer (1766-1838). Seu pai era
um rico comerciante e sua mãe, após a morte do pai, veio a se tornar uma
escritora famosa que abria os salões de sua casa para receber pessoas ilustres
de sua época nos círculos intelectuais.
A relação entre
mãe e filho foi conflituosa, em particular após a morte do pai. Johanna
considerava Arthur difícil e pessimista, enquanto ele a via como superficial e
frívola, esta situação acabou culminando em ambos cortarem totalmente relações
entre si.
Em 1793 sua
família se muda de Gdańsk para Hamburgo, apesar de
continuar a manter os negócios em Gdańsk. O motivo foi a anexação de Gdańsk
pela Prússia neste mesmo ano e ao fato de Hamburgo possuir uma constituição
republicana. Além de Schopenhauer, a família também teve Adele, nascida em
julho de 1797, mesmo ano em que Schopenhauer é enviado para viver uma temporada
com a família do sócio de seu pai em Le Havre. Lá permaneceu por dois anos,
aprendeu a falar francês e o uso de um instrumento musical, a flauta.
No ano de 1803
escolhe acompanhar os pais em uma turnê pela Europa, passando pela Holanda,
Grã-Bretanha, França, Suíça, Áustria e Prússia, em viagem de lazer e negócios. Nova
viagem realizou em setembro de 1818, para Veneza, Bolonha, Florença, Nápoles e
Milão. Agora viajando sozinho ou acompanhado por outros turistas. Em outras
épocas de sua vida, empreendeu novas viagens pela Europa.
Seu pai era um
rico comerciante e Schopenhauer estudou para também ser comerciante, tendo
atuado alguns anos nesta atividade, no entanto, com a morte do pai, em 1805,
veio a receber como parte de sua herança uma robusta fortuna, que este investiu
e lhe proporcionou uma boa renda mensal. Sua relação com sua mãe não era boa e
eles acabaram se separando, cada qual vindo a morar em cidades diferentes. Em
Weimar sua mãe passou a construir uma carreira como escritora e a frequentar os
círculos sociais, abrindo o salão de sua casa para receber figuras ilustres. O
rompimento definitivo entre os dois ocorreu no ano de 1814.
Schopenhauer se
matriculou na Universidade de Göttingen em 1809, inicialmente para estudar
medicina, mas depois trocou o curso por filosofia, em 1810, na mesma
Universidade de Göttingen. Em 1811 passa a estudar
na Universidade de Berlim e esteve presente nos cursos ministrados por
Schleiermacher e Fichte nesta Universidade. Em 1813 obteve o grau de Doutor pela
universidade de Jena, com a apresentação da tese: “Sobre a Quádrupla Raiz do
Princípio de Razão Suficiente” (Über die vierfache Wurzel des Satzes vom
zureichenden Grunde). Estando morando em Berlim desde o ano de 1811 com o
objetivo de estudar na Universidade de Berlim, no ano de 1813 Schopenhauer
deixou Berlim e se dirigiu a Weimar, temendo a instabilidade gerada pelas
Guerras Napoleônicas e buscando um refúgio mais seguro para continuar seus
estudos filosóficos, já que temia que a cidade fosse invadida e não queria
participar da guerra então em curso. Fica um mês nesta cidade, mas se desentendendo
com a mãe, vai para Rudolstadt.
Ele obteve o
título de Privatdozent (professor particular) na Universidade de Berlim. Por
duas vezes tentou atuar como professor na Universidade de Berlim, mas lá ficou por
pouco tempo. Sua permanência em Berlim durante a primeira tentativa (1820–1821)
e a segunda tentativa (1825–1831), foram breves, sendo um pouco mais demorado
na segunda.
Em 1820 fez sua
primeira tentativa como professor na Universidade de Berlim, mas marcou suas
aulas no mesmo horário das ministradas por Hegel, na época filósofo famoso e
com classes que obtinham adesão de cerca de 200 alunos, contra os cerca de 4
que se matricularam nas aulas de Shopenhauer, o que encerrou esta primeira
tentativa no ano de 1821.
Houve uma
segunda tentativa para lecionar em Berlim, mas esta segunda tentativa também
não conseguiu atrair alunos para sua classe. Ele deixa Berlim em direção a Frankfurt
quando a cidade enfrentou uma epidemia de cólera, mesma epidemia que matou
Hegel.
Sua principal
obra, tal como é considerada hoje em dia pelos estudiosos e comentadores, é “O
mundo como vontade e representação”, 1819, mas esta passou despercebida pelo
mundo acadêmico de sua época e pelas demais pessoas do povo, de modo que, a
primeira edição encalhou e após alguns anos suas páginas foram usadas como
papel de embrulho, tendo sido descartadas pela editora.
É um erro
afirmar que Schopenhauer foi aos poucos obtendo reconhecimento e se tornando
conhecido, não foi assim que de fato ocorreu. Nosso filósofo se manteve isolado
e no total desconhecimento, mesmo após duas tentativas de lecionar na
Universidade de Berlim, ambas fracassadas por falta de alunos matriculados em
sua disciplina. Na verdade, seu reconhecimento e sucesso veio de modo
inesperado e abrupto. Foi algo deveras rápido e começou por parte das pessoas
comuns do povo, vindo na sequência a adesão do mundo acadêmico. Isto ocorreu
após a publicação de “Parerga e Paralipomena”, 1851, sua obra de grande
sucesso, tornando Schopenhauer uma celebridade cujas pessoas viajavam para
conhecer.
A filosofia de
Schopenhauer busca sua inspiração e fundamentação nos filósofos Platão e Kant,
bem como, nas religiões orientais, tais como o Budismo, e a ideia de ser o
mundo ilusão, maya. O Budismo e o pensamento indiano se mostram presentes, bem
como, a influência dos Upanishads (textos sagrados Indus).
Seu trabalho se
relaciona com o pensamento religioso oriental, em particular o hinduísmo e
budismo. Neste filósofo temos paralelos entre conceitos presentes em sua
filosofia e no pensamento oriental, tais como: a ideia de “vontade” e “desejo”
quando comparados com ‘trishna” (sede – dizendo respeito a insaciabilidade dos
desejos humanos como sendo o principal motivo do sofrimento) no budismo e o
"Brahman" (absoluto) no hinduísmo. Também sua ideia de superar a
“vontade” encontra acolhida na ideia de nirvana, enquanto ideal de renúncia e
libertação.
Segundo seu
pensamento, existem quatro princípios da causalidade que determinam como se
pode conhecer o mundo circundante: devir, conhecer, ser, agir. O devir se
apresenta como sendo a causalidade presente na natureza e é expressa pela
física. O conhecer se mostra como sendo uma relação entre premissas que
direciona para conclusões, expressa pela lógica. O ser se apresenta como sendo
a relação entre o espaço e o tempo, expressa pela matemática. O agir se
apresenta como sendo a relação entre a motivação e a ação, expressa pela moral.
Por meio destas quatro formas se estruturam as nossas representações.
Entende a
“representação” como sendo o mundo que se apresenta a nós, na sua total
aparência, algo inconsistente, enganoso e ilusoriamente múltiplo. Só o que
existe é a vontade, única e absoluta realidade, que se encontra por baixo das
aparências. Podemos encontrar a “vontade” por meio de uma experiência interior,
na qual nos interrogamos sobre o que seja o absoluto diante das aparências.
Trata-se de uma intuição da própria vontade do sujeito que se interroga a si
mesmo. Neste momento o corpo se revela como expressão desta mesma vontade. A
“vontade” é única e absoluta, enquanto que a “representação” nos mostra o mundo
fenomênico enquanto multiplicidade.
É considerado um
filósofo pessimista, individualista, ateu e crítico da sociedade. A morte,
segundo o pensamento de Schopenhauer se mostra como sendo o maior de todos os
temores existenciais, trata-se aqui da ideia de finitude, ideia esta que
aterroriza o humano. Segundo seu pensamento, o amor se mostra como sendo uma
vontade irracional para reproduzir e, deste modo, permitir a continuação da
espécie, da vida, do sofrimento. O impulso para a reprodução é tão forte quanto
o medo da morte, fazendo com que em algumas situações as pessoas arrisquem suas
vidas para atender a este impulso. Entende que este amor provoca uma breve
sensação de felicidade, que interrompe o “querer”, sendo, portanto, uma fuga da
dor imposta pela vontade. O sofrimento se mostra como algo constante, positivo,
já a felicidade como algo momentâneo, negativo. A felicidade é entendida como
sendo a interrupção da dor, e do sofrimento, bem como do tédio, por um breve
lapso de tempo, sendo na verdade esta constância da dor, sofrimento e tédio algo
permanente em nossas existências humanas. A meta do viver se encontra em viver
com o menor sofrimento possível.
A vida humana é
governada pela “vontade”, a qual para sobreviver e se perpetuar faz uso do
desejo sexual, gerando a procriação e a permanência da espécie. A busca
incessante propiciada pelo desejo tende a levar ao sofrimento, já que nada há
de satisfazer a este desejo. Segundo o pensamento de Schopenhauer a vontade
está presente em tudo, não somente no ser humano. Somente renunciando a todos
os desejos em busca de um estado de nirvana é que se pode tentar libertar da
força desta vontade. É neste ponto em que o filósofo há de buscar inspiração
nos escritos religiosos indianos, como também no cristianismo em suas origens.
A filosofia de
Schopenhauer parte inicialmente da distinção entre coisa em si (noumenon) e
fenômeno, dada por Kant em sua filosofia. Kant também nos fala sobre as formas
a priori de nossa sensibilidade, o espaço e o tempo, e das categorias do
entendimento (no total de 12 na obra de Kant), o que leva Schopenhauer a
concluir no desenvolvimento de sua própria filosofia que o mundo não passa de
representações. Estas representações são inicialmente entendidas como uma
síntese entre o subjetivo e o objetivo, entre a realidade exterior e a
consciência humana. Em vários pontos a filosofia construída por Schopenhauer
encontra seus fundamentos e inspiração na filosofia de Kant, mas estes se
afastam explicitamente no tocante à coisa em si, inacessível ao conhecimento
cognitivo para Kant, no entanto, igualada à “vontade” segundo Schopenhauer. Há
uma vontade única em toda a natureza, essencialmente metafísica. Tanto em
humanos como no restante da natureza, a “vontade” é o princípio fundamental.
Claro que esta aproximação da coisa em si com a vontade presente não somente em
humanos, mas em toda a natureza, possui algo de metafórico e Schopenhauer não
cai no erro de entender ser a vontade idêntica à coisa em si, mas somente algo
de semelhante.
Com base na
leitura da “Crítica da razão pura”, de Kant, Schopenhauer faz uso da distinção
entre fenômeno e noumenon (ou coisa em si) para explicar o mundo ao nosso
redor. O mundo pode ser compreendido por meio de duas verdades complementares,
uma gnosiológica e outra metafísica. Pelo olhar gnosiológico o mundo que nos
cerca é sempre “representação”. Já pelo olhar metafísico o mundo é sempre
“vontade”. A “vontade” se espelha no mundo objetivando-se em inúmeros graus na
natureza, sendo o humano o mais perfeito, pois, é no humano que a vontade toma
consciência de si, descobrindo-se como origem sem fim de desejos e raiz do
todos os conflitos e sofrimento. De Kant aproveitou a divisão entre fenômeno e
noumenon, bem como, a causalidade enquanto categoria a priori do entendimento.
Kant apresenta uma tabela composta por 12 categorias, das quais Schopenhauer
somente faz uso da causalidade (causa e efeito).
Há uma diferença
entre o modo como Kant entende a relação noumenon e fenômeno com o modo como
Schopenhauer o faz. Primeiramente Kant entende o noumenon como completamente
incognoscível, enquanto Schopenhauer o iguala a vontade e pensa que podemos
conhecê-lo por intuição a partir de nossa própria vontade expressa em nosso
corpo e intelecto. Em segundo lugar, Kant entende que o fenômeno é idêntico a
toda espécie, pois todos percebemos do mesmo modo ao noumenon ou coisa em si.
Não há em Kant uma distorção da realidade, mas o há em Schopenhauer, que nos
fala no véu de Maya, que nos ilude com sua magia, nos fazendo crer ser algo
outro aquilo que percebemos em nossas vidas.
Hegel via o
mundo como algo racional, que se desenvolvia racionalmente na história, já este
nosso filósofo o vê como algo puramente irracional. A essência do mundo é
irracional, não segue o princípio da razão, sendo movido pela vontade. A
essência da realidade é a vontade. Devido a estar presente nos humanos, mas
também nos demais animais e mesmo em seres inanimados, como uma pedra, por
exemplo, a vontade em Schopenhauer acaba por se afastar do conceito que temos
de consciência, aproximando-se de algo a semelhança de um impulso para a vida
ou um tipo de poder. Em Schopenhauer a palavra “vontade” designa força, poder,
impulso, energia e desejo. Aqui o termo “vontade” faz referência a algo
infinito, uno, indizível, e não a uma vontade finita, individual, ciente. A
“vontade” se mostra presente não apenas no humano, mas em tudo na natureza. A
“vontade” se apresenta como sendo eterna e imutável, está fora do tempo e do
espaço e não tem fundamento, sendo a “vontade” o fundamento de tudo que há. A
“vontade” é a essência da subjetividade, aquilo que forma a pura essência de
cada coisa, que não pode ser conhecida por nossos sentidos, não possui um
fundamento ou origem, sendo imanente. É sua própria causa, sua razão se
encontra em si mesma.
Schopenhauer
entende que o mundo que nos circunda é formado por “representação”
(Vorstellung) e “vontade” (Wille). Esta tese foi defendida em sua obra magna,
“O mundo como vontade e representação” (Die Welt als Wille und Vorstellung),
1819. Deste modo, o mundo passa a ser entendido como duas formas
complementares. O mundo que as pessoas percebem a partir dos seus sentidos e do
seu intelecto é o que se obtém da “representação”. Isto significa, segundo o
pensamento de Schopenhauer que tudo que experienciamos passa primeiro por um
filtro, no qual estão presentes as formas de espaço, tempo e causalidade. Este
é o mundo das aparências, não o mundo real, além do mesmo se encontra a
“vontade”, uma força irracional, sem finalidade, que atua impulsionando toda a
existência, não somente a vida humana. A “vontade” se apresenta como essência,
realidade última, princípio metafísico universal, não podendo ser reduzida a
algo que seja racional ou consciente. A “vontade” é cega e incessante, sendo
responsável por tudo o que ocorre na natureza, dos ditos fenômenos físicos até
os desejos humanos. Ela também é responsável pelo sofrimento, já que nunca
poderá ser plenamente satisfeita. Se cria um ciclo de frustração, dor e tédio,
já que a natureza da “vontade” é desejar sempre e quando conseguimos aquilo que
antes desejávamos, só nos resta o tédio.
Em Schopenhauer
a vontade se apresenta como sendo cega, arbitrária, tirânica, brutal, e
responsável por todo o sofrimento existente na vida. A vontade é a força por
trás de todas as ações, desejos e impulsos humanos. A vontade está presente em
tudo no universo e não somente em humanos. A vontade exerce forte impulso para
a satisfação de nossos desejos e necessidades, mas nunca poderá ser plenamente
satisfeita, pois, já atendido um, outro desejo ou necessidade imperiosa há de surgir.
Somente pela contemplação da arte, pela moralidade e pela negação da vontade
podemos escapar deste interminável ciclo. A experiência estética proporciona um
estado de transe semelhante ao que no budismo chamamos de nirvana, permitindo a
suspensão temporária do desejo por meio da apreciação da arte e em particular
da música.
A vida se
apresenta como uma sequência interminável de “vontade” e “sofrimento”, com
efêmeros prazeres pontuando esta relação. Somente pela arte esta cadeia
infinita de eventos pode ser superada. Na experiência estética proporcionada
pela arte pode o humano anular a sua vontade esquecendo de si mesmo e do seu
sofrimento.
Uma forma, se
bem que momentânea, de escapar da dor presente em nossa realidade se dá por
meio da contemplação estética, sendo a arte a consequência prática desta breve
contemplação. Neste ponto em particular, a música se apresenta como sendo a
forma mais pura de arte, já que esta retrata a vontade em si, sem estar sujeita
ao princípio da razão suficiente. A música é a única de todas as artes, que não
se limita a copiar ideias, mas incorpora a vontade em si. A música é uma linguagem
atemporal e universal.
A vontade gera
os desejos e necessidades que precisam ser atendidos, já esta falta ou carência
oriunda dos desejos e necessidades não atendidos gera a dor e o sofrimento.
Quando conseguimos atender um desejo ou necessidade, outro imediatamente surge,
mas por um breve intervalo de tempo gozamos da felicidade, seguida do tédio.
Vários
comentadores destacam ser Schopenhauer um pensador profundamente pessimista, já
que este apresenta a vida como dor e sofrimento na busca de incessantes desejos
provindos de nossa vontade e, quando finalmente alcançamos o que buscamos, o
tédio dali resultante. Após incessantes e extenuantes batalhas para conseguir
alcançar estes desejos, um novo desejo se apresenta, de modo que a insatisfação
é algo constante.
A filosofia de
Hegel é a filosofia do progresso e do otimismo, já a filosofia de Schopenhauer
é a filosofia do pessimismo. Para Schopenhauer há um ciclo de repetições na
história, algo sem propósito ou progresso real.
Um refúgio
temporário desta dor e sofrimento imposto pela vontade pode ser encontrado na
redenção pela arte, na medida em que a arte nos propicia a suspensão temporária
da vontade. Quando diante de uma obra de arte, contemplando-a, o humano
transcende seus desejos. Neste tocante, a música tem um papel de destaque,
considerada por Schopenhauer como a arte mais elevada, já que não busca representar
o mundo fenomênico, mas sim, expressar de modo direto a essência da “vontade”.
A moralidade
baseada na razão ou em princípios universais é rejeitada por Schopenhauer. Há
uma recusa, inclusive, da ética do dever proposta por Kant. Segundo o autor, a
genuína moralidade se origina na compaixão (Mitleid), que é o reconhecimento da
unidade que existe entre todos os seres, todos somos um e, do mesmo modo, todo
sofrimento é universal.
É pela renúncia à
“vontade” que encontramos a resposta para o sofrimento. Aqui encontramos um
ponto de influência provindo das religiões indianas e o budismo em particular.
O único caminho para a libertação da vontade é a negação dos desejos e
impulsos. Esta renúncia há de ocorrer a partir do emprego de práticas
ascéticas, meditação e um determinado estilo de vida.
A distinção
entre “vontade” e “representação” encontra sua origem na inspiração da obra de
Kant, no tocante ao “noumenon” e “fenômeno. No entanto, para Kant o noumenon
não pode ser conhecido, já Schopenhauer pensa ser possível conhece-lo
diretamente por meio de nossa experiência interior, uma vez que para este
filosofo o noumenon é igualado à vontade.
Mesmo os ditos
fenômenos naturais são entendidos por Schopenhauer como sendo expressão da
“vontade”. A “vontade” atuando na natureza nos faz observar em todas as formas
de vida a luta pela sobrevivência e reprodução, esta última visando a
continuação da espécie e superando a morte do indivíduo.
Schopenhauer faz
uso em seu livro “O mundo como vontade e representação” de uma metáfora que
ficou conhecida como o “pêndulo de Schopenhauer”, que visa exemplificar a
condição humana. Na vida temos uma constante oscilação entre de um lado a dor e
o sofrimento e do outro lado o tédio, dois estados negativos e indesejados pelo
sujeito. O prazer se encontra no meio, mas o pêndulo passa rapidamente por ele,
não parando ou nele se demorando, trata-se de algo momentâneo e transitório
entre duas condições negativas presentes em nossas vidas. A dor e sofrimento é
fruto da não obtenção imediata dos desejos e necessidades criados pela vontade
de viver. Esta não satisfação dos desejos gera constante insatisfação, a
sensação ou sentimento de falta de alguma coisa. Ao satisfazer os desejos e
necessidades impostos pela vontade temos como resultado o prazer, mas este é
muito breve, pois, rapidamente cede seu lugar ao tédio e enfado e a nova busca
por outros desejos e necessidades. Esta é, em resumo, a experiência da vida
humana.
Na obra “Parerga
e Paralipomena” Schopenhauer escreve de modo metafórico sobre “onde os pombos
voam assados”("Wo
die Tauben gebraten fliegen"), ou, em uma interpretação mais livre e
poética podemos ter "os pombos já voam assados até nossas bocas",
fazendo referência a uma fictícia e utópica, mesmo absurda, ideia de civilização
perfeita, onde não houvesse qualquer esforço ou sofrimento por parte das
pessoas. A escolha por “pombos” faz alusão ao contexto histórico e cultural
Europeu, onde estas aves eram, e ainda são consideradas alimento e fonte de
proteína animal. A frase é uma metáfora sarcástica e irônica sobre o desejo
humano por facilidades e prazeres sem o devido trabalho necessário. Já que a
filosofia de Schopenhauer enfatiza sempre o sofrimento presente na existência
humana, esta frase se apresenta como uma crítica ao otimismo ingênuo. Mesmo na
ilusão de tal sociedade perfeita e ideal na qual todas as necessidades humanas
fossem de imediato atendidas, o problema humano fundamental não encontraria
resolução. Continuaria valendo a metáfora do pêndulo existencial, que penderia
mais para o lado do “tédio”, gerando um vazio existencial e insatisfação
referente a própria existência, o que seria causado pela “vontade”, sua
natureza em relação a vida e a vontade de viver. No lugar da "dor” e do
“sofrimento” por não conseguir o que se busca, o que se deseja, teríamos o
constante tédio por já ter usufruído de nossos objetos de desejo. Uma crítica a
qualquer filosofia, política ou utopia que planeje alcançar a felicidade plena
por meio da satisfação puramente material.
Na obra “O mundo
como vontade e representação” (Die Welt als Wille und Vorstellung),
Schopenhauer usa da metáfora de um homem forte e cego carregando outro, que
consegue ver, mas é aleijado: "O corpo é como um cego forte que carrega
nas costas um aleijado que pode ver." Trata-se de uma metáfora para
ilustrar a relação existente entre o nosso corpo e intelecto, estando ambos
subordinados a “vontade”. O corpo cego e forte representa a força física e a
energia vital. O corpo age de acordo com comandos, mas não consegue se auto
direcionar. O corpo é movido pela vontade, a qual é cega e irracional. Já o
outro homem representa a razão, o intelecto, este pode ver, mas não pode se
locomover sozinho sem a ajuda do corpo do outro, por ser aleijado. O intelecto
é limitado, já que depende do corpo e da vontade para pode atuar. No fundo, o
intelecto é um escravo da vontade, atuando no direcionamento de ações e
decisões, mas sem o comando último, pois, não tem como fugir dos impulsos da
vontade. Trata-se de uma relação simbiótica entre ambos, corpo e intelecto.
Enquanto o corpo fornece a força para se movimentar, o intelecto direciona as
ações a serem feitas, no entanto, ambos são subordinados à vontade, principal
força, irracional e presente em todas as coisas, não somente nos humanos. No
fundo, o intelecto se mostra secundário em relação à vontade, pois, mesmo sendo
responsável por perceber o mundo circundante e tomar as decisões mais racionais
diante das situações dadas, sempre se mostra a serviço de desejos e impulsos
provenientes da vontade. Mesmo sendo capaz de enxergar e entender o mundo, está
preso a tirania de uma força cega e irracional que se apresenta como
insaciável.
Schopenhauer nos
fornece o exemplo da formiga Bulldog, a formiga gigante australiana (Myrmecia
gulosa), que pode chegar a 4 cm de tamanho e são bem agressivas e de aparência
intimidadora. Conta uma história sobre uma destas formigas, representando um
comportamento supostamente característico da espécie. Tendo a formiga sido
cortada ao meio, continuou a lutar com a outra metade. Independente da
realidade factual da história, a mesma tem por objetivo ressaltar que a vida é
uma luta de todos contra todos, diante dos conflitos internos e da irracional
vontade de viver. O exemplo consta de “O mundo como vontade e representação” e
tem por objetivo explicar sua filosofia por meio desta metáfora para ilustrar o
caráter cego e irracional da vontade de viver, ou seja, mesmo se a vida não é
mais possível, pois a formiga foi cortada ao meio e, portanto, irá necessariamente
morrer, os impulsos vitais continuam persistentemente em sua luta pela vida.
Aqui a luta da formiga cortada com ela própria, menos que um fato biológico
cientificamente documentado, mostra-se como uma história metafórica e
interpretativa, como imagem visando apresentar a irracionalidade da vontade. Uma
metáfora para mostrar a realidade da sociedade humana, enquanto campo de
constante luta entre os indivíduos, todos contra todos. A vontade se apresenta
como a força fundamental presente na existência, gerando conflitos diversos,
seja dentro de uma mesma pessoa, dividida internamente, ou com outros, isto
apesar de todos estarem, afinal de contas, nas mesmas condições de
sobrevivência. Ao tentar satisfazer suas próprias necessidades e desejos
individuais, mesmo em detrimento de outros, cria-se na sociedade uma constante
competição, disputa e sofrimento. A condição humana é marcada pela dor e
sofrimento, bem como, pela luta incessante. A vontade nunca é plenamente
satisfeita e isto cria um ciclo repetitivo de desejo / necessidade de um lado,
e dor / sofrimento do outro. Do mesmo modo que a formiga cortada ao meio luta
com ela mesma, a natureza humana também é dividida, partida, marcada por
tensões insolúveis, que acaba se ampliando para as demais relações e interações
humanas em sociedade. As pessoas, da mesma forma que esta formiga e mesmo sem o
saberem, estão constantemente em conflito, uma com as outras, tanto interna
quanto externamente, numa dinâmica de luta onde temos a situação de “todos
contra todos’.
Schopenhauer
também faz referência à alimentação em relação aos humanos, deixando claro que
o humano é movido pela vontade e que esta inclui os impulsos básicos para a
sobrevivência do corpo, como no caso, o ato de comer, se alimentando para poder
sobreviver. Não há uma frase específica e semelhante a algo como ser o humano
“aquele que come”, mas em “O mundo como vontade e representação” podemos
encontrar: "O homem é um animal metafísico, mas, antes de tudo, é um ser
que precisa comer." A animalidade está presente no humano, como em
qualquer outro animal. Todos os animais precisam atender as suas necessidades
básicas de sobrevivência, sendo escravos de sua vontade. Apesar da busca
metafísica por transcendência em relação a sua condição material, fazendo uso
da arte, da filosofia e de reflexões sobre sua própria existência, o humano não
consegue eliminar sua realidade física e do mesmo modo que outros animais,
também precisa comer. Comer se apresenta como sendo uma das manifestações
primárias da vontade de viver. Temos a dor e sofrimento oriundos da fome, na
qual a vontade exerce enorme pressão sobre o corpo na busca de uma saciação
momentânea, apenas um intervalo, algo por demais efêmero até a próxima
necessidade, o próximo desejo imperioso que também busca ser atendido. Comer
nesta metáfora é mais que um mero ato físico, representa a condição humana, a
relação entre o corpo e intelecto por um lado, e por outro a vontade expressa
na dor e sofrimento decorrente do não atendimento imediato do desejo. Fome e saciedade
nos animais se apresentam como um ciclo contínuo que reflete a natureza
insaciável da vontade e a perpetuação do sofrimento.
Interessante a
temática sobre o suicídio em Schopenhauer, pois, inocentemente se poderia
pensar ser o suicídio uma fuga para o constante sofrimento presente na
existência, mas isto é falso, uma mera ilusão. O suicídio não consegue
enfrentar a raiz metafísica do problema, que é a vontade de viver, totalmente
imperiosa, cega e irracional. Em verdade, o suicídio é também motivado pela
vontade, já que é uma reação ao sofrimento e a insatisfação constante. O
suicida não renuncia à vontade de viver, somente a sua própria existência
individual. Seu ato ocorre porque este está frustrado por não poder atender a
sua vontade e ter de conviver com sua atual condição de vida. O suicídio não
resolve o problema fundamental do sofrimento, inerente à vontade, sendo uma
mera tentativa de escapar de situações intoleráveis para a pessoa. A vontade de
viver é a essência da existência e se faz presente em todos os seres vivos como
impulso contínuo para continuar existindo. O suicídio não consegue eliminar a
vontade, enquanto princípio metafísico. Não passa de um ato individual, também
motivado pela vontade de viver, ou seja, não é uma superação e sim uma
continuação da submissão à vontade. O suicídio não deve ser entendido como um
pecado contra a Divindade, como o querem algumas religiões, e também não como
um crime ou algo imoral, trata-se somente de um ato ético neutro incapaz de
alcançar a verdadeira libertação da vontade.
A libertação do
sofrimento se associa à extinção do desejo e não a destruição do corpo
individual. Busca aqui Schopenhauer uma aproximação com o que no budismo
chamamos de “nirvana”. Um ideal de renúncia à vontade é o que o filósofo busca
em sua filosofia. Neste sentido, o suicídio pode ser entendido como sendo a
máxima expressão da vontade de viver, algo que pode aparentemente parecer
paradoxal, mas faz todo sentido dentro de sua filosofia. A vontade em sua
filosofia se apresenta como sendo o princípio metafísico fundamental, força
incessante que impulsiona todos os seres vivos a continuar existindo, lutando
pela sua própria sobrevivência e da espécie. O suicídio só parece ser uma
negação da vida, da vontade de viver, pois, na verdade o suicida busca escapar
do sofrimento ocasionado pela vontade. A vontade deseja ardentemente a sua
satisfação, que é a ausência da dor, a felicidade mesmo que momentânea. O
suicida busca resolver este problema dado pela vontade insatisfeita. Ao eliminar
sua existência individual, este não elimina a vontade de viver enquanto
essência metafísica, somente rejeita continuar vivendo naquelas condições
específicas as quais está submetido. Ao preferir morrer do que viver sem ter
suas necessidades e desejos atendidos, temos em verdade uma real expressão da
vontade de viver, viver uma vida diferente e melhor, na qual seus desejos e
impulsos sejam imediatamente atendidos. Não é uma verdadeira renúncia à
vontade. O ato suicida ainda ocorre dentro dos domínios da vontade, já que
busca uma solução do sofrimento e dor, por um modo que a pessoa pensa naquele
momento ser mais prático e imediato. A verdadeira motivação por trás do suicida
é o desejo de viver bem. O desejo de viver uma vida sem frustrações é o que
guia o suicida e na aparente impossibilidade de o fazer, prefere eliminar sua
existência individual, mas a vontade sempre esteve ativa no suicida, pois, este
jamais renunciou à vontade, sua decisão reflete a força da vontade, buscando o
fim do sofrimento e da dor. A vontade é algo universal e metafísico que não
pode ser eliminado pela morte. Uma pessoa morta é apenas uma única manifestação
desta vontade que se encerra. Não há por parte de Schopenhauer uma condenação
formal e moral do suicídio, mas sim o entendimento de ser este ato algo
superficial e não uma libertação genuína da vontade, o que só pode ser feito
corretamente pela ascese, negando a vontade em sua totalidade e encontrando um
estado absoluto de desapego, não uma mera e impulsiva reação as dores da vida.
O suicida não supera a vontade, se rende a mesma. A pessoa está tão vinculada
ao atendimento de seus desejos e impulsos, querendo viver uma vida sem dor e
sofrimento, que, não encontrando outra forma de satisfazer a vontade, prefere
destruir sua própria e individual existência.
Mesmo se
ocorresse um suicídio coletivo de toda a espécie humana, a vontade continuaria
a imperar, pois, esta não depende do humano para existir, estando presente em
tudo, tantos nas coisas animadas, orgânicas, como nas inanimadas, inorgânicas.
Desde a pedra até o mais elevado animal, em todos encontramos a força da
vontade. Trata-se de uma vontade metafísica universal. A vontade é uma força
cega e irracional que está presente em todas as formas de vidas e mesmo na
matéria inanimada. O ser humano e a humanidade são apenas manifestações
particulares desta vontade, que tem como característica a capacidade de
reflexão e autoconsciência. Uma hipótese absurda de um suicídio coletivo de
toda a humanidade só representaria, paradoxalmente, uma expressão extrema da
própria vontade de viver, pois, teríamos aqui o desejo humano de acabar com
toda a dor e sofrimento em um âmbito universal. Ou seja, a humanidade não
estaria agindo contra, e sim a favor da vontade. A verdadeira superação da
vontade não inclui a destruição física e sim a superação por meio de uma
mudança metafísica e espiritual que pode ser obtida na negação de todos os
desejos e impulsos.
Apesar de não
viver uma vida de ascetismo, em seus escritos prega o mesmo como solução da
relação existente entre a “vontade” por um lado, e a dor, sofrimento e tédio
pelo outro. Caberia negar a vontade de viver, afirmando uma “não-vontade”,
buscando chegar a um estado de nirvana. Uma fuga da aparente realidade por meio
do silêncio, jejum, castidade e constante e sistemática renúncia de tudo que é
aparentemente real. No entanto, cabe mencionar que os registros históricos
biográficos que possuímos de Schopenhauer nos falam que este quando jovem teve
várias mulheres visando o sexo. Em geral mulheres de classe social inferior a
sua. Ele gostava de comer bem e muito. Ele ambicionava a fama e notoriedade
desde jovem. Chegou a marcar seu curso de filosofia na Universidade de Berlim
no mesmo horário das aulas ministradas por Hegel, quando este estava no auge da
fama e Schopenhauer era um ilustre desconhecido autor de sua principal obra, “O
mundo como vontade e representação”, que simplesmente encalhou na editora, da
mesma forma que só conseguiu cerca de 4 alunos para suas aulas, enquanto cerca
de 200 disputavam no mesmo horário a classe de Hegel. Discutiu e agrediu
jogando escadas abaixo uma vizinha fofoqueira que costumava observar este
trazer mulheres para seu apartamento. Brigou várias vezes com a mãe e por fim
rompeu em definitivo o relacionamento com esta. Estes comportamentos não são de
modo algum condizentes com quem defende a prática do ascetismo. Talvez para os
outros, mas com certeza não para ele mesmo.
De um lado temos
um estado de enfado, monotonia, aborrecimento, irritação, incômodo,
desconforto, ou falta de interesse em relação a algo, do outro lado temos dor e
sofrimento, no meio encontramos a felicidade e o prazer. Um pêndulo faz este
movimento, ficando pouco tempo no meio, pois, quando conseguimos algo que
desejamos o prazer dura pouco, sendo rapidamente substituído pelo enfado e
tédio.
O único caminho
possível para superar a vontade se dá pela renúncia ascética. Somente pela
renúncia à vontade, a negação da vontade como um todo, a aceitação da dor e do
sofrimento é que podemos ter a libertação dos desejos e impulsos oriundos da
vontade. Além da prática do ascetismo, pode-se destacar também a importância da
compaixão e da contemplação. São os três níveis necessários para a superação da
vontade: 1- a arte (contemplação da beleza artística, em particular na música),
2- a moral (exercício da compaixão), 3- a ascese (práticas de negação da
vontade de viver).
Segundo
Schopenhauer em "O mundo como vontade e representação", há caminhos
(formas, vias, passos, maneiras) para superar ou, pelo menos, transcender
temporariamente a força da vontade e ele lista três: arte (Kunst), moral
(Morál, Moralität) e ascese / ascetismo (Askese). Há comentadores que se
referem a estes caminhos como “graus” ou “estágios”, fazendo referência a um
progresso hierárquico de dificuldade e profundidade.
O primeiro passo
em busca da superação da vontade é a arte. Nela temos uma temporária fuga por
meio da contemplação da beleza. Neste breve momento intuitivo nos afastamos, se
bem que temporariamente, de nossa própria individualidade. O envolvimento com a
experiência estética resultante da observação de uma obra de arte (em partícular
a que Schopenhauer considera a mais elevada, a música) nos permite o
afastamento temporário dos desejos e necessidades não atendidos, e oriundos do
impulso da vontade. O não atendimento imediato dos desejos e impulsos
provenientes da vontade gera dor e sofrimento, daí a importância da arte na
superação da vontade.
O segundo passo
é a moralidade. O comportamento moral surge do reconhecimento de que todos são
um e que a individualidade é uma ilusão. Esta compreensão gera empatia para com
o outro, parte integrante de uma unidade essencial a todos os seres. Aqui conseguimos
obter uma compreensão profunda do sofrimento universal. A moral se mostra não
apenas contemplativa, mas também ativa ao lidar com dilemas existenciais. Aqui
encontramos a compaixão pelo outro.
O terceiro passo
é a ascese, este o mais profundo de todos. Aqui temos a renúncia consciente e
deliberada da vontade, que leva a renúncia dos desejos e ao afastamento da
ideia de individualidade. Para superar realmente à vontade é preciso primeiro
reconhecer que a mesma é a causa de todo o sofrimento, somente após este
reconhecimento poderemos buscar sua rejeição, sua negação. Aqui, mais do que a
compreensão oriunda da razão, temos a presença da contemplação mística e
espiritual e práticas presentes no budismo e no hinduísmo vinculadas ao
ascetismo e ao desapego, alcançando a verdadeira libertação que nos aproxima do
estado de nirvana.
Os três caminhos
se mostram como vias alternativas e paralelas de superação da vontade. Ao se
referir aos três, apesar de haver a ideia de uma progressão, o termo “caminho”
e seus sinônimos, como por exemplo “via”, tende a se mostrar mais fiel e neutro
em relação ao texto original. Enquanto a arte nos fornece um imediato alívio e
uma experiência intuitiva de transcendência, mesmo que temporária, a moral
fornece uma resposta prática à situação vivida diante do sofrimento não somente
individual, mas universal, permitindo a compaixão e a conexão com todos os
demais, por sua vez, a ascese nos permite adentrar em um processo consciente de
negação da vontade, levando a uma maior libertação diante dela.
Dentro do
pensamento filosófico de Schopenhauer os conceitos “arte” e “estética” não são
sinônimos, apesar de muito relacionadas entre si. Ambos conceitos hão de fazer
referência ao campo da experiência artística e do belo, mas com algumas particularidades.
A “arte” (Música, pintura, poesia, escultura e outras expressões artísticas) se
mostra como uma atividade humana, por meio da qual podemos temporariamente
transcender a vontade. Trata-se de algo que possa gerar uma forma de
contemplação que suspende o desejo e, deste modo, também a dor e sofrimento por
não obter aquilo que se deseja. A arte proporciona o afastamento de uma relação
egoísta com o mundo. A “estética” é algo mais amplo, vinculado à experiência do
belo e ao seu estudo filosófico. A experiência do belo não ocorre somente nas
artes humanas, mas também na natureza e na vida em geral. A arte é parte da
experiência estética, sendo esta mais ampla que a arte por nós criada, já que
também envolveria a própria natureza. A expressão mais correta quando falarmos
sobre a transcendência da vontade seria a “arte”.
Schopenhauer apresenta
uma crítica a ética do dever proposta por Kant. Caberia encontrar ações que
possam ser entendidas como tendo um valor moral inquestionável. Cabe às ações
morais estarem sempre em relação com o bem de outras pessoas. No entendimento
deste filósofo o humano é um ser egoísta por natureza, mas na ação moral isto é
mudado, na medida em que se trata de uma ação que nega a expressão da vontade,
como se neste momento a ilusão do fenômeno fosse compreendida e o outro
deixasse meramente de ser outro, para ser semelhante a mim mesmo.
A tarefa da
ética perante à filosofia não é prescrever e sim investigar ações morais.
Schopenhauer entende que a motivação do comportamento altruísta é a compaixão
pelos sofrimentos dos outros, sentindo-se deste modo a pessoa conectada com
todos a sua volta e sendo deste modo a compaixão a base da moralidade. A ética
em Schopenhauer tem como base uma radical igualdade entre todos os seres, não
somente os humanos, mas todos os animais.
ALGUMAS DE SUAS
PRINCIPAIS OBRAS
1- Sobre a
Quádrupla Raiz do Princípio de Razão Suficiente. Título original: Über die
vierfache Wurzel des Satzes vom zureichenden Grunde. Ano: 1813 (primeira
versão).
Tese de Doutorado
de Schopenhauer, na qual analisa o princípio de razão suficiente (conceito que
afirma que tudo tem uma explicação). Divide, nesta obra, o conceito de “razão
suficiente” em quatro categorias: razão lógica, causalidade, motivação e
necessidade matemática. Se considera que esta obra vem a estabelecer as bases
epistemológicas de sua posterior filosofia.
2- O Mundo como
Vontade e Representação. Título original: Die Welt als Wille und Vorstellung. Ano:
1819.
Considerada
pelos comentadores como sendo a obra mais importante deste filósofo, nela
apresenta uma visão do mundo como sendo representação (fenômeno) e vontade
(essência irracional que tudo move). Temos uma crítica ao otimismo presente em
Hegel e uma ênfase ao sofrimento presente na existência humana. Para conseguir
alcançar a paz, propõe o ascetismo enquanto renúncia à vontade.
3- Os Dois
Problemas Fundamentais da Ética. Título original: Die beiden Grundprobleme der
Ethik. Ano: 1841.
Nesta obra são
abordadas duas questões centrais: o fundamento da moralidade e a liberdade da
vontade. Há uma defesa do altruísmo como sendo a base da moral. Segundo o
autor, a vontade humana é livre, mas determinada por forças da qual o humano
não possui consciência.
4- Parerga e
Paralipomena. Título original: Parerga und Paralipomena. Ano: 1851.
Coleção de
ensaios e aforismos abordando temas diversos, tais como: filosofia, arte,
religião, ciência. Esta obra teve grande impacto e repercussão, sendo a
responsável por tirar o autor do anonimato acadêmico e social, levando-o
literalmente ao estrelato, sendo reconhecido, se bem que tardiamente em sua
vida, como um pensador original que veio posteriormente a influenciar vários
pensadores de destaque.
5- Metafísica do
Belo e outros ensaios. Título original: Metaphysik des Schönen. Ano: Publicado
postumamente em várias edições.
O título desta
obra faz referência a seções ou fragmentos sobre a estética e o belo dentro de
outras obras maiores de Schopenhauer, como: O Mundo como Vontade e Representação
e em Parerga e Paralipomena. Trata-se aqui da compilação e publicação póstuma
de várias de suas obras consideradas menores. Esta coletânea aborda a estética,
destacando a arte, em particular a música, como uma forma de escapar do
sofrimento e suspender de modo momentâneo a vontade.