Por: Silvério da Costa Oliveira.
Hermes Trismegistus
Hermes Trismegistus (século 1 a 3 d.C.) é um personagem mítico que faz referência a uma era longínqua, mas que na verdade provavelmente é o resultado de vários escritores diferentes no transcurso do início da Era Cristã. Segundo Clemente de Alexandria (teólogo cristão do século II – obra “Stromateis” ou "Miscelâneas"), eram 42 livros divididos em 6 conjuntos temáticos (que supostamente cobria um vasto leque de conhecimento sobre leis, religião, medicina, astrologia e rituais egípcios) que formavam a obra de Hermes Trismegistus.
Vários comentadores frequentemente citam que, segundo fontes antigas, tais obras hoje perdidas, estariam divididas tematicamente do seguinte modo:
1- Leis, filosofia e religião
2- Medicina
3- Rituais e práticas sacerdotais
4- Astronomia e astrologia
5- Alquimia e magia
6- Cosmologia
O nome Hermes Trismegistus faz referência aquele que domina os três graus ou níveis do conhecimento, significando Hermes, o três vezes grande. Aqui temos um sincretismo que une o deus grego Hermes (deus dos mensageiros, da sabedoria, da magia e dos caminhos) com o deus egípcio Thoth (deus da sabedoria, da escrita, da ciência e da magia, associado à lua e ao conhecimento divino), inventor da escrita. O nome faz referência a um ser que é o revelador, o profeta, o sábio, ao mesmo tempo que em alusão ao deus grego, é também o interprete e mensageiro dos deuses. "Trismegistus" ou "três vezes grande", ou, "três vezes abençoado", reflete sua supremacia nas três áreas principais: sabedoria, conhecimento (ou escrita) e magia.
Constam relatos históricos que no transcorrer dos séculos II e III d.C. foram produzidos vários escritos atribuídos a Hermes Trismegistus, chamados de literatura hermética, estes escritos praticamente não chegaram até os nossos dias. Tais textos foram baseados na leitura e intepretação dada a Platão na época em que foram produzidos. Os textos herméticos apresentam mesclados um conjunto de influências filosóficas, incluindo o platonismo e o estoicismo. Temos neles a fusão, também, das visões religiosas presentes entre os gregos e egípcios na época do Império Romano. No passado, houve quem acreditasse tratar-se de textos anteriores a Moises e produzidos na época do antigo Egito e que tais textos já previam o surgimento do cristianismo, teriam influenciado a criação da Bíblia, Antigo Testamento, e das obras dos filósofos gregos, neste contexto, Hermes Trismegistus seria um autor pré-diluviano.
Dentre os textos atribuídos a Hermes Trismegistus encontramos “Tábua de esmeralda” e “Corpus hermeticum”, estas duas obras foram as bases da alquimia árabe e europeia medievais e, dentre as muitas que foram historicamente relatadas como pertencentes a ele, também as obras “Asclépio” e “Pimandro”, formam as quatro únicas que possuímos hoje.
Seus ensinamentos focavam a busca do autoconhecimento e também o conhecimento da natureza, estando presente dentre os textos usados na alquimia. Em “Corpus Hermeticum” são tratados temas tais como: a natureza Divina, como surgiu o Cosmos, a caída do humano do paraíso, a verdade, o Bem, a beleza. Já na “Tabua Esmeraldina” temos uma obra que foi consagrada pelos alquimistas. Trata-se de um pequeno texto (cerca de uma página A4 digitada) que pode gerar inúmeras interpretações a partir de um enorme simbolismo nele presente.
Envolto em mistério até os presentes dias, Hermes Trismegistus foi entendido e apreciado de modos diferentes no correr da história. Na Idade Média houve quem acreditasse que o mesmo foi um profeta pagão que havia anunciado o surgimento futuro do cristianismo. Já no Islã foi considerado um mestre e profeta, mas seu nome não aparece no Corão, se bem que, segundo alguns comentadores, este teria sido mencionado ali com outro nome (O profeta e sábio Idris, identificado por alguns como sendo Enoque, citado na Bíblia). No final da Idade Média e mesmo depois, seu nome foi vinculado à alquimia, sendo considerado um homem sábio que teria vivido nos tempos de Moisés (ou anterior) e mesmo teria influenciado Platão. No Renascimento seu nome se vinculou as sociedades secretas e esotéricas, buscando unir as ciências com a espiritualidade.
Coube, no Renascimento, a Marsilio Ficino e a Giovanni Pico dela Mirandola ajudarem na redescoberta dos textos de Hermes Trismegistus, bem como, atuarem na promoção dos mesmos. Estes pensadores acreditavam que os escritos de Hermes Trismegistus fossem uma fonte de sabedoria primordial que antecedia e superava a filosofia grega clássica, os escritos bíblicos do Antigo Testamento e mesmo a Cabala judaica. Marsilio Ficino chamou a este conhecimento antigo que seria a origem do conhecimento filosófico e religioso judaico-cristão, de “prisco teologia”. Tais textos tiveram profunda influência dentro de distintas tradições esotéricas, místicas e filosóficas, bem como, na alquimia e nas ditas ciências ocultas.
Dentre as principais ideias presentes na obra de Hermes Trismegistus, temos que todo o universo é perpassado pelo Uno, por Deus, quem criou este mesmo universo. O ser humano é entendido como sendo um microcosmos (igual ao macrocosmos) e por meio do conhecimento (gnose) pode se unir ao Divino, libertando sua alma que se encontra presa à matéria que é o corpo. Há uma forte ênfase no tocante à importância do autoconhecimento, enquanto caminho de redenção espiritual. A alma humana é imortal e pode alcançar e se unir com a Divindade que se encontra em seu próprio interior, compreendendo e praticando os mistérios do Cosmos. Tais conceitos e ideias exerceram forte influência em correntes filosóficas, esotéricas e espirituais, bem como, no Renascimento presente nos séculos XIV, XV e XVI, com suas características centrais de humanismo, redescoberta da Antiguidade clássica e inovações culturais e intelectuais.
Os textos que chegaram até os nossos dias foram datados por meio da análise de suas fontes e influências, tanto da filosofia neles presentes, como também provindas de análise linguística, deste modo, identificou-se a presença de elementos provenientes do platonismo, do estoicismo, da filosofia, e da religião egípcia. Já sua transmissão se deu por meio da preservação de manuscritos escritos em grego e latim, que foram resgatados e comentados no transcorrer do período medieval e no Renascimento. Membros de ordens esotéricas atuais defendem que tais textos foram escritos na época na qual foram datados, mas que são frutos de uma tradição oral bem mais antiga.
PRINCIPAIS OBRAS
1- Corpus Hermeticum. Data: Entre os séculos II e III d. C.
Coleção de 17 tratados esotéricos cuja autoria foi atribuída pela tradição a Hermes Trismegistus. Coletânia de diálogos de cunho filosófico e espiritual que tratam da relação entre o ser humano, o cosmos e o Divino. Temos presente fortes traços da filosofia de Platão, da filosofia estoica e da gnose presente no Gnosticismo. Dentre os temas abordados temos: teologia e cosmogonia; misticismo e autoconhecimento; magia e alquimia. Destaque deve ser dado a duas obras: “Poimandres” e “Discurso de Hermes a seu filho Tat”.
2- Asclépio. Data: Entre os séculos II e III d.C.
Trata-se de diálogo sobre a prática religiosa e o culto no antigo Egito. Nesta obra são abordados temas vinculados à natureza do mundo e à natureza do poder Divino. Temos considerações sobre a criação de imagens dos deuses, que eram importantes dentro da religião egípcia. Segundo consta no texto, o humano pode imitar o Divino por meio do entendimento das leis naturais e cósmicas.
3- Pimandro (Poimandres). Data: Entre os séculos II e III d.C.
Contém uma descrição sobre uma revelação espiritual dada a Hermes Trismegistus por entidade divina. A criação do cosmos (cosmogonia) e a jornada da alma para a iluminação, bem como a Divindade e o papel do humano como participante da ordem cósmica são aqui abordadas.
4- Tábua de Esmeralda (Tabula Smaragdina). Data: Entre os séculos VI e VIII d.C.
Texto bem curto (cerca de uma página A4), mas muito famoso dentro da tradição hermética. Este texto foi considerado como sendo central dentro da tradição da alquimia medieval e renascentista. Em poucas linhas o texto aborda a correspondência entre o universo (macrocosmos) e o ser humano (microcosmos). Nele encontramos a frase já consagrada e famosa dentro desta tradição: “O que está embaixo é como o que está em cima, e o que está em cima é como o que está embaixo”. A interpretação dada a este texto foi de uma descrição das leis presentes na alquimia e na interconexão cósmica.
5- O Caibalion. Data: 1908.
Segundo a tradição, escrito por três iniciados anônimos ao hermetismo. Seu objetivo é expor e explicar a tradição hermética presente na obra de Hermes Trismegistus. O livro provavelmente foi escrito principalmente por William Walker Atkinson (1862-1932), tendo a colaboração de outros escritores. A temática central da obra concentra-se nos sete princípios herméticos que regeriam a natureza e o universo, a saber: 1- Princípio do mentalismo; 2- Princípio da correspondência; 3- Princípio da vibração; 4- Princípio da polaridade; 5- Princípio do ritmo; 6- Princípio de causa e efeito; 7- Princípio de gênero.
Silvério da Costa Oliveira.
Prof. Dr. Silvério da Costa Oliveira.
Site: www.doutorsilverio.com
(Respeite os Direitos Autorais – Respeite a autoria do texto – Todo autor tem o direito de ter seu nome citado junto aos textos de sua autoria)
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