Por: Silvério da Costa Oliveira.
São João da Cruz
São João da Cruz (1542-1591) em castelhano: Juan de la Cruz. Seu nome dado ao nascer foi Juan de Yepes y Álvarez. Nasce em Fontiveros, província de Ávila, Espanha e falece em Úbeda, Jaén, na Espanha, aos 49 anos de idade. De origem em uma família pobre, convertida ao cristianismo, inicialmente dedicou-se a aprender o ofício de tecelão, mais tarde no decorrer de sua vida atuou como empregado do diretor de um hospital. Estudou em um colégio dos jesuítas e há relatos, por parte de comentadores, que no transcurso de sua vida tinha o hábito de praticar mortificação corporal (jejuns e abstinências; longas vigílias; uso de cilícios; autoflagelação).
Quando, em 1563 entrou para a Ordem Carmelita, adotou o nome de “São João de São Matias”. Em 1564 proferiu seus votos na Ordem Carmelita e, em seguida, foi para a cidade de Salamanca, onde passou a estudar teologia e filosofia. No ano de 1567 foi ordenado sacerdote. Em 1568, quando da fundação de um novo mosteiro (da Ordem dos Carmelitas Descalços e a pedido de Santa Teresa), muda seu nome para São João da Cruz.
Atuou como sacerdote, é considerado místico, bem como, foi frade carmelita espanhol, venerado como santo pela Igreja. É considerado, conjuntamente com Santa Teresa de Ávila, o fundador dos Carmelitas Descalços. Em 1567, quando cogitava em trocar a Ordem dos Carmelitas pela Ordem do Cartuxos (A Ordem era conhecida por sua extrema austeridade e silêncio, viviam em celas e de modo quase eremita) conhece Santa Teresa de Ávila, que o convence a participar de seu programa de reforma da Ordem dos Carmelitas, criando a Ordem dos Carmelitas Descalços (nome dado em alusão a estes não usarem calçados).
Entre os anos de 1574 e 1577, estando à época como prior do convento de El Calvario, em Baeza, Espanha, tem uma visão mística, intensa e profunda, enquanto rezava, esta experiência fez com que criasse o desenho de Cristo sendo crucificado, visto do alto. Esta nova forma de apresentar a cena, mostra a crucificação de Jesus Cristo da perspectiva celestial vista por Deus Pai, destacando a dimensão celestial e transcendente deste sacrifício, bem como a redenção da humanidade por meio deste sacrifício.
Em 1577, em decorrência das tensões existentes entre os monges Carmelitas Calçados e os Descalços no tocante às reformas impostas pelos segundos, foi preso pelos monges Carmelitas Calçados e assim mantido por nove meses em um mosteiro Carmelita em Toledo, Espanha, quando então, em 1578, conseguiu fugir. Ele ficou preso em uma cela minúscula vivendo a pão e água e pelo menos uma vez por semana (variando segundo os comentadores) era retirado da cela para ser chicoteado pelos irmãos da Ordem.
Em 1618 teve suas obras impressas e publicadas e em 1630 foi acrescentado o “Cântico Espiritual" às suas obras. São quatro os poemas por ele criados e comentados em detalhes, a saber: Cântico espiritual; A noite escura; Subida ao Monte Carmelo; Chama de amor a vida. São João da Cruz é considerado um dos principais poetas em língua espanhola. Sendo suas obras teológicas em grande parte comentários a estes poemas, aliás, suas obras foram escritas entre 1578 e 1591.
O poema “Cântico espiritual” é uma versão livre do “Cântico dos cânticos”. Na época em que foi escrito, na Espanha eram proibidas traduções de livros da Bíblia. Neste poema, é apresentado uma noiva, que representa a alma humana, procurando um noivo, este representando Jesus. A noiva preocupada por perder o noivo, ao conseguir reencontra-lo fica, conjuntamente com este, feliz com o reencontro. O poema “Noite escura da alma” descreve a jornada da alma saindo do corpo e indo ao encontro de Deus, durante a noite. A noite, por sua vez, representa todas as dificuldades encontradas neste mundo pela alma na sua busca por Deus. No poema “Subida do Monte Carmelo” temos o doloroso e difícil caminhar da alma em sua ascensão ao monte Carmelo, aqui representando sua ascensão espiritual. Nesta jornada, cada apego e desejo é deixado para trás, em um caminho onde temos presente a renúncia radical, o desapego total. No poema “Chama amor viva”, temos a alma e Deus representados pela metáfora do fogo que tudo consome, consumindo as imperfeições da alma e enchendo-a de amor.
Seguindo por alguns de seus poemas, temos presente uma reflexão sobre a união entre criatura e criador e que tal união há de depender da fé. Em seu entendimento, Deus é tudo e as criaturas diante de Deus são nada, totalmente dependentes de Deus. Temos presente o auto-esvaziamento, o total desprendimento, a conformidade da vontade humana à Divina.
Dentro da doutrina mística proposta por São João da Cruz, temos a centralização na purificação da alma humana e a busca por uma completa união com Deus que se daria por meio do desapego e do amor.
Nos seus quatro poemas (Cântico espiritual, Noite escura da alma, Subida do Monte Carmelo e Chama viva de Amor) temos uma ênfase na purificação necessária para à união com Deus, no amor, nos resultados da união com Deus enquanto meta a ser alcançada. Os poemas exaltam o esvaziamento, desapego e desprendimento durante a jornada da alma, que leva ao nada, ao vazio interior que, na sequência dos poemas, há de ser preenchido pelo todo que é o amor e a plenitude de Deus. Ele é, portanto, conhecido como aquele que trabalha em sua obra o “nada” e o “tudo”.
Na obra teológica desenvolvida em seus quatro poemas e nos comentários explicativos aos mesmos, temos que para São João da Cruz o tema do “nada” e do “tudo” aparecem como motivos centrais de seu pensamento. Por meio do “nada” e do “tudo” temos a jornada espiritual da alma em direção a Deus, que deve primeiramente desapegar e se esvaziar até o “nada”, para estando neste vazio, abrir espaço para ser preenchida pelo “tudo” que é Deus. O “nada” é uma ideia presente na obra de São João da Cruz que se apresenta intimamente vinculada à purificação da alma e ao desapego, enquanto o “tudo” surge associado à plenitude e união mística com Deus.
Esta jornada que passa pelo “nada” em “direção ao “tudo” propicia o surgimento de uma relação direta e íntima com Deus, unindo a vontade da alma com a vontade de Deus. A união com Deus passa a ser o objetivo último da vida espiritual, proporcionando profunda paz e plenitude.
O desapego presente no “nada” há de incluir todas as coisas materiais e também espirituais. Inclui os prazeres sensoriais, e também os desejos, pensamentos e consolos espirituais, para que a alma não seja distraída de seu verdadeiro objetivo durante esta jornada. Por fim, a alma chegará ao “tudo”, sendo preenchida pela plenitude do amor e da graça de Deus. A alma não somente se une a Deus, mas também é transformada por Ele. Mesmo que a alma não o perceba, a presença de Deus é constante, mesmo durante a noite mais escura em que a alma passa por provações e dificuldades em sua jornada. No final desta jornada teremos o encontro com o amor profundo de Deus em uma união plena com a alma.
São João da Cruz foi beatificado em 1675 por Clemente X. Em 1726, o papa Bento XIII o canonizou, e em 1926, ele foi declarado Doutor da Igreja pelo Papa Pio XI, sendo, portanto, um dos Doutores da Igreja Católica, na Espanha. Também considerado o padroeiro dos místicos e poetas, além de patrono da rádio, por possuir uma voz possante.
PRINCIPAIS OBRAS
2- A noite escura da alma (poema)
3- Subida do Monte Carmelo (poema)
4- Chama amor viva (poema)
1. Cântico Espiritual. Título Original: Cántico Espiritual. Escrito entre 1578 e 1579.
Neste longo poema temos na narrativa o desejo da alma humana em se unir com Deus Pai, o Criador. O texto faz uso da metáfora de um noivado, no qual a alma é a noiva e Jesus Cristo o esposo. Composta por 40 estrofes, a obra em questão reflete as experiências místicas do autor. Existe, também, um comentário detalhado que explica o sentido espiritual de cada verso contido na obra.
2. Noite Escura da Alma. Título Original: Noche Oscura del Alma. Escrito entre 1578 e 1579.
A obra narra o processo de purificação espiritual que a alma passa para poder alcançar a união com Deus. Este trabalho é dividido em duas partes: “Noite dos sentidos” e “Noite do espírito”. Segundo o texto, a alma deve passar por um período de sofrimento e desolação, chamado aqui de “noite escura”, com o objetivo de purgar seus apegos terrenos e, deste modo, poder se aproximar de Deus.
3. Subida do Monte Carmelo. Título Original: Subida del Monte Carmelo. Escrito entre 1581 e 1585.
Tratado teológico que aborda o caminho ascético necessário para que seja alcançada a perfeição espiritual. A subida do monte Carmelo é uma imagem usada como metáfora para descrever as etapas da purificação da alma e a progressiva união com Deus. A obra se apresenta como um guia detalhado para os que buscam por uma vida de oração e desapego.
4. Chama Viva de Amor. Título Original: Llama de Amor Viva. Escrito entre 1585 e 1586.
Poema místico que descreve a união em êxtase da alma com Deus. O amor de Deus inflamando a alma é representado pela metáfora do fogo Divino que consome suas imperfeições e enche-a de paz e amor. Há também um comentário explicativo visando ampliar o entendimento espiritual do poema.
Silvério da Costa Oliveira.
Prof. Dr. Silvério da Costa Oliveira.
Site: www.doutorsilverio.com
(Respeite os Direitos Autorais – Respeite a autoria do texto – Todo autor tem o direito de ter seu nome citado junto aos textos de sua autoria)
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