Professor Doutor Silvério

Blog: "Comportamento Crítico"

Professor Doutor Silvério

Silvério da Costa Oliveira é Doutor em Psicologia Social - PhD, Psicólogo, Filósofo e Escritor.

(Doutorado em Psicologia Social; Mestrado em Psicologia; Psicólogo, Bacharel em Psicologia, Bacharel em Filosofia; Licenciatura Plena em Psicologia; Licenciatura Plena em Filosofia)

Sites na Internet – Doutor Silvério

1- Site: www.doutorsilverio.com

2- Blog 1 “Ser Escritor”: http://www.doutorsilverio.blogspot.com.br

3- Blog 2 “Comportamento Crítico”: http://www.doutorsilverio42.blogspot.com.br

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5- Blog 4 “O grande segredo: A história não contada do Brasil”

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6- Perfil no Face Book “Silvério Oliveira”: https://www.facebook.com/silverio.oliveira.10?ref=tn_tnmn

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10- Página no You Tube: http://www.youtube.com/user/drsilverio

11- Currículo na plataforma Lattes: http://lattes.cnpq.br/8416787875430721

12- Email: doutorsilveriooliveira@gmail.com


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domingo, 12 de maio de 2019

Doutor Silvério fala sobre René Descartes: 1- A autoridade da razão

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René Descartes é um importante filósofo do século XVII. Na filosofia deixou grandes contribuições presentes em seus livros: Discurso do método; Meditações metafísicas; Princípios de filosofia. É considerado o criador da Escola de filosofia intitulada Racionalismo, em oposição ao Empirismo. É dele a frase "cogito ergo sum" ou "penso logo sou", por vezes traduzida como "penso, logo existo". Neste vídeo temos uma visão geral de seu pensamento filosófico e suas principais contribuições.
Link para este vídeo no YouTube: https://youtu.be/pda0mcBOuaw

sábado, 27 de abril de 2019

O filósofo René Descartes, ou, se o preferirem: “Diretora, por favor, o professor Silvério está falando sobre o Capeta em sala de aula”


Por: Silvério da Costa Oliveira.

Hoje, quando escrevo estas linhas, já faz cerca de 11 anos nos quais trabalho na área de segurança pública, antes disto trabalhei por outros cerca de 10 anos na área da educação, atuando como professor universitário e lecionando disciplinas dentro de minhas áreas de formação acadêmica. Foi durante uma destas aulas que um fato pitoresco ocorreu e que me marcou negativamente, levando ao aumento de minha decepção com o ensino universitário brasileiro e servindo como mais uma gota no copo d’água que um dia faria com que me afastasse para respirar outros ares.
Conto como se deu o fato inusitado e que de certa forma motiva-me hoje a escrever este artigo sobre o filósofo René Descartes. Certo dia chegava eu na faculdade para lecionar uma disciplina para o curso noturno de pedagogia quando ao entrar na instituição a coordenadora me chamou a sua sala para conversarmos sobre algo supostamente sério e que ela tinha um certo constrangimento de comigo abordar. Após algumas delongas, ouvi sentado em frente a mesa da coordenadora que durante minha aula anterior, duas alunas, em verdade, duas senhoras que não faziam questão de esconder seu credo religioso, cristão evangélico, vieram a esta mesma sala se queixar a coordenadora que, segundo elas e conforme a coordenadora meio sem jeito e constrangida me disse: “O professor Silvério estava falando do Capeta em sala de aula”. Claro que fiquei confuso e não me lembrei desta situação, se bem que reconhecia que alguma coisa, fosse lá o que fosse, havia motivado as duas senhoras a se queixarem de mim na coordenação da faculdade. Bem, eu sempre segui rigorosamente os programas das disciplinas, mesmo quando não concordava com os mesmos e também devo confessar que o termo “capeta” não faz parte do meu discurso, não sendo palavra que eu use. Mistério. Pensei, pensei, de onde, ora infernos, saiu este capeta?
Depois de examinar o programa e a ementa da disciplina, bem como o diário de classe para lembrar qual fora o tema desta aula em particular, consegui desvendar o mistério que até este momento se mostrava insondável. Era uma aula sobre o filósofo francês René Descartes (1596-1650) e neste momento lembrei-me de que quando explicava sobre o conceito filosófico cartesiano do “gênio maligno”, duas senhoras que estavam sentadas a frente se levantaram resmungando e saíram de sala. Pensei que elas tinham ido ao banheiro ou algo semelhante, mas elas foram aliviar suas necessidades em outro lugar. Portanto, em homenagem a estes alunos, não importando de qual curso sejam, eis aí meu artigo sobre este importante filósofo.


René Descartes nasceu em 31 de março de 1596 na França e faleceu aos 53 anos de idade em 11 de fevereiro de 1650 em Estocolmo, Suécia, em virtude de ter contraído uma pneumonia. Acredita-se que sua doença em parte decorreu da mudança drástica de hábitos. Acostumado a um clima mais ameno, mudou-se para o clima frio da Suécia atendendo o pedido da rainha Cristina, após muita insistência e diversos pedidos anteriores polidamente recusados ou adiados. A rainha desejava aprender filosofia tendo a Descartes como professor, mas propôs a este um horário bem incômodo para um homem acostumado a acordar todos os dias por volta de meio-dia, ela queria suas aulas às cinco da manhã. Este horário ao qual Descartes não estava acostumado, bem como o frio intenso, são tidos como fatores que atuaram no desenvolvimento da pneumonia que o matou 10 dias após tê-la contraído.
Nascido em família da baixa nobreza francesa, aos oito anos de idade, em 1604, foi encaminhado ao colégio jesuíta La Flexa, em Anjou, onde fica por quase dez anos, saindo no ano de 1614. Para atender a desejo de seu pai, cursou por dois anos Direito na universidade de Poitier. Formou-se em 1616, mas não seguiu a profissão.
Dentre os dados biográficos deste autor, um em particular, um tanto estranho ou bizarro, merece algum destaque em virtude das diversas interpretações possíveis. Na noite de 10 para 11 de novembro de 1619, então com 23 anos de idade, Descartes tem os seus três famosos sonhos, cuja importância ele atribui nada menos que sua missão na vida, ou seja, desenvolver os fundamentos de uma ciência que unificaria o conhecimento humano.
Dentre os livros que escreveu, destaque deve ser dado a três que expressam suas idéias filosóficas que nos acompanham até a presente data, mesmo que outros escritos tenham ficado obsoletos com o passar dos anos, é inegável a atual importância do conjunto das idéias contidas nestes livros para a nossa sociedade contemporânea. Refiro-me a 1- Discurso do método (1637), destinado a todos, ao vulgo e não aos doutos, e por isto mesmo escrito e publicado em francês e não na língua culta da época que era o latim; 2- Meditações metafísicas (1641 em latim, e 1642 em francês), destinado aos teólogos e sua mais importante obra; 3- Princípios de filosofia (1644), livro 1, destinada aos físicos. Nestes três trabalhos Descartes expõe o seu método.
Descartes ocupa, historicamente, um lugar central entre os filósofos do século XVII, marcando profundamente a partir do seu século tudo que depois sucedeu. Além de filósofo e físico, ele é um grande matemático, sendo o criador da geometria analítica. Ele é o primeiro pensador a romper com a escolástica a partir do livre exame pela razão humana. Uma novidade em Descartes para sua época é priorizar a autoridade da razão sobre qualquer outra. O trabalho filosófico de Descartes deve ser entendido como a busca de um método correto para encontrar a verdade e evitar os erros, algo que nos permita saber distinguir o verdadeiro do falso. Ele hoje em dia é considerado o pai do Racionalismo moderno. Descartes também é considerado o primeiro filósofo moderno, pela importância que dá ao “eu”, ao sujeito do conhecimento.
A autoridade da razão pode ser algo comum aos dias atuais, mas na época de Descartes não era, estando em oposição a autoridade religiosa eclesiástica e sendo que seus contemporâneos acreditavam que a segunda era a que deveria ser levada em conta nos mais distintos assuntos.
Segundo Descartes, a ciência pode ser comparada a uma árvore e nesta metáfora, a raiz é a metafísica, o tronco a física e os galhos são os ramos da ciência, sendo os três principais, a mecânica, a medicina e a moral, que por sua vez se relacionam com as três aplicações do conhecimento humano, a saber: o mundo externo, o corpo humano e a conduta em sociedade.
Na filosofia Descartes irá contribuir com uma abordagem nova e radical no tocante a mudança de foco da autoridade expressa por livros e doutrinas religiosas para a autoridade da razão humana individual. Cada um pode e deve recorrer a sua própria razão em busca da verdade e não a opiniões de autoridades religiosas ou outras. Visando buscar uma verdade inabalável, Descartes irá por tudo em dúvida. Sua dúvida é radical, metódica e hiperbólica, mas Descartes não busca o ceticismo, não é esta a sua finalidade. A dúvida faz parte do caminho a ser percorrido, mas não é o seu destino final. Em verdade, estamos diante da busca por um método. A busca da verdade em Descartes é a busca por um método que permita atingir com segurança o seu objetivo maior.
Mas durante os anos de busca da verdade ele precisaria viver em sociedade e para tal teria de tomar decisões, como, no entanto, fazê-lo se estava imerso no ceticismo? Havia necessidade de ter um modo qualquer que o permitisse tomar decisões vinculadas a convivência diária e para tal Descartes adota algumas medidas práticas que irão gerar uma moral provisória, enquanto durar a dúvida.


Eis o método:
1- Proporcionar a si uma moral provisória que consiste em poucas máximas
A- Obedecer as leis e costumes do país e manter a religião na qual fora educado desde a infância.
No restante, seguir as opiniões mais moderadas e distantes dos excessos, expressadas e praticadas pelos mais sensatos com quem teve a oportunidade de conviver em sociedade. Para saber quais eram de fato as suas opiniões, Descartes entendeu que deveria atentar para a sua prática e ações e não necessariamente para o que estas pessoas dizem, pois, podem não querer dizer tudo o que sabem ou simplesmente não saberem por que o fazem.
Escolher como modelos e exemplos homens sensatos de preferência e via de regra mais próximos de sua pessoa do que outros que vivam em regiões e sociedades em lugares distantes do mundo.
Dentre várias opiniões diversas sobre um mesmo tema, acolher as mais moderadas.
B- Ser firme e resoluto nas ações tomadas. Uma vez decidido por um caminho a seguir, persistir no mesmo, tendo firmeza nas decisões e na realização das mesmas.
C- Focar em si próprio, procurando mudar a si e não ao mundo ao redor, controlar e mudar os desejos e não a organização do mundo circundante. A única coisa realmente em nosso poder são nossos próprios pensamentos.
D- Buscar a melhor ocupação entre os homens, dentre todas as oferecidas.
2- Se livrar de toda e qualquer opinião sobre a verdade, colocando tudo em dúvida. Destruir a casa ou morada do conhecimento em que até então residia.
Deste modo, Descartes se propõe a viver em um provisório ceticismo, até que encontre uma base na qual possa erguer uma verdade inabalável diante de sua razão. Para poder viver em sociedade adota as regras acima como uma moral provisória enquanto mantém a dúvida e se dedica as suas buscas e pesquisas quanto a verdade.
Para entender Descartes é preciso levar seus argumentos a sério e não como se fosse um jogo qualquer, não basta fingir ou fazer de conta, é preciso acompanhar seus argumentos e o caminho da dúvida hiperbólica com o máximo de seriedade. A dúvida deve ser vivida como um mergulho em águas profundas até não mais termos fôlego para prosseguir e a necessidade imperiosa de enchermos nossos pulmões de ar nos faça não poder evitar de abrir a boca, mesmo diante do medo e mesmo pavor de morrermos afogados em águas profundas e inexploradas, quando finalmente subimos a tona e tomamos o primeiro gole de ar, é com espanto extraordinário que percebemos que ainda estamos vivos. Nesta metáfora, o mergulho é a dúvida, que permanece até o limite sustentável de nossos pulmões, quando finalmente conseguimos emergir e tomar a primeira lufada de ar fresco é quando encontramos a primeira verdade inabalável: “Penso, logo sou”. “Cogito, ergo sum”.
Em seus livros, Descartes põe em dúvida, como sendo algo falso, há tudo a partir de três pontos, os quais são as etapas da dúvida hiperbólica, a saber:
1- Sentidos: Pois já me enganaram uma vez e não é prudente confiar em quem já me enganou.
2- Sonho: Talvez não possamos distinguir o sonho da realidade e deste modo não sabermos se estamos de fato dormindo ou acordados.
3- A possibilidade da existência de um deus enganador ou de um gênio maligno que me engane constantemente. Este último artifício permite por em dúvida e negar os paradigmas matemáticos.
Em Descartes a dúvida hiperbólica por ele proposta deve ser entendida como sendo sistemática e generalizada. Avança por três níveis, o primeiro é o reconhecimento dos erros provindos dos sentidos, o segundo se encontra junto ao argumento do sonho e finalmente o terceiro se dá a partir do deus enganador ou do gênio maligno. Argumento que estende a dúvida as matemáticas, afetando seu valor objetivo. A dúvida hiperbólica propõe entender como algo falso tudo que for apenas duvidoso e entender tudo o que alguma única vez me enganou como sendo algo sempre enganador.
O argumento do deus enganador ou gênio maligno é importante porque quer meus sentidos me enganem ou eu esteja acordado ou dormindo, certas coisas continuam sendo verdadeiras, coisas simples, objetos das matemáticas, tais como: figura, quantidade, espaço e tempo. 2+3 sempre terá como resultado 5 e a figura do quadrado sempre terá quatro lados iguais, nem mais, nem menos.
Além da moral provisória, Descartes nos propõe quatro regras para o método: evidência, análise, síntese e enumeração. Em verdade, seu método é menos compatível com o método científico hoje usado e bem mais semelhante a um método matemático, vide, por exemplo, o item 4, onde temos a enumeração das etapas anteriores, numa revisão do que fora feito, adequado a um método matemático, mas que no método científico deva ser substituído por experimentação, re-fazer os experimentos buscando a confirmação ou não dos resultados.
A evidência basicamente nos propõe que algo deva ser evidente por si mesmo. A análise nos fala que devemos analisar o problema dividindo um problema complexo em suas partes simples. Já a síntese nos coloca diante da necessidade, após a análise, de reunir as partes simples novamente no problema complexo. O problema passa a ser entendido como a soma de partes simples. E por fim a enumeração de todas as partes anteriores, numa verificação do que já fora feito nas etapas que antecederam.
Este método proposto por Descartes se apresenta como o método da matemática moderna, em oposição ao método de Galileu Galilei, o método científico moderno, pois, no item 4 se faz a enumeração matemática das partes analisadas como forma de verificação, já para Galileu a verificação se dá por experimentos em laboratório.
Apesar de ser comum traduzir a famosa frase de Descartes por “penso, logo existo”, isto está errado. O verbo “ser” é diferente do verbo “existir”. O correto é “penso, logo sou”. Outro erro comum é entender a frase como resultado de um raciocínio lógico, como se disséssemos que “se eu penso, logo existo” em relação a um lento raciocínio e não a uma intuição imediata como seria correto, pois, não é um raciocínio baseado em premissas e sim uma intuição imediata. O correto, portanto, é: “Penso, logo sou”. “Cogito, ergo sum”. Descartes coloca o evidente no centro do conhecimento com o cogito.
No ano de 1637 Descartes elabora uma obra cujo prefácio o tornaria famoso até os nossos dias e ganharia status de livro próprio, refiro-me a “Discurso do método”, inicialmente, como já disse, um prefácio a outras três obras de sua autoria, a saber, um tratado de ótica intitulado “A dióptrica”, e também “Os meteoros” e “A geometria”, onde temos a criação da geometria analítica com o plano cartesiano que todos já estudaram alguma vez na escola conjuntamente com as coordenadas x e y. Descartes é um matemático e cabe lembrar sua contribuição que nos acompanha até os dias presentes e que é o plano cartesiano.
Em Descartes nós temos duas substâncias distintas: a extensão e o pensamento. De um lado o espírito, pensamento, liberdade e atividade, do outro a matéria, extensão, determinismo e passividade. Ambas são diferentes e não há ação possível do espírito sobre a matéria ou vice versa, são duas substâncias heterogêneas. É a partir disto que temos o famoso dualismo cartesiano.
Todo o trabalho filosófico de Descartes se dá tomando como base idéias claras e distintas. É a partir destas idéias e seguindo seu método que ele chega ao “cogito, ergo sum”. Eu duvido, penso, logo sou (que a tradição traduziu erradamente por “existo”).
A dúvida leva a idéia do eu que penso e ao pensar, tenho a idéia do infinito, do completo, do perfeito, mas como não sou eu mesmo, há a necessidade de outro ser ter tais atributos. E eis que da dúvida total e abrangente surge primeiro a idéia clara e distinta do “eu penso, logo sou” e depois de Deus. Neste momento cabe destacar que a substância em Descartes terá como divisão a extensão e o pensamento, tendo como terceiro elemento um deus transcendente.
Deus existe e pela essência que o concebo ele não pode ser enganador, pois, a razão nos ensina que o ato de enganar provém de alguma carência e se Deus é perfeito, ele não possui carência alguma.
Podemos entender a essência perfeita de Deus como sendo: soberano, eterno, infinito, imutável, onisciente, onipotente, criador de tudo.


Portanto, a primeira verdade que extraímos da dúvida é que eu sou, a segunda é a da existência e essência de Deus, a terceira são as verdades matemáticas / geométricas e por fim, a quarta verdade é a existência da extensão.
Alguns entendem a filosofia de Descartes como solipsismo, mas isto é um erro. O solipsismo é uma doutrina na qual só existe de fato o próprio eu e as suas sensações, levando, portanto, ao ceticismo e a um completo idealismo. Ora, somente em um primeiro momento, que vai da dúvida hiperbólica até o descobrimento da primeira verdade, “penso, logo sou”, é que podemos falar em um Descartes solipsista, pois, logo a seguir ele chega a conclusão que há um deus perfeito, que as matemáticas proporcionam resultados verdadeiros e que a extensão também existe.
Em Descartes também cabe dividir as idéias em três grupos distintos, a saber: inatas, adventícias e factícias. Idéias inatas são aquelas com as quais nascemos, não dependem da aprendizagem e fazem parte de nossa mente, tais como a idéia de deus e as idéias matemáticas. Idéias adventícias são aquelas que obtemos por meio de nossos sentidos, a partir do que percebemos no mundo circundante. Idéias factícias são aquelas que provém de nossa imaginação, a partir de uma combinação de imagens provindas de nossos sentidos, ou seja, são construídas com base nas informações que já possuímos. Cabe acrescentar o princípio da correspondência em René Descartes, segundo o qual, cada idéia que possuímos corresponde a algo que de fato existe. Assim, a idéia de cavalo corresponde a um cavalo que um dia vimos e a idéia de um pássaro corresponde a este outro animal, deste modo explicamos todas as idéias adventícias, que nos vêem por meio de nossos sentidos. Quanto as idéias factícias, estas não passam da junção de elementos obtidos em diferentes coisas adquiridas por meio de observação e juntadas arbitrariamente em uma única representação. A idéia de um cavalo alado como Pégasus, se baseia na idéia de cavalo e na idéia de asas. Já a idéia de uma fada irá se basear na idéia de uma mulher tornada muito pequena com asas que podemos observar em uma borboleta. Quando levamos o princípio da correspondência para as idéias inatas, percebemos a necessidade da existência e veracidade das mesmas, tal o caso das idéias matemáticas ou de deus, pois tem de haver uma correspondência destas idéias com algo fora de nós, real, existente.
Cabe distinguir o pensamento filosófico de Descartes da tradição que o antecede. A tradição escolástica cujas fontes vão a São Tomás de Aquino e também a Aristóteles, nos traz um conhecimento sistemático, diferente da dúvida e intuição de Descartes. Vejamos um exemplo de um silogismo, então presente a esta tradição. Posso afirmar que:
Premissa maior: Todos os homens são mortais
Premissa menor: Sócrates é homem
Conclusão: Sócrates é mortal.
Ocorre que em Descartes o cogito é uma intuição e não é obtido por meio de um silogismo, trata-se, portanto, de nossa primeira e inabalável certeza. Penso, logo sou. Mesmo que não saiba o que sou, se tenho um corpo, se sou isto ou aquilo outro. Sei somente que sou um ser que duvida e para tal ato pensa e enquanto duvida e pensa é.
Com Descartes nós temos o Racionalismo, Escola filosófica que irá ter grandes representantes na filosofia e que posteriormente irá se contrapor a outra grande Escola que será criada, o Empirismo. No Racionalismo temos como base que os sentidos nos enganam, que o conhecimento é obtido por meio da razão, a importância da metafísica e de idéias evidentes, ou seja, claras e distintas.
Recapitulando, temos que na época de Descartes imperava nos meios acadêmicos a tradição Escolástica que priorizava os silogismos e a autoridade eclesiástica / religiosa para obtenção da verdade. Esta tradição se sustentava filosoficamente em Aristóteles e São Tomás de Aquino. Descartes propõe algo completamente novo, um novo método de busca da verdade usando o ceticismo e a dúvida não como um fim em si mesmo, a finalidade a qual deveria chegar a sua filosofia, mas sim como um instrumento que lhe permita prosseguir em sua busca até uma verdade inabalável. Por mais que eu duvide e que tudo seja falso, resta que eu enquanto duvido, existo. Para duvidar é preciso que haja um pensamento de dúvida e isto sou eu, mesmo que não saiba qual a minha aparência final, se meu corpo existe ou não, se existe ou não qualquer tipo de matéria além de meu próprio pensamento. Mesmo existindo um deus enganador ou um gênio maligno que em tudo me engane, fazendo com que eu erre mesmo os cálculos mais simples em matemática e me leve ao erro em todas as disciplinas, o fato de mesmo errando eu continuar pensando e duvidando é inabalável. Pois mesmo em erro, algo há, algo que eu sou, que pensa e duvida. Mas se sou a única coisa que existe no universo, tudo que possa conceber deverá também existir em mim mesmo, ocorre, no entanto, que tenho idéias tais, como perfeição e completude, que reconheço não estarem totalmente em mim, não sendo eu, portanto, o detentor de sua causa. Há, neste caso, necessidade de um outro ser que possua tais atributos e este ser é Deus. Dentro da essência que concebo para Deus, está o atributo deste ser perfeito e como tal, devo admitir que a necessidade de enganar não está nele presente, pois, tal necessidade implica em alguma falta, na carência de algo. Do mesmo modo, um dos atributos de Deus é que o mesmo é boníssimo e como poderia uma criatura sumamente boa permitir a existência de um gênio maligno que me enganasse a todo e qualquer momento? Tal necessidade de enganar ou o fato de permitir a existência de uma criatura que me faça enganar constantemente, não podem estar presentes na essência deste Deus, portanto, não havendo um deus enganador ou um gênio maligno, todas as verdades matemáticas e algébricas passam a serem aceitas como tal e também a extensão passa a ser aceita como algo real e não mero fruto do engano. Para Descartes, portanto, temos três coisas dentro do que poderíamos falar de substância, a saber: pensamento (res cogitans), extensão (res extensa) e um Deus transcendente.
Estas linhas acima mostram como costumo abordar este tema e foi mais ou menos por aí que seguiu minha aula no dia da reclamação das duas alunas citadas no começo deste artigo, claro está, no entanto, que em sala de aula o professor é como se fosse um ator em um palco e os alunos por vezes ocupam o lugar da platéia, participativa ou não. Há uma interação maior do que com o leitor e é possível alongar uma explicação ou mesmo fornecer outra explicação para um mesmo tópico se alguém demonstrar que não entendeu algo. As duas alunas em questão ficaram somente para o começo da explicação do pensamento deste filósofo. Depois da apresentação da dúvida hiperbólica e da necessidade de uma moral provisória, seguimos pelo primeiro momento da dúvida, colocando em dúvida todo o conhecimento obtido por intermédio de nossos sentidos, pois, se uma vez nos enganaram podem fazê-lo novamente, passamos para o segundo momento da dúvida, onde colocamos a possibilidade de estarmos dormindo e não sabermos distinguir o sonho da realidade e por fim chegamos ao terceiro e último momento de nossa dúvida, ao admitir a hipótese de um deus enganador ou gênio maligno. Um demônio que estivesse a sussurrar em nossos ouvidos a resposta errada mesmo para as questões mais evidentes, como os resultados advindos das matemáticas. Neste momento elas se levantaram e saíram de sala se recusando a ouvir e aprender algo novo. Talvez se ficassem, viessem a aprender uma das mais importantes provas da existência de Deus, obtida não por meio de raciocínios complicados, mas pela mais pura intuição, diante da evidência proporcionada por idéias claras e distintas. Pessoas que assim são admitidas e cursam uma faculdade podem até conseguir um diploma, mas para que isto lhes servirá? A quem nossas instituições de ensino, com a permissão calada da sociedade brasileira, estão querendo enganar?

Silvério da Costa Oliveira.


 

 
 
Prof. Dr. Silvério da Costa Oliveira.
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sábado, 6 de abril de 2019

Doutor Silvério fala sobre: Giordano Bruno 1- Vida e idéias filosóficas



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Giordano Bruno é um filósofo humanista e renascentista italiano cuja compreensão é importante para quem deseja entender o que é filosofia e como se deu por vezes a relação entre filosofia e religião. Entendo que a importância da filosofia se iguala a importância dada aos filósofos, daí a necessidade para quem gosta de filosofia de saber responder quem foi Giordano Bruno, qual seu pensamento e principais idéias e como estas marcaram seu tempo histórico e nos influenciam ainda hoje.
Link para este vídeo no YouTube: https://youtu.be/8aI3D0pfenI

quinta-feira, 28 de março de 2019

Giordano Bruno, o filósofo que foi queimado vivo em nome da verdade


Por: Silvério da Costa Oliveira

Queimado vivo em uma fogueira em praça pública, no centro da cidade de Roma, Campo dei Fiori, “Campo ou praça das Flores” em uma tradução livre do italiano para o português. Belas flores de amor e contemplação religiosa que exigiram o quente borbulhar do sangue e carne de um inocente aos olhos de hoje, mas com certeza culpado a sua época.


Giordano Bruno nasceu em Nola, cerca de 45 km de Nápoles (Reino de Nápoles), Itália, em 1548, filho único de Giovanni Bruno e de Fraulissa Savolino, batizado como Filippo Bruno, trocaria mais tarde seu primeiro nome para Giordano. Aos 13 anos de idade, em virtude de seus pais entenderem que este teria vocação para o ofício religioso, ingressa em um convento em Nápoles e aos 17 anos, 1565, muda o nome por ocasião da celebração pelo recebimento do hábito dominicano. É ordenado sacerdote em 1572 e termina os estudos em teologia em 1575. Em 1576 é acusado de heresia e por tal motivo deixa Nápoles. A partir deste momento e por toda a sua vida, viaja por quase toda a Europa, parando não mais que poucos anos em alguma cidade. Vai a Roma (1576), e depois a Genebra (1579). Entra e sai do Calvinismo, também acusado por heresia, em Genebra. Viaja a França (Toulouse e Paris). A partir do ano de 1582 começa a lecionar em Paris, viaja a Suiça e de 1583 a 1585 lecionou na Inglaterra (Oxford e Londres), novamente Paris (1585) e em seguida vai a Alemanha, onde leciona por dois anos até ser excomungado pelos luteranos. Esteve em Marburgo, Wittenberg, Praga e Helmstedt.
Em 1591 vai a Frankfurt onde vive até o convite do nobre italiano Giovanni Mocenigo para ir a Veneza, Itália. Em virtude de se negar a ensinar magia e técnicas de memorização (mnemotécnica) para Mocenigo, este o denuncia a santa inquisição católica, sendo então preso e posteriormente transferido a Roma. Finalmente em Roma, após um ano de prisão em Veneza e sete em Roma, totalizando cerca de oito anos (preso em Veneza em maio de 1592, em 27 de janeiro de 1593 é encaminhado ao Santo Ofício de Roma) em cárcere, tortura, interrogatório e julgamentos, é condenado a morte aos 52 anos de idade. Em 17 de fevereiro do ano de 1600, quando a sentença é cumprida em praça pública, teve sua boca tampada para que não pudesse proferir qualquer palavra, nesta data é queimado vivo em uma grande fogueira. Em 1889, no lugar onde Bruno fora queimado, foi erguida uma estátua em sua homenagem. Destaque também a um filme franco-italiano sobre sua vida, datado de 1973.


Giordano Bruno (1548-1600) vive durante o Renascimento na Itália, adepto do neo-platonismo italiano e humanista, atuou como escritor e filósofo, deixando sua marca no século XVI e sendo lembrado pela sua importância até os dias atuais. Segundo Bruno, deus é uno, é tudo, é imóvel, não se transforma (pois perderia sua essência), é eterno e imutável. Tais idéias o aproximam de outros filósofos célebres, tais como: Pitágoras, Plotino e Parmênides.
Bruno foi conhecido por seus contemporâneos por ter uma memória formidável que alguns, inclusive, pensavam tratar-se de algum tipo de magia ou feitiçaria, mas na verdade ele se usava de técnica própria com o uso de auxiliares de memória previamente escolhidos, memorizados e estudados para lhe permitir maior facilidade na retenção de novos conteúdos em sua memória, associando-os a informação pessoal ou espacial e criando vínculos emocionais e cognitivos que tornam mais fácil a retenção e recuperação dos conteúdos assim organizados em sua memória. A mnemônica proporciona um modo de dar sentido, importância, organização e arquivamento de novos conteúdos a memória, facilitando, também, sua recuperação quando necessário.
Bruno gostava de ser chamado e assim se auto-intitulava, o nolano, em referência a sua cidade natal, Nola. Em seus escritos e aulas, Bruno adotou para si o sistema teórico-matemático de Copérnico e foi além do mesmo. Segundo Copérnico, a Terra não seria o centro do universo como o queriam o sistema de Ptolomeu / Aristóteles, e sim o Sol. Ao invés de o Sol girar ao redor da Terra, era a Terra e demais planetas que giravam ao redor do Sol. Para Copérnico o universo era finito e se restringia ao Sol, a Terra e demais planetas por nós observados nos céus.
Bruno rejeita a tradicional teoria geocêntrica e apóia a teoria heliocêntrica de Copérnico, indo, no entanto, muito além do heliocentrismo, pois, Copérnico admitia um universo finito e o sol como centro do universo, ao redor do qual giravam a Terra e demais planetas, já Bruno irá propor que o Sol é o centro de nosso sistema planetário, mas não do universo, o qual é muito mais amplo e infinito e com infinitos mundos.
Cada estrela nos céus, segundo Bruno, seria um sol, ao redor do qual poderíamos ter outros planetas girando ao seu redor e em alguns destes planetas teríamos vida inteligente tal como a temos aqui na Terra. Haveria, portanto, inúmeros sois rodeados por outros planetas.
O universo é infinito e ilimitado, pois, seria contraditório que o efeito (universo) de uma causa (deus) infinita, fosse finito. O universo é infinito e como tal não possui centro ou circunferência. No universo qualquer ponto é centro e periferia. Em um universo infinito não existe o centro, pois, este está em todos os lugares.
Segundo Bruno, todos os seres são feitos da mesma substância e estão igualmente no centro do universo, independente de qualquer de nossas hierarquias.
Bruno nega a trindade divina, pois o infinito (deus), não pode estar contido no finito (homem / Jesus Cristo). Se a Bíblia possui um valor positivo, este se dá somente pelos seus ensinamentos morais. Giordano Bruno negava a trindade, pois deus é uno e negava a Jesus Cristo como deus ou filho de deus, segundo Bruno, Jesus era, sim, um mago.
Bruno afirma que a religião é usada pelos governos como forma de controlar e governar as massas sociais ignorantes. Trata-se de um conjunto de superstições contrárias a razão e a natureza e será válida somente enquanto a humanidade não atingir um nível superior de evolução.
Temos também presente em Bruno o panteísmo, pois, deus é o universo e o universo é deus. Deus está presente em tudo. Deus é transcendente e imanente ao mesmo tempo. Deus é como o princípio de tudo. Como causa é externo (transcendente) e como princípio é interno (imanente).
A filosofia de Bruno pode ser entendida como um antídoto para todo e qualquer fanatismo religioso e político e a intolerância daí resultante. O filósofo não é aquele que possui uma verdade única, e sim aquele que dedica sua vida a busca da verdade. Bruno combateu a intolerância por meio de seus escritos e aulas. Bruno apresenta uma moral do ativismo.
Defende-se em Roma alegando a teoria das duas verdades, filosofia e teologia, argumentando que ele, Bruno, não falava sobre teologia e sim sobre filosofia.
Quando recebeu a sentença final, que o condenou a morte na fogueira e também a queima de todos os seus livros e escritos, pronunciou para seus juízes uma frase que entraria para a história: “Talvez os senhores tenham mais medo de proferir a sentença do que eu de ouvi-la”.
Giordano Bruno pode ser, sim, considerado um herético ecumênico, pois, as três maiores Igrejas cristãs de sua época, a católica, a luterana e a calvinista o viram como herético. Um dos raros momentos de sua vida no qual provocou tamanha unanimidade por parte dos que com ele compartilhavam sua época histórica.
Bruno entendia que nossas idéias são a sombra de algo imutável e que a natureza está em contínuo movimento e transformação. Cabe destacar também que quando Bruno afirma que toda e qualquer criatura dentro de um universo infinito é o seu centro e periferia, ele rompe com dogmatismos, apresentando um discurso filosófico que propicia poder e destaque para qualquer pessoa, independente de religião, raça, cor da pele, sexo, idade ou convenções sociais. O rei, o papa ou um mendigo podem a sua vez serem o centro do universo, de seu próprio universo.
Um filósofo com idéias geniais e revolucionárias para sua época, com uma coragem digna de poucos homens, morreu em defesa da verdade que professava a mando daqueles que acreditavam possuir a verdade e que acreditavam, também, que qualquer um que ousasse afirmar algo diferente ou contrário a verdade então estabelecida era um herético que tinha de morrer.


Silvério da Costa Oliveira.



 


 

Prof. Dr. Silvério da Costa Oliveira.
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sábado, 23 de março de 2019

Doutor Silvério fala sobre: Deep web 1- O que é deep web?


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Depois do massacre na escola do ensino fundamental (2º etapa - sexto ao nono ano), na cidade de Suzano - São Paulo, em 13 de março de 2019, uma quarta-feira , às 9:30h., a televisão e demais veículos de mídia começaram a falar muito e por vezes de modo errado sobre o que venha a ser a deep web. Neste vídeo me proponho a explicar de modo simples e completo o que é a deep web e como acessá-la, seu conteúdo e o que a mesma possui de bom e ruim, bem como o que torna seu conteúdo e seus usuários invisíveis e não facilmente rastreáveis pelos órgãos de segurança.
Link para este vídeo no YouTube: https://youtu.be/S7JoFwobzOA

segunda-feira, 11 de março de 2019

O OVNI que todos viram e esqueceram


 Por: Silvério da Costa Oliveira

De início, vamos deixar claro o significado dos termos que usamos em nosso título. OVNI (Objeto Voador Não Identificado) ou UFO (Unidentified Flying Object) é terminologia militar e não é idêntico a uma nave espacial ou disco voador (flying saucer - pires voador) repleto de seres espaciais verdes com anteninhas na cabeça ou algo que o valha. Em verdade, a expressão é entendida como adequada a fazer referência a qualquer tipo de avistamento, seja a olho nu ou por meio de instrumentos, de algo que esteja voando e não possa ser naquele momento identificado corretamente. Em virtude de diversos contatos submarinos apresentados nos sonares de embarcações, temos o equivalente OSNI (Objeto Submarino não identificado) ou ainda outros termos (UAP, PAN, OANI) usados pelos militares para designar o mesmo fenômeno sem, no entanto, a conotação popular que o termo recebeu associando-o a espaçonaves extraterrestres.
O termo UFO, do qual se originou o termo OVNI, foi criado e usado pela primeira vez pelo então capitão da USAF Edward J. Ruppelt quando à frente do Projeto Livro Azul (The blue book), no livro de sua autoria The report on unidentified flying objects, publicado em 1956 nos EUA visando substituir a expressão popular “discos voadores”, ou, segundo o Oxford English Dictionary, a primeira referência a este termo, no entanto, deveria ser reportada ao major Donald Edward Keyhoe, aviador do corpo de fuzileiros navais, no ano de 1953.
De qualquer modo, o termo seria adequado a um satélite orbitando a terra, a um avião, um helicóptero, drone por controle remoto ou, claro está, a uma espaçonave extraterrestre repleta de seres verdes ou equivalente. Portanto, ao usar este termo, não fazemos referência direta ao popular termo “disco voador”, se bem que este possa também estar incluído, uma vez que a fonte real que observamos é de natureza por nós desconhecida naquele momento.



Interessante que hoje com Internet e smartphones que gravam tudo, fazendo vídeos e fotos de boa qualidade, são poucos os relatos se comparados aos de algumas décadas atrás onde dificilmente um não profissional teria uma câmera pronta para uso ao seu dispor a qualquer hora inusitada onde fosse necessário. Na década de 1980 eu fazia acampamentos selvagens (em lugares isolados, perto da natureza e longe de tudo e de todos) com amigos e não era incomum ver alguma coisa estranha nos céus ricamente estrelados. Mesmo em grandes centros urbanos por vezes alguém poderia ver algo estranho, ou mesmo muito estranho, nos céus e normalmente ficaria calado aguardando se algo era divulgado pelos jornais e tv no dia seguinte, pois, falar de avistamentos era algo considerado bizarro, estranho e anormal por grande parte da população e ninguém gosta de ser visto como diferente. Muitas vezes avistamentos eram compartilhados entre amigos, e só.
Engraçado que algumas destas narrativas, se fosse hoje, seriam tidas como a presença de um drone qualquer. De fato, alguns, especialmente quando iluminados e a noite, bem lembrariam um “disco voador”, no entanto, naquela época distante, tais brinquedos tecnológicos ainda não existiam, ou, não nos contaram toda a verdade sobre o surgimento de tais aparelhos.
O que me faz escrever agora, no entanto, é um fato ocorrido em um grande centro urbano e durante o dia, presenciado por praticamente toda a população local, mesmo que muitos hoje não se lembrem, afinal, a memória nos prega peças e quando algo não se encaixa nas nossas crenças prévias pode ser sumariamente apagado.
Eu narrei esta história a amigos e conhecidos por muitos anos, mas apesar de ter uma idéia vaga sobre quando ocorrera, certeza mesmo somente sobre o ano. Sempre ficara de pesquisar nos jornais antigos sobre o tema, para datá-lo com exatidão, até que há algum tempo, finalmente, empreendi tal iniciativa. Para minha surpresa, a data em questão hoje seria motivo de diversas piadas e brincadeiras sobre o ocorrido, em virtude da associação do fato com célebre comemoração norte americana que na época ainda não nos era comum aqui em terras tupiniquins. Refino-me ao halloween, que mais tarde passou a ser comemorado por aqui, mas que quando do ocorrido, não era um evento digno de nota em nossa cultura e o dia passava despercebido como um outro dia qualquer do ano, nada festivo ou comemorativo, fosse do que fosse.
Bem, refiro-me, claro está, ao 31 de outubro, mas do ano de 1983 e o fato que vou narrar aconteceu do amanhecer ao anoitecer deste dia na cidade do Rio de Janeiro, sendo presenciado por todos e tendo repercussão imediata nas rádios AM e posterior repercussão nos diversos jornais no dia seguinte, primeiro de novembro.
Eu passara a parte da manhã e tarde em um colégio na Tijuca, bairro da zona norte do Rio de Janeiro. No final da tarde, mas ainda com bastante luz do dia, saí dirigindo meu carro, um VW Fusca que eu havia batizado carinhosamente de “Fustigre”, colocando, incluso, uma placa (vermelha com letras amarelas) com este nome na frente do carro. Na ocasião dei carona para um amigo até a Praça Sáenz Peña, também na Tijuca, mas diversas quadras de onde estávamos. Pelo caminho meu amigo e eu notamos que as pessoas nas calçadas estavam todas olhando para os céus, como se todas estivessem com torcicolo. Lembro que meu amigo chegou a colocar parte do corpo para fora do carro pela janela do carona, tentando enxergar alguma coisa que justificasse o que víamos, mas nada identificou de anormal e que justificasse o comportamento, digamos, bizarro das demais pessoas.
Foi somente após deixar meu amigo em seu destino e retornar para o Centro da cidade, onde meu pai tinha um restaurante, que finalmente soube o que estava ocorrendo. Estacionei o carro e entrei no restaurante de meu pai, onde comentei com um cliente, um senhor já bem idoso que hoje provavelmente já deve ter falecido, sobre o que tinha presenciado mais cedo e dele recebi a resposta meio que surpresa por eu nada saber, que desde de manhã bem cedo até aquele momento havia algo nos céus, sobre o Rio de Janeiro e segundo o seu relato, que bem me lembro ainda hoje, dois aviões da FAB tinham tentado ir até lá, mas estava muito alto e eles desistiram, retornando a sua base.
Pedi então que este homem me mostrasse o tal objeto, que segundo ele lembrava um disco voador prateado e brilhante conforme refletia os raios do sol. Ele então me levou até o meio da rua, uma rua larga em frente ao restaurante no qual estávamos, e como não passava carro algum naquele momento, ali paramos até que ele conseguisse apontar para mim naquele céu claro e sem nuvens o tal objeto e de fato, naquele céu azul de brigadeiro se destacava um enorme disco prateado. A que altura estava? Como saber. Mas era um círculo grande e quanto mais alto estivesse, maior seria o tal objeto. Lembro que fiquei ali no meio da rua por algum tempo até dali sair. O tal objeto ficou até escurecer e não ser mais visto no dia seguinte. Que horas foi embora? Somente a noite o sabe.
Vasculhei alguns jornais de época, na data de terça-feira, 1 de novembro de 1983, e encontrei referência ao fato no Jornal Ultima Hora, página 2, Jornal O Fluminense e o Jornal do Brasil edição n° 207.
E se eu e todos os demais que havíamos presenciado o evento já tínhamos por opinião ser o mesmo no mínimo estranho, a versão oficial soou no mínimo bizarra. Foi divulgado que a aeronáutica brasileira havia confirmado ser o objeto um balão meteorológico provindo da África do Sul e que o vôo das duas aeronaves de caça F-5E da FAB até o local constituiu algo semelhante a um vôo de treinamento e que todo o evento tinha transcorrido normalmente não sendo nada excepcional ou que merecesse maior atenção, um mero fato corriqueiro com proporções inesperadas. Um balão feito de plástico e inflado com gás hélio que o faria refletir a luz solar, podendo atingir uma altitude entre 30 e 35 km da terra, enquanto que os caças que o foram interceptar só poderiam alcançar cerca de 12 a 14 km de altitude. Foi informado que estaria há cerca de 23 km de altitude quando da aproximação dos caças brasileiros.
Já se vão mais de 30 anos, três décadas, desde este evento e de lá para cá já vi muitos balões meteorológicos, seja em fotos ou filmes, documentários ou outros programas e revistas, e de fato, o dito cujo em nada lembrava um balão meteorológico, mas tudo bem, a mídia da época informou que a aparência estranha se deu em virtude do material do qual era composto que ajudava a refletir os raios solares, além de ser o mesmo iluminado internamente. Como todo aquele que já estudou a sério comunicação sabe, o importante não é a veracidade ou não dos fatos e sim apresentar uma boa resposta aos “porquês” em causa, ou seja, uma boa explicação explica mesmo sem de fato explicar e acalma as multidões.
Gostaria de dizer que quem viu e lembra sabe, mas não é tão simples assim. Foi um evento memorável, pena que a memória seletiva já o tenha apagado da memória de muitos que o presenciaram. Quando algo não se encaixa com perfeição em nossas crenças humanas, alguma coisa tem de ceder e quando a memória não é deturpada e readaptada a um novo contexto, ela é simplesmente apagada, ou se preferirem um termo mais moderno, deletada de nossas mentes. E fora isto, viva aos balões meteorológicos, sem os quais, muita coisa estranha não seria explicada.

Silvério da Costa Oliveira.

Prof. Dr. Silvério da Costa Oliveira.
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