Por: Silvério da Costa Oliveira.
Mikhail Bakunin
Liberdade sem socialismo é privilégio, injustiça; socialismo sem liberdade é brutalidade e escravidão.
Mikhail Bakunin. Federalismo, Socialismo e Antiteologismo (Fédéralisme, socialisme, antithéologisme), 1867-1868.
Mikhail Aleksandrovitch Bakunin (1814-1876) nasce em Premukhimo, Império Russo, e falece em Berna, Suíça, aos 62 anos de idade. Foi casado com Antonia Kwiatkowska, com quem teve duas filhas. Atuou como sociólogo, filósofo, e revolucionário de orientação anarquista. Bakunin nasce em uma família de nobres e proprietários de terras, sendo um dentre sete irmãos. Tendo se formado em 1862 na Universidade de Artilharia em São Petersburgo, em 1864 passa a integrar a guarda imperial russa, na condição de oficial, mas em cerca de um ano abandonara o exército e retornara para sua casa. Bakunin sofreu forte influência de Kant, do Idealismo Alemão e do Romantismo. Tende a se aproximar da esquerda hegeliana e assumir uma atitude de proximidade com o socialismo. Viajou e travou contato com intelectuais e ativistas políticos, por vários países da Europa (França, Itália, Alemanha, etc.), Japão e EUA. De início trava contato amistoso com Marx e Engels, estando com os mesmos em mais de uma ocasião, mas posteriormente rompe relações. No transcorrer de sua vida esteve preso diversas vezes, foi deportado e mesmo condenado a pena de morte algumas vezes, tendo em todas sido a pena comutada em prisão perpétua. Terminou seus dias livre, morrendo de doença e velhice, após uma vida bem atribulada e cheia de viagens e aventuras. Deve-se frisar que há uma virada no pensamento de Bakunin após o ano de 1865, quando assume uma atitude plenamente anarquista. Bakunin participou da fundação da Primeira Internacional Social-Democrata, sendo mais tarde expulso por Karl Marx e seus seguidores, no Congresso de Haia, em 1872.
Muito importante dentro do pensamento desenvolvido por Bakunin é sua crítica ao Estado e a hierarquia presente no governo. O Estado é entendido como um instrumento de opressão de uma classe dominante sobre as demais, favorecendo a exploração em prol dos interesses da classe dominante. Segundo o pensamento de Bakunin, qualquer forma de governo centralizado apresenta-se como tirânico, não importando suas origens ou intenções.
Bakunin era contrário ao Estado, fosse este um Estado imperialista ou resultante de uma ditadura do proletariado, como o queria Marx. Questionava o poder divino que alguns governantes alegavam ter. Posicionava-se veementemente contrário a todas as formas de governo que impusessem a vontade de uma pessoa ou pequeno grupo sobre a vontade dos demais. Posicionou-se contrário a toda e qualquer forma de autoridade imposta, seja pela religião ou Estado. Bakunin entendia que a revolução deve acontecer necessariamente de maneira violenta e espontânea. Bakunin defende a destruição do Estado e sua total abolição. O Estado tende a perpetuar a desigualdade social e econômica. Para conseguirmos a liberdade é necessário abolir o Estado e criar uma sociedade sem classes.
No entanto, Bakunin também é um crítico do marxismo, entendendo que a revolução deveria acabar com o Estado opressor e não substituí-lo por outro, no formato de uma “ditadura do proletariado” que possa vir a se mostrar na prática, mais opressora que o regime anterior. Segundo Bakunin, após a revolução não se deve instalar um governo de transição como previsto no marxismo, em seu lugar, deve-se desde o início destruir o Estado e criar outras formas de relação, baseadas na livre escolha pela união e autogestão dos trabalhadores. Uma ditadura do proletariado tenderia a se tornar um governo tirânico voltado para sua autoperpetuação no poder, criando uma nova elite dominante, uma elite burocrática e partidária.
Enquanto Marx e Engels defendiam uma ditatura do proletariado e a criação de um Estado de operários, pelo qual se daria toda a ação política, Bakunin defendia a total abolição do Estado e sua substituição pela ação direta proveniente de articulações formadas no cooperativismo e na autogestão.
Marx defendia a centralização do poder como um passo na direção da revolução, já Bakunin entendia que a centralização se mostra como autoritária e opressiva, defendendo uma via descentralizada.
Sendo contra o Estado, Bakunin defende a formação de comunas autônomas e autogeridas por seus próprios membros, unidas por livre escolha a uma federação, de modo a poderem cooperar entre si de modo voluntário. Esta organização tenderia a proporcionar maior liberdade individual e coletiva, de modo a desenvolver a solidariedade e também a igualdade entre seus membros. Se mostrando, deste modo, contrário a um poder centralizado.
Bakunin apresenta uma elaborada crítica ao Estado, a qualquer tipo de autoridade imposta e as desigualdades sociais. Para que haja uma sociedade realmente livre, tem de haver um governo de autogestão e uma federação na qual os grupos possam aderir, ou não, de acordo com suas escolhas internas. As comunas devem ser autônomas e se autogerirem. Somente seguindo estes passos, na concepção do pensamento de Bakunin, é que conseguiremos, após uma revolução, desenvolver uma sociedade que nos permita a liberdade e a justiça.
Quanto à revolução, Bakunin entende ser a mesma necessária, e que não deva ficar restrita a um único Estado, sendo obrigatoriamente internacionalizada para que se possa derrubar o capitalismo. A presença de um Estado opressor, independente do lugar no mundo onde esteja, se mostra como uma ameaça à liberdade em todas as outras partes do mundo. Deste modo, todos os trabalhadores do mundo deveriam se unir contra o capitalismo e as estruturas opressivas.
Bakunin entende que a liberdade individual e a igualdade social não são passíveis de serem separadas, sendo dependentes uma da outra. Não é possível liberdade sem igualdade econômica e social. Liberdade não é apenas a ausência de coerção, envolve a possibilidade de realização plena em ambiente de solidariedade e apoio mútuo. Liberdade não é apenas não sofrer opressão, mas também participar ativamente da construção da sociedade, o que nos traz uma concepção positiva da liberdade. A liberdade individual tende a surgir e se desenvolver a partir de um ambiente social que proporcione iguais oportunidades e recursos para todos.
Nem toda autoridade é ruim ou negada por Bakunin, ele reconhece uma autoridade que seja legítima, em oposição a uma ilegítima. A verdadeira autoridade se dá por meio do conhecimento e da experiência em dada área, e cabe à pessoa a liberdade de escolher seguir ou não esta autoridade, não sendo a mesma lhe imposta. Um médico, engenheiro ou líder político tem uma autoridade, mas cabe a cada um de nós a liberdade de poder escolher qual médico ou engenheiro ou político. O que Bakunin rejeita é a autoridade coercitiva e sem escolha possível, que nos é imposta de fora para dentro, de cima para baixo. Para termos real liberdade é necessário primeiramente abolir toda e qualquer instituição que concentre o poder para si.
Bakunin se posicionava dentro do ateísmo, defendia o coletivismo e pensava que a liberdade depende da existência da igualdade econômica e social. Posiciona-se contrário ao individualismo de modo abstrato presente nas democracias liberais, acreditando que a verdadeira liberdade se dá por meio da interação social e não no total isolamento da pessoa. Também defendia o federalismo enquanto estrutura descentralizada de governo formada por comunas que aderem voluntariamente à federação, visando gerenciar assuntos que sejam do interesse comum de todas as comunas, mas mantendo a sua autonomia. Seu pensamento se pauta no materialismo, priorizando as reais condições de existência humana.
No tocante ao trabalho, era favorável à coletivização dos meios de produção, buscando um modelo baseado no trabalho e gestão coletivos. Bakunin defende a abolição da propriedade privada dos meios de produção, substituindo-a pela propriedade coletiva. A justiça social só pode ser alcançada por meio da igualdade econômica, sendo seu contrário, a desigualdade econômica, a origem de diversos problemas sociais.
Quanto à religião, Bakunin se assumiu como ateu e apresentou críticas à religião, que entendia ser, conjuntamente com o Estado, responsável pela opressão e pelo controle social. Enquanto instrumento de controle social, a religião tende a propiciar a manutenção da submissão e da obediência dos trabalhadores a classe dominante. A religião tende a justificar a autoridade terrena por meio de uma autoridade divina, sendo, portanto, a religião um reflexo das desigualdades e opressões presentes neste mundo material. Para que haja a verdadeira emancipação do humano, é preciso rejeitar a religião e promover em seu lugar a razão e o materialismo. Bakunin rejeita qualquer forma de autoridade transcendente que possa colocar a vida humana e a liberdade sob o domínio de princípios abstratos e inatingíveis.
Segundo o pensamento de Bakunin, a filosofia deve ser materialista e colocar a vida humana e a sociedade no centro, dando destaque à razão e à experiência no direcionamento da ação. Bakunin defende a liberdade individual, a abolição do Estado, se mostra contrário a todas as formas de governo e a favor de uma federação independente, é contrário a religião e defende uma organização social que seja baseada na igualdade e na solidariedade.
PRINCIPAIS OBRAS
1- A reação na Alemanha (“Die Reaktion in Deutschland”), 1842.
Artigo em que Bakunin discute a situação política na Alemanha e critica a reação conservadora contra os movimentos revolucionários. Ele aborda a necessidade de uma revolução social que possa superar as limitações do liberalismo burguês.
2- Apelo aos eslavos (“Appeal to the Slavs” ou “Призыв к славянам”), 1848.
Trata-se de um manifesto no qual convoca os povos eslavos a se unirem em uma luta comum contra o absolutismo e a opressão nacional. Defende a solidariedade entre os diferentes povos eslavos como um meio de alcançar a libertação e a autonomia.
3- Federalismo, socialismo e antiteologismo (“Federalism, Socialism, Anti-Theologism” ou “Fédéralisme, socialisme, antithéologisme”), 1867-1868.
Ensaios onde temos a visão de Bakunin sobre a organização política e social, o papel do socialismo e sua crítica à religião. Ele defende a organização federalista como uma alternativa ao Estado centralizado.
4- Cartas a um francês sobre a crise atual (“Letters to a Frenchman on the Present Crisis” ou “Lettres à un Français sur la crise actuelle”), 1870.
Cartas nas quais são discutidos os eventos da Guerra Franco-Prussiana e a subsequente revolta de Paris. Bakunin fala sobre suas esperanças e críticas no tocante à situação política e os possíveis rumos da revolução.
5- Deus e o Estado (“Dieu et l'État”), 1871.
Obra inacabada na qual Bakunin critica a religião e o Estado, argumentando que ambos são instrumentos de opressão. Defende a abolição de todas as autoridades centralizadas em favor de uma sociedade baseada na liberdade e na igualdade.
6- A comuna de Paris e a noção de Estado (“The Paris Commune and the Idea of the State” ou “La Commune de Paris et la notion de l'État”), 1871.
Análise da Comuna de Paris enquanto exemplo prático de sua visão anarquista. Bakunin elogia a tentativa dos integrantes da comuna de abolir o Estado, e estabelece esta comuna como sendo um modelo para futuras revoluções anarquistas.
7- Estatismo e anarquia (“Státizm i Anarkhíya” ou “Государственность и анархия”), 1873.
Crítica do socialismo autoritário, em particular a obra se refere ao marxismo, e uma defesa apaixonada do anarquismo. Argumenta contra a centralização do poder e a favor de uma organização social baseada na autonomia e na federação de comunas livres.
Silvério da Costa Oliveira.
Prof. Dr. Silvério da Costa Oliveira.
Site: www.doutorsilverio.com
(Respeite os Direitos Autorais – Respeite a autoria do texto – Todo autor tem o direito de ter seu nome citado junto aos textos de sua autoria)
Nenhum comentário:
Postar um comentário