Textos filosóficos, críticos, comportamentais e sobre arte da escrita, sucesso e auto-ajuda.
Professor Doutor Silvério
Blog: "Comportamento Crítico"
Professor Doutor Silvério
Silvério da Costa Oliveira é Doutor em Psicologia Social - PhD, Psicólogo, Filósofo e Escritor.
(Doutorado em Psicologia Social; Mestrado em Psicologia; Psicólogo, Bacharel em Psicologia, Bacharel em Filosofia; Licenciatura Plena em Psicologia; Licenciatura Plena em Filosofia)
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O conceito de
“indústria cultural” foi desenvolvido pela assim chamada “Escola de Frankfurt”,
o “Instituto de pesquisa social”, aparecendo inicialmente no livro escrito
conjuntamente por Adorno e Horkheimer, “Dialética do esclarecimento”, 1947.
O foco das
análises efetuadas pelos integrantes da Escola de Frankfurt se voltou para o
que na linguagem marxista-leninista se chama de “superestrutura”. A mesma
consiste em mecanismos que atuam visando manter a estrutura social, exercendo
sua força sobre a formação e manutenção das personalidades individuais, das
famílias e da forma como concebemos a autoridade. Estes elementos se fazem
presentes na cultura de massa e no modo como elementos da arte são ali
trabalhados.
A cultura
erudita é a produzida por uma refinada elite intelectual e possui um maior
valor estético, por ser melhor elaborada, sendo também menos intuitiva. Permite
um maior desenvolvimento da intelectualidade, de modo mais pleno, devendo ser
ampliada. Já a cultura popular é formada pelas tradições populares, sendo
formada com menor refinamento técnico e intelectual e bem mais intuitiva. Ambas
culturas, erudita e popular, são consideradas autênticas por Horkheimer e
Adorno.
O conceito de
“indústria cultural” faz menção à cultura como sendo mais uma forma de
dominação social, por meio de uma indústria capitalista que vende a cultura
erudita e popular de modo mesclado e massificado, objetivando a obtenção de
lucro. Do mesmo modo que uma fábrica, a indústria cultural tem uma atuação
produtiva, sendo seu produto a arte. Aqui temos a formação cultural por meio de
produtos artísticos, tais como: filmes, peças de teatro, livros, músicas,
pinturas, fotografias, etc., provenientes das mais diversas mídias: jornais,
rádios, cinema, tv.
A indústria
cultural vende elementos provenientes da cultura popular e erudita, por meio da
alta reprodutibilidade técnica, enquanto forma de entretenimento para as massas
populacionais, de modo a permitir manter a população sob controle, na medida em
que esta se encontra satisfeita e feliz com este modo simples e agradável de
consumir a arte.
Trata-se de uma
padronização visando perpetuar na sociedade os valores capitalistas, burgueses
e tradicionais, como, por exemplo: modelos de comportamento e linguagem. A arte
presente na indústria cultural de massa se torna a principal responsável pela
dominação ao reproduzir valores sociais capitalistas e ao tornar a classe
operária satisfeita com o consumo de arte. Utilizando-se de histórias e
propagandas, a indústria cultural cria necessidades que geram consumo.
Horkheimer e
Adorno não consideram o cinema e a rádio como formas de arte. Segundo o
pensamento destes autores, ambas as técnicas visam somente o lucro dentro de
uma sociedade capitalista consumista.
A indústria
cultural não favorece a emancipação das pessoas, não estimula sua criatividade,
e permite que as pessoas atuem passivamente como receptores de toda esta
informação. Teríamos, portanto, uma cultura inautêntica vendida pela indústria
cultural e outra autêntica, esta última seria a cultura erudida e a cultura
popular.
Segundo estes
autores, “indústria cultural” não é sinônimo de “cultura de massa”, são
conceitos diferentes. É do interesse capitalista, dos produtores desta
indústria, que se use o termo “cultura de massa”, dando a entender tratar-se de
uma cultura que surge espontaneamente do interior das próprias massas, do povo,
mas isto não é verdade, pois, há aqui uma relação vertical na qual os criadores
não somente adaptam seu produto ao gosto das massas, como também influenciam e
determinam este gosto e consumo.
A indústria
cultural reduz a todos na sociedade a condição de empregados ou consumidores e
tem como objetivo ser a portadora da ideologia dominante, proporcionando
sentido ao conjunto do sistema. A indústria cultural transforma tudo em negócio
e vende como arte algo padronizado para as massas populares, atuando de modo
sistemático e programado no sentido de explorar os bens culturais. Em uma
sociedade capitalista, a obra de arte é diluída e padronizada para ser vendida
como mercadoria, deste modo, perde o potencial crítico e de contestação.
O conceito de Teoria
Crítica irá ser fundamental na elaboração do pensamento da assim chamada
“Escola de Frankfurt”, o “Instituto de pesquisa social”, do qual participaram
vários intelectuais de esquerda, fazendo uma releitura de Marx, dentre os quais
podemos citar os mais conhecidos como sendo: Horkheimer (1895-1973), Adorno
(1903-1969), Marcuse (1898-1980) e Habermas (1929-), dentre outros. A tal ponto
este conceito se mostra fundamental dentre os pensadores da primeira geração
desta Escola, que para muitos comentadores o termo “Teoria Crítica” se
apresenta como sinônimo para “Escola de Frankfurt”.
No livro “Teoria
Tradicional e Teoria Crítica”, de 1937, de Horkheimer, e também no livro
“Dialética do esclarecimento”, 1947, escrito em conjunto por Horkheimer e
Adorno, é apresentado e desenvolvido o conceito de Teoria Crítica, estando esta
em oposição à Teoria Tradicional. Na Teoria Crítica teríamos a razão objetiva,
já na Teoria Tradicional teríamos a razão subjetiva, formal e instrumental.
A Teoria
Tradicional é entendida como uma forma de pensar que surge a partir do
Racionalismo de René Descartes e seus continuadores, bem como do movimento
presente no século XVIII, o Iluminismo, e, mais recentemente do Positivismo. A Teoria
Tradicional apresenta a razão de modo subjetivo, formal e instrumental, voltada
para os meios destinados a um determinado fim proposto, que deve ser alcançado
de modo mais eficiente e com menor gasto de recursos (tempo, dinheiro, mão de
obra, etc.), tendo como único critério de verdade o valor operativo da mesma. A
razão subjetiva, formal e instrumental tem como finalidade a dominação da
natureza, mas também do humano. A razão subjetiva se propõe a adequar os meios
aos fins propostos. A razão objetiva busca entender e determinar os fins a
serem atingidos.
No pensamento
oriundo do Racionalismo, Iluminismo e Positivismo, presente na Teoria
Tradicional, pode-se argumentar que conjuntamente com o esclarecimento, a
educação e o desenvolvimento das ciências, passaríamos a ter na sociedade
também um avanço moral. Já os adeptos da Teoria Crítica argumentam que não, que
o desenvolvimento tecnológico e científico não está associado ao
desenvolvimento social e moral.
Abre-se com a Teoria
Crítica, o espaço para debater porque continuamos a ter conflitos sociais,
guerras, e problemas sociais e econômicos, bem como, o porquê da existência da
fome, da intolerância e outras mazelas da sociedade.
Segundo esta
abordagem teórica, quando a Teoria Tradicional busca descrever as instituições
sociais, por meio de seus estudos tende a legitimar as práticas sociais
repressivas e injustas, mostrando-as como naturais e objetivas.
A Teoria Crítica
se apresenta como uma postura crítica à tradição do pensamento ocidental e
também ao pensamento marxista-leninista presente na esquerda política
intelectual, se opõe, portanto, ao que chama de “Teoria Tradicional”. Este
projeto de desenvolvimento de uma Teoria Crítica e materialista interdisciplinar
de base marxista se apresenta na década de 1920 e prossegue pelas décadas
seguintes. Neste projeto temos como base comum a pesquisa em ciências sociais e
humanas tendo como principal objetivo o entendimento do funcionamento da
realidade social e os meios para a sua transformação, em decorrência das
contradições e potencialidades presentes nesta mesma sociedade. Este projeto
buscava uma integração entre diversos elementos, provindos de distintos campos
teóricos, mas priorizando a leitura da obra de Marx e de uma abordagem materialista
histórica. Nele temos presente as ciências sociais, a economia, a sociologia, a
psicologia social e a psicanálise.
Algumas teses
centrais ao Marxismo-Leninismo são abandonadas ou reformuladas, como tal é o
caso de: Ser a teoria de Marx algo finalizado e perfeito, que não admitisse
mudanças; o potencial revolucionário do proletariado; a ditatura do
proletariado; a luta de classes como motor da história (esta luta passa a ser
deslocada para a presença das contradições observadas na sociedade); o centro
de toda análise social ser a subestrutura econômica. Apesar destas críticas,
entendem tais autores que o socialismo é o único caminho possível para superar
tudo que há de ruim no capitalismo e proporcionar uma nova vida ao antigo
marxismo.
Os intelectuais
defensores da Teoria Crítica pretendiam mostrar as formas de controle social
presentes na sociedade, fazendo uma análise crítica do capitalismo, do
comunismo e do fascismo (também do Nazismo). Entendiam que na URSS havia uma
forma de capitalismo de Estado e não o comunismo como proposto nos escritos de
Marx.
A Teoria
Tradicional busca descrever a realidade tal qual ela se apresenta, enquanto a Teoria
Crítica, por sua vez, tem como objetivo a emancipação do humano. Segundo o
pensamento desenvolvido pela Teoria Crítica, é por meio de nossa existência e
vivência social que podemos desenvolver a nossa consciência.
Jürgen Habermas
(1929- ) filósofo, sociólogo, escritor, alemão. É proveniente de uma família protestante,
sendo seu pai pastor. Entre 1968 e 1972 residiu e trabalhou nos EUA. Considerado
como parte da segunda geração da assim chamada Escola de Frankfurt, por ter
participado no Instituto de pesquisa social, da Universidade de Frankfurt, como
assistente de ensino de Adorno.
A primeira
geração da Escola de Frankfurt seria composta por Horkheimer, Adorno, Marcuse e
outros, a segunda por Habermas e a terceira por Axel Honneth. Há quem considere
que Horkheimer representa a primeira geração, que iria da década de 1920 até a
década de 1950, que Adorno representaria a segunda geração, a partir da década
de 1950, que Habermas seria representante da terceira, e Axel Honneth seria o
principal representante da quarta geração, que buscaria retornar para o pensamento
anterior ao proposto por Habermas.
Dentre seus
principais livros temos: “Mudança Estrutural da Esfera Pública”, 1962, “Técnica
e Ciência como Ideologia”, 1966, “Conhecimento e Interesse”, 1968, “Teoria da
Ação Comunicativa” 1981, “Consciência Moral e Agir Comunicativo”, 1983, “O
Discurso Filosófico da Modernidade”, 1985, “Entre Fatos e Normas” 1992, “A
Inclusão do Outro: Estudos de Teoria Política”, 1996, “Direito e Democracia”,
2003, “Dialética da Secularização: sobre razão e religião”, 2005, “O Ocidente
Dividido”, 2006.
Seus trabalhos
versam sobre a democracia, tendo contribuído com a teoria do conceito de agir
comunicativo ou teoria da ação comunicativa (racionalidade comunicativa),
teoria da política deliberativa, teoria da esfera pública. Seus estudos
abrangem as bases da teoria social e também da epistemologia, realiza uma
análise do sistema democrático capitalista. Se propõe a estudar o Estado de
direito dentro do contexto da evolução social, e também estudar a política.
Objetivando
atingir suas metas e obter sucesso, inicialmente as pessoas buscam seus
interesses por meio de uma estratégia pautada nos resultados que serão obtidos.
Deste modo, visando atingir seus objetivos e influenciar as ações das demais
pessoas, torna-se válido o uso de qualquer meio cujo resultado implique o
sucesso na obtenção dos resultados almejados: uso de armas e ameaças, vantagens
e benesses, sedução, etc. Havendo cooperação, esta ocorre em virtude do que a
pessoa pensa poder ganhar ou perder com sua ação. Aqui temos o agir estratégico
ou instrumental.
Habermas propõe
substituir a razão instrumental proposta por Adorno e Horkheimer pela razão
comunicativa. A Teoria Crítica presente na Escola de Frankfurt apresenta a
razão instrumental como inerente à lógica capitalista. Habermas ao propor a
razão comunicativa tem em mente a emancipação do humano, sendo uma postura que
pode ser considerada bem mais otimista do que a visão social proposta por
Adorno e Horkheimer.
Habermas
desenvolve em seu trabalho uma crítica às ideais provindas do Positivismo, que,
segundo ele, teriam propiciado a geração de uma ideologia tecnocrática na qual
predomina a racionalidade instrumental, enquanto único critério possível de
validação, reduzindo a práxis à técnica.
A questão
presente em Habermas, da mesma forma que em Adorno e Horkheimer, continua sendo
a temática presente no projeto dos filósofos modernos (projeto da modernidade),
tais como Descartes, nos filósofos do Iluminismo (projeto Iluminista) e nos
filósofos da corrente Positivista. Adorno e Horkheimer haviam dado uma resposta
negativa, afirmando ter este projeto fracassado em virtude da razão
instrumental, ao não possuir uma finalidade, seja esta o bem maior da sociedade
ou uma ética vinculada à religião e ao Deus cristão, podia ser usada para
projetos totalitários e mesmo genocidas, atuando conjuntamente com o
desenvolvimento da tecnologia para a alienação das pessoas. Já Habermas tem uma
visão mais positiva sobre a questão. Sem negar a existência da razão instrumental,
propõe que a razão é algo mais amplo, havendo também uma razão vinculada ao
agir comunicativo.
De posse do
conceito de agir comunicativo, Habermas propõe a retomada do projeto
Iluminista, apontando suas falhas e erros e corrigindo o seu direcionamento. A
conclusão que Habermas propõe para concluir o projeto presente na Modernidade e
no Iluminismo se dá pela instauração de um novo paradigma na filosofia, o qual
coloca a linguagem como a detentora da possibilidade de entendimento
intersubjetivo. Esta comunicação se dá no “mundo da vida”, no qual os sujeitos
buscam o entendimento por meio do diálogo. Habermas, portanto, retorna à razão,
mas não com o fito de esclarecer um único sujeito, mas sim de esclarecer toda a
sociedade, pois, o sujeito está obrigatoriamente inserido em um grupo maior, a
sociedade, sendo por meio de suas relações que se dá o esclarecimento para
todos ali envolvidos no discurso.
Dentre as
contribuições teóricas de Habermas temos o conceito de ação comunicativa: A
Teoria da Ação Comunicativa de Habermas (1981). Trata-se de um modelo racional
de interação que visa alcançar acordos fazendo uso da argumentação, do debate e
da deliberação. Ocorrendo na esfera pública, local onde teríamos a presença de
diversos segmentos sociais conjuntamente com os representantes do Estado. Esta
teoria tem como meta elaborar uma avaliação crítica das formas de vida e das
épocas concretas na sua totalidade, meta esta que deverá ser cumprida sem a
projeção de normas oriundas de alguma corrente filosófica ou histórica.
Apesar de autor
de várias obras, alguns comentadores consideram sua mais importante e relevante
obra o livro de 1981, “Teoria da ação comunicativa”, no qual aborda os
fundamentos da teoria social, fazendo uma análise da democracia e do Estado de
direito, bem como, da política então praticada, tendo como foco a Alemanha.
Este trabalho pode ser visto como uma tentativa por parte de Habermas, de
propiciar o restabelecimento da relação entre de um lado o socialismo /
comunismo e de outro a democracia nos regimes capitalistas ocidentais. Nesta
obra aponta para um modelo de ação comunicativa, a democracia deliberativa, por
meio do qual pode-se obter um consenso de forma não coercitiva na criação de
regras sociais. O modelo de ação comunicativa propõe ser uma estrutura racional
de interação por meio de debates, argumentações e deliberações, visando a
obtenção de acordos entre todas as partes envolvidas e por meio de um consenso.
Os espaços de discussão ocorrem na esfera pública e englobam a presença de
qualquer grupo social bem como representantes do Estado.
Segundo o
pensamento de Habermas, caberia a sociedade evoluir do uso da ação estratégica
para o uso da ação comunicativa. Na ação comunicativa o sucesso não é o que
pauta toda a ação e sim o encontro de um entendimento compartilhado por todos
os envolvidos na questão. Temos aqui presente a discussão em busca de um
consenso. Tanto a ação estratégica, como também a ação comunicativa, são
baseadas na racionalidade, mas há uma diferença, pois, na ação comunicativa, ao
contrário da estratégica, se escuta os argumentos contrários, há a presença de
um diálogo, podendo mudar ou aperfeiçoar os objetivos iniciais. Busca-se aqui
um entendimento mútuo e compartilhado por todos os envolvidos. Deste modo, Habermas
se coloca contrário ao uso da repressão, censura e ausência de diálogo,
entendendo que a democracia política surge do diálogo propiciado pelas ações
presentes no agir comunicativo. Habermas defende o uso do discurso visando o
consenso e estando livre da violência entre os interlocutores.
Busca Habermas a
superação do paradigma então adotado, da mente humana ou da consciência, pelo
da linguagem. Temos a formação de uma teoria comunicativa generativa da
sociedade.
No conceito de
razão comunicativa, Habermas entende que há uma diferença entre os mundos:
objetivo, social e subjetivo. Por meio desta diferenciação podemos distinguir o
pensamento moderno do pensamento mítico.
Habermas nos
fala de um núcleo universal composto por estruturas básicas presentes na
linguagem de todos que falam. Este núcleo é dominado, a partir de dado momento
do desenvolvimento, por todas as pessoas que usam a linguagem, temos aqui a
competência linguística, que permite ao usuário da linguagem fazer um uso
gramatical correto da mesma. Ocorre, no entanto, que esta competência
linguística não se restringe a produção de falas que sejam corretas dentro da
gramática. Esta competência, no tocante à pretensão de validade, se vincula a
três mundos. O mundo objetivo aponta que o enunciado é verdadeiro quando se
refere aos fatos aos quais faz alusão. O mundo social composto pelas normas que
o compõe, aponta para que o ato de fala seja correto, no sentido do uso correto
destas normas. Aqui temos a pretensão de justiça. E por último, o mundo subjetivo,
que é o mundo composto por tudo que está na mente, na consciência, deste
falante, se vincula a outra pretensão, a da veracidade, que se dá quando a fala
corresponde ao que de fato é pensado, ou seja, quando expressamos externamente
aquilo no qual realmente acreditamos, desejamos ou pretendemos de fato fazer.
Ao dizer o que de fato pensamos e acreditamos, não mentimos para o outro.
Dentro do
conceito de ação comunicativa temos como operador o meio linguístico, meio este
que engloba o próprio agente da ação no contexto da racionalidade ali
desenvolvida. Enquanto que na razão estratégica podemos ter um uso unilateral
da razão, a razão comunicativa exige que a linguagem seja usada como meio para
o correto entendimento entre os envolvidos pelo discurso, deste modo, há de
articular ente si três distintos mundos: objetivo, social e subjetivo.
Habermas propõe
três tipos de discurso: teórico, prático e explicativo. Quando o falante busca
provar que suas asserções são verdadeiras, faz uso do discurso teórico. Quando
o falante busca justificar que uma ação ou norma adotada para ação seja a
correta, faz uso do discurso prático. Quando o falante deseja explicar algo,
faz uso do discurso explicativo.
Para Habermas
existem quatro pretensões de validade implícitas dentro de qualquer ato
comunicativo visando a mútua compreensão entre os falantes: inteligibilidade,
verdade, sinceridade e correção normativa. Por isto entende que as pretensões
devem obedecer aos seguintes requisitos: que as expressões sejam inteligíveis, que
o conteúdo seja verdadeiro, que as intenções sejam expressas com sinceridade,
que se adaptam corretamente a normas e valores existentes.
A ética presente
no discurso exige que as normas morais adotadas sejam passíveis de
universalização, mesma exigência feita anteriormente por Kant com seu
Imperativo categórico, mas em outro contexto conceitual-filosófico. Habermas
entende que a decisão sobre o que faz sentido e o que é aceito como correto nas
vidas das pessoas deve ser tomada por meio da racionalidade e da argumentação,
o que caracteriza a sua ética do discurso. A ética, portanto, tenderá a se
pautar no diálogo e no consenso.
Pelo prisma da
“ética da discussão”, que pode ser entendida dentro da obra de Habermas, temos
que, convencer o interlocutor, não é tão importante quanto o diálogo entre as
pessoas buscando alcançar um consenso. Segundo Habermas, somente pelo diálogo e
entendimento entre os diversos atores sociais por meio do agir comunicativo é
que se pode estruturar uma ética social.
Com relação a esfera
pública, Habermas entende que a mesma não fica restrita ao meio público
estatal, sendo, em verdade, constituída pela interação e discussão não importa
o lugar.
Segundo o
entendimento de Habermas, torna-se fundamental para a democracia a existência de
amplo debate público, livre e racional, objetivando a produção de consenso
entre seus participantes, conciliando, deste modo, os direitos com as ações
visando atingir determinados objetivos.
Habermas tece
uma crítica à democracia representativa atualmente adotada nos países
ocidentais. Segundo Habermas a democracia é importante, mas esta não deve ser
representativa e sim participativa. Somente por meio da ação comunicativa,
ocorrendo em um espaço público livre, teremos a possibilidade do
desenvolvimento de todo potencial humano, e a sua emancipação. Esta democracia
ideal se apresenta como participativa e deliberativa, na qual predomina o
debate visando a construção de normas e leis validadas pelo consenso do grupo
de pessoas envolvido em seu debate e construção. Mesmo moral e ética seriam
decorrentes deste debate, como todo o correto comportamento social exigido pela
sociedade de seus integrantes.
Central também
ao pensamento de Habermas é o conceito e a distinção entre, por um lado, “mundo
da vida”, e por outro, o “sistema” (o termo utilizado por Habermas é “sistema”,
mas pode-se entender o mesmo como referência ao local onde exercemos todas as nossas
atividades de trabalho, e que está sujeito a todas as regras sociais, políticas,
tecnológicas e econômicas) ou “mundo do trabalho”.
O falante ao
fazer uso da linguagem parte de vários pressupostos não questionados presentes
no “mundo da vida”, mesmo quando problematiza algo, este algo é separado de
vários outros elementos não questionáveis naquele momento, e que justamente por
não serem ali questionados, permitem o questionamento em pauta. É no “mundo da
vida” que ocorrem todas as interações sociais, onde temos as crenças e a
realidade subjetiva das pessoas. No “mundo da vida” deveria predominar o agir
comunicativo, buscando a sinceridade e o consenso entre os participantes. Já no
“mundo do trabalho”, ou “sistema”, predomina a razão instrumental, que busca
atingir a determinado fim proposto. Infelizmente, há uma tendência do “mundo do
trabalho”, o “sistema”, vir a colonizar o “mundo da vida”.
O “mundo da
vida” se apresenta como um horizonte no qual todos agimos de modo comunicativo.
Há uma constante relação entre o “mundo da vida” e o “sistema”.É no “mundo da
vida” que os falantes se encontram por meio do uso da linguagem e este sempre
irá se relacionar com o “sistema”, local onde predomina o poder, o dinheiro e a
presença do Estado. No “mundo da vida” encontramos alguns componentes
estruturais que permitem a sua existência e vitalidade diante do “sistema”, mas
que quando enfraquecidos, permitem a colonização do “mundo da vida” pelo “sistema”,
estes componentes são: a cultura, a sociedade e a personalidade.
Quando Habermas
se refere ao conceito de “mundo da vida”, ele o faz pensando no ambiente que
cerca o falante. Neste ambiente temos a presença das ações efetuadas por este
falante em suas relações recíprocas com outros falantes, temos presente um meio
simbólico onde ocorrem estas interações, temos presente um meio sociocultural
no qual o falante se vê diante de evidências que corroboram suas certezas e sua
realidade, as quais não são colocadas em questionamento por parte deste e por
parte daqueles com quem interage. Cria-se, portanto, um ambiente comum de
compreensão que permite aos sujeitos fazerem uso da linguagem de modo
comunicativo.
No mundo
sistêmico temos o Estado, o poder e o dinheiro. É o local de uso da razão
instrumental, onde se busca meios mais eficazes e com gasto menor de recursos,
para se alcançar determinado fim proposto. Tudo aqui é encarado como objeto,
passível de ser manipulado. Quando o “mundo do trabalho” coloniza o “mundo da
vida”, temos que as pessoas passam a ser entendidas como objetos passíveis de
serem manipulados em prol de atingir determinado fim.
Tanto o conceito
de “mundo da vida”, como também o conceito de “sistema”, que alguns
comentadores chamam de “mundo do trabalho”, são ambos centrais dentro do
pensamento de Habermas. Este autor entende o “mundo da vida” como sendo o
espaço no qual ocorre a comunicação e o consenso por meio do “agir
comunicativo”. Por sua vez, Habermas entende o conceito de “sistema” como sendo
o espaço ocupado pelos meios instrumentais do poder, pela moeda (dinheiro),
pelas estratégias visando a obtenção de um dado comportamento, pela busca da
orientação das ações dos ouvintes visando atingir um objetivo proposto
anteriormente.
Se formos a
título de conclusão fazer um resumo simples e bem humorado em uma única frase
da teoria de Habermas, no que concerne a sua parte mais conhecida sobre a
democracia, a linguagem e o agir comunicativo, poderíamos dizer: “É conversando
que a gente se entende”.