Professor Doutor Silvério

Blog: "Comportamento Crítico"

Professor Doutor Silvério

Silvério da Costa Oliveira é Doutor em Psicologia Social - PhD, Psicólogo, Filósofo e Escritor.

(Doutorado em Psicologia Social; Mestrado em Psicologia; Psicólogo, Bacharel em Psicologia, Bacharel em Filosofia; Licenciatura Plena em Psicologia; Licenciatura Plena em Filosofia)

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terça-feira, 24 de maio de 2022

Neoplatonismo e Plotino

 Por: Silvério da Costa Oliveira.

 Neoplatonismo e Plotino

 NeoPlatonismo

O termo “neoplatonismo” se refere a Escolas de filosofia que, por suas doutrinas, tem sua base teórica pautada na obra do filósofo Platão. Este termo foi cunhado no século XIX por estudiosos do tema, na época destes filósofos eles não se consideravam “neoplatônicos” e simplesmente continuadores das doutrinas expressas por Platão. Estas Escolas filosóficas se desenvolvem entre os séculos III e VI d. C. Por fim, diante do combate com o nascente, e cada vez mais forte, cristianismo, o neoplatonismo irá perecer, não resistindo ao duro golpe de todas as Escolas de filosofia terem encerradas as suas atividades no ano de 529 d.C., por ordem do imperador do Império Romano do oriente, Justiniano.


 

Apesar de ter o filósofo Platão como referência e inspiração e de seus adeptos se considerarem continuadores de seu pensamento e obra, temos bastante originalidade presente em filósofos pertencentes a este movimento, tal o caso de Plotino, além de observarmos, também, a presença da influência de outros autores antigos, tais como Aristóteles, o que denota um certo grau de ecletismo. Também podemos perceber alguns elementos de origem ou inspiração no misticismo e nas religiões orientais, aliás, lembremos que o movimento surge no oriente, mais especificamente no Egito, na cidade de Alexandria.

Uma das diferenças mais facilmente observadas entre Platão e os continuadores desta época histórica, é que em Platão temos um dualismo a partir da teorização da existência de um mundo das ideias, já para os assim chamados neoplatônicos, temos um rigoroso monismo. Tanto para Platão como também para o neoplatonismo, não existe o mal em concretude, pois, o mal não passa da ausência do bem.

O neoplatonismo pode ser dividido em três momentos históricos geográficos, representados por três Escolas. A Escola Alexandrino-romana, formada principalmente por Amônio Sacas (175-242/245 - século III d. C.), Plotino (204/205-270 d.C.) e Porfírio (232-304 d.C.). A Escola Siríaca, formada principalmente por Jâmblico (245-330 d.C.), Juliano, o apóstata (331-363 d.C.). A Escola Ateniense, formada principalmente por Proclos (410-484 d.C.).

Amônio Sacas é considerado como sendo o fundador do neoplatonismo. Teve como discípulos, além de Plotino, também Herenio e Orígenes, este último um neoplatônico que não deve ser confundido com seu homônimo cristão. Na sequência de Plotino, teremos no neoplatonismo Porfírio e Damáscio (458-533 - século VI d.C.).

Além de ser uma importante corrente filosófica na Antiguidade, também teve o mérito de influenciar profundamente o cristianismo, o judaísmo por meio da cabala, e o islamismo. Tais religiões fizeram uso da elaboração do conceito de Uno, então presente nesta Escola filosófica e o adaptaram as suas respectivas realidades.

Seu principal e mais conhecido representante foi Plotino e se diferencia das Escolas Cínica, Estoica e Epicurista, pois enquanto estas se pautavam em uma maior influência de pensadores pré-socráticos, em particular Heráclito e Demócrito, bem como do filósofo Sócrates, cabe a esta Escola priorizar ao filósofo Platão, sendo uma importante corrente filosófica da Antiguidade. Mesmo não sendo considerado o fundador do movimento, mérito que os comentadores dão ao seu mestre, Amônio Sacas, com quem Plotino estudou por cerca de 10 anos, Plotino é visto como o grande sistematizador do neoplatonismo, sendo, por vezes, o movimento identificado a sua pessoa.

Plotino nasceu em Lycópolis, Egito, estudou filosofia em Alexandria, Egito, e posteriormente transferiu-se para Roma, onde desenvolveu uma filosofia com vertente mística oriental e voltada para a salvação, se contrapondo ao então crescente movimento cristão. Posteriormente, com a vitória do cristianismo, parte do desenvolvimento filosófico desta Escola foi incorporado ao pensamento de autores cristãos.

Após seus estudos com Amônio Sacas, Plotino acompanhou o imperador Gordiano com seu exército até a Síria e a Pérsia, mas com a derrota do exército e o assassinato do imperador, refugiou-se em Antioquia e em sequência seguiu para Roma, onde chegou em 245 e fundou uma Escola de filosofia.

Plotino teve sua obra organizada e publicada por seu discípulo, Porfírio, que a dividiu em nove tomos, daí ser chamada de “Enéadas”. A obra Enéadas é composta por uma coleção de 54 tratados, divididos em seis capítulos (livros), sendo cada capítulo dividido em nove partes, ennéa significa nove em grego.

Podemos observar na obra de Plotino uma filosofia original, mas com influência de pensadores anteriores, tal é o caso de Platão e do platonismo, de Aristóteles e sua Escola, bem como do estoicismo, do neopitagorismo e do filósofo Parmênides.

Em linhas gerais, podemos falar em três hipóstases dentro do movimento neoplatônico, tomando por base o pensamento de Plotino: O um ou Uno, o nous, e a alma. O termo hipóstase é proveniente do grego clássico e faz referência à “substância” ou à natureza de algo, ou ainda a uma determinada instância deste algo. Pode fazer referência à existência de algo individual, a uma realidade concreta, fundamental e permanente.

As três hipóstases presentes no pensamento de Plotino são respectivamente o Uno, o nous e a alma. O termo “hipóstase” tem como significado “estado subjacente” ou “substância subjacente”, em outras palavras, a própria realidade última na qual tudo o mais se fundamenta. Por baixo da superfície dos fenômenos que percebemos há princípios superiores chamados de hipóstases, as quais se apresentam em uma hierarquia, no qual cada princípio emana do anterior, refletindo a sua imagem, deste modo, temos o Uno, o nous e a alma (psyche, mente divina, alma do mundo, alma universal).

Apresenta a ideia de Uno, que pode também ser entendido, mais tarde, como Deus dentro do pensamento de alguns autores cristãos que foram influenciados pelo seu pensamento. O conceito de Uno se contrapõe à ideia de trevas, ou ausência da luz proveniente do Uno. O que de fato existe é somente o Uno, sendo o restante visto não em sua concretude, mas sim como a ausência do Uno. Da mesma forma que a escuridão da noite é a ausência da luz. A dualidade presente no conceito de mundo das ideias de Platão é aqui atenuada, pois, tudo é Uno, algumas coisas estão dele mais próximas e outras mais afastadas, mas mesmo estas são também parte do Uno. A semelhança de uma imagem no espelho ou da sombra projetada de um corpo, as demais coisas não possuem uma realidade independente do Uno e nem toda a perfeição do mesmo.

O um ou Uno é entendido como sendo a perfeição, o absoluto, o eterno e o imutável. Já o nous é entendido como sendo a inteligência (intelecto) ou o pensamento. O nous pode ser entendido como sendo a razão universal ou o logos, tal como presente em filósofos anteriores. A alma é proveniente do nous e cabe à alma a contemplação do nous.

O primeiro princípio é o “um” ou “Uno”, fazendo referência a que tudo é uma unidade. Este princípio possui um caráter transcendente, simples e em contraste com a multiplicidade. É tido como a origem necessária para que tudo exista. Já o nous é a imagem perfeita do um ou Uno. Tudo procede do Uno, mas não é por ele criado e sim emanado, do mesmo modo que a luz do sol.

O Uno que Plotino apresenta é transcendente, mas em tudo o mais temos sua presença imanente, de modo que este se mostra como parte de um sistema no qual temos um panenteismo, ou seja, tudo está no Uno, mas este é mais que tudo que podemos observar, transcendendo a toda realidade.

O Uno se identifica com o Bem, já a multiplicidade há de se identificar com o mal, pois tende a se afastar da unidade. Quanto mais próximo do Uno, maior a perfeição e quanto mais distante, maior a imperfeição. Deste modo, a matéria se mostra como algo mal, mas somente por estar mais afastada do Uno e, portanto, ser imperfeita em relação ao Uno.

Plotino se baseia na dualidade presente em Platão a partir da formulação do conceito de mundo das ideias. Entende que temos um corpo e uma alma ou espírito, sendo o primeiro (o corpo) finito e temporário e o segundo (alma ou espírito) eterno e imortal.

Entende que os humanos possuem três almas, a superior ou intelectiva, a racional que se iguala a alma universal, e por último, a alma sensitiva vinculada e unida ao corpo para atender as funções necessárias a sobrevivência deste.

Plotino ao fazer referência a existência de três almas ou três potências da alma no homem ou três homens, não gera obstáculo a entendermos este mesmo humano como um “eu” e não múltiplos. A superior (intelectiva ou nous) nos permite contemplar o mundo inteligível, podendo também ser chamada de o primeiro homem. A racional (diánoia ou alma do mundo) nos permite raciocinar e nos afastarmos de nosso corpo, sendo por meio dela que decidimos sobre nosso destino, podendo também ser chamada de segundo homem. A sensitiva (aisthêtike) é a mais unida ao corpo, pois, por meio dela realizamos as funções sensitivas e vegetativas, é por meio dela que nosso corpo é vivificado, podendo também ser chamada de terceiro homem. Nenhuma destas três almas está realmente unida ao corpo, só estão submersas dentro do corpo, do mesmo modo que ocorreria ao corpo de alguém que se sentasse na beira de um rio com os pés dentro d’água, mas todo o restante do corpo fora. Em essência todas as três almas são iguais, o que ocorre é que varia o grau em que as mesmas estão submersas em nosso corpo, no entanto, o máximo grau de submersão não se encontra nos humanos ou demais animais, e sim nas plantas.

Podemos falar em três estágios, que vão do Uno, a partir de sua emanação, o nous, até a alma do mundo e o mundo material. O nous é emanado diretamente do Uno e pode ser entendido como logos, inteligência, razão suprema, sendo a primeira e suprema manifestação do Uno. A alma do mundo compartilha em si a inteligência e o mundo sensível, estando na divisa de dois mundos. Já o mundo material é o estágio que está mais afastado da verdadeira luz proveniente do Uno. Mas também é no mundo material que o humano nasce e se desenvolve, podendo dele elevar-se a estágios mais avançados em direção à contemplação do nous e do Uno.

O Uno se mostra como a origem e fonte transcendente e inefável de tudo que há, e dele emana o nous, que por sua vez gera por emanação a alma do mundo. Por meio da alma do mundo é formado todo o cosmos, o mundo material. Por meio da filosofia e da contemplação podemos retornar ao Uno. Plotino nos ensina deste modo que tudo se apresenta enquanto gradações de níveis ontológicos, a partir de uma realidade mais elevada ou primeiro princípio, que é o Uno, perfeito, eterno, criativo, sem forma, sem medida e infinito.

Em Plotino, a rigor, estamos diante de uma teologia negativa (ou apofática, em oposição a teologia positiva / afirmativa / propositiva, ou catafática) ao falarmos sobre o Uno, pois, dele nada se pode predicar, estando o mesmo muito além de qualquer predicação que dele possamos fazer. Qualquer atributo que possamos conferir ao Uno o estaria limitando e, portanto, sendo causa de imperfeição. O Uno não é o criador ou causa de tudo a partir de sua vontade consciente, mas sim como efeito necessário de sua absoluta perfeição. Gera a partir de emanação, sem nada perder ou diminuir de si próprio. As coisas provêm do Uno como o frio emana do gelo, ou o calor do fogo, ou a luz do sol, ou a imagem do espelho.

Para Plotino a matéria é a fonte de todo o mal, pois com ela temos a multiplicidade e o afastamento do Uno. A matéria é entendida como sendo um elemento mal e negativo, cárcere da alma e suporte das formas.

Para Plotino o mal é a privação ou afastamento do Uno, do mesmo modo que podemos ter luz e escuridão, sendo esta última a ausência ou privação da luz. A beleza e a inteligibilidade dos seres provêm do Uno e quanto mais afastados deste, mas também se afastam destas características. A matéria é o que mais se afasta do Uno, de modo que esta representa o mal, não em sua concretude, mas sim enquanto afastamento do Uno.

Apesar de não podemos conhecer o Uno por meio de conceitos obtidos por nossa inteligência oriundos da nossa experiência no mundo material, podemos conhece-lo por meio da intuição e de uma forma de êxtase místico. O Uno proposto por Plotino está acima de todas as categorias, inclusive a de deus e de divino, o Uno carece de toda determinação, tanto ontológica como também inteligível.

 Silvério da Costa Oliveira.

 

Prof. Dr. Silvério da Costa Oliveira.

Site: www.doutorsilverio.com

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