Por: Silvério da Costa Oliveira.
Giovanni Pico della Mirandola
Giovanni Pico dela Mirandola (1463-1494) teve uma vida curta, vindo a falecer aos seus 31 anos de idade. Nasce em Mirandola, Itália e falece em Florença, Itália. Proveniente de família nobre, recebe o título de conde. Detentor de dons artísticos e famoso por sua boa memória, já a partir dos 14 anos passou a se dedicar a sua formação profissional, vindo a estudar formalmente direito, teologia e filosofia. Com objetivo nos estudos, viajou por cerca de sete anos pela Itália e França, estando presente nas principais faculdades e também se dedicando a aprender vários idiomas. Também se interessou pelo estudo da Cabala e do Talmud. Tinha como objetivo poder conciliar a religião cristã com a filosofia e, neste tocante, se aproxima de Marsílio Ficino (seu mestre), de Platão e do neoplatonismo, ao mesmo tempo em que se afastava do pensamento de Aristóteles e da Escolástica. Claro está, no entanto, que por ser um pensador eclético, iremos encontrar em sua filosofia também elementos de Aristóteles e outros.
Sua morte ainda bem jovem levantou suspeitas entre os comentadores e estudiosos de sua obra que o mesmo poderia ter sido envenenado, algo comum a sua época histórica. No ano de 2008, três universidades italianas formaram uma equipe de trabalho que pôde exumar o corpo e realizar testes objetivando desvendar a causa de sua morte, tendo a equipe de pesquisadores chegado à conclusão que a morte teria se dado por veneno, mas especificamente, arsênico, ao mesmo tempo em que derrubava a tese de ele ter contraído sífilis, pois não foram encontrados traços referentes a presença desta doença.
Em 1486, então com 23 anos de idade, publica “Conclusiones Nongentae” ou “Novecentas teses”, buscando conciliar de modo eclético, correntes filosóficas e místicas com o cristianismo. Tinha como objetivo realizar na cidade de Roma uma ampla discussão a partir destas teses, mas foi proibido de o fazer pela Igreja Católica Apostólica Romana. Inicialmente 13 de suas teses foram consideradas heréticas e proibidas, posteriormente todas as 900 teses foram condenadas e ele acabou preso, precisando seu mecenas, Lorenzo de Médici, O Magnífico, interferir para obter sua liberdade.
Foi um dos mestres da Academia de Florença e está incluso entre os mais destacados humanistas do Renascimento italiano. Considerado eclético, nele temos presente elementos de Platão, dos neoplatônicos e de Aristóteles, além de uma vertente mística proveniente da teologia cristã, da cabala e do hermetismo. Sua principal obra é “Sobre a dignidade do homem” (“De dignitate hominis” ou “Oratio de Hominis Dignitate”), que é uma oração escrita como introdução as 900 teses que pretendia apresentar em Roma, mas que não o fez em virtude de proibição papal. Estas teses seriam um manifesto do Renascimento italiano.
Como representante do humanismo renascentista, tende a mudar a ênfase e ponto de partida de sua reflexão filosófica e teológica quando comparada à medieval, de Deus para o humano. Enquanto na Idade Média havia uma tendência a exaltar a natureza pecadora do humano, no Renascimento este humano passa a ser valorizado, sendo entendido como um ser grandioso e valioso. Esta noção já vem expressa, inclusive, no título de sua mais importante obra, “Sobre a dignidade do homem”.
Título de uma de suas mais importantes obras, “Sobre a dignidade do homem”, aponta para a capacidade que este humano possui de autodeterminação e também de criação a partir da transformação que possa exercer sobre a natureza ao seu redor. Nesta obra percebemos a mudança de ênfase do teocentrismo anteriormente presente nos filósofos medievais, para a nova visão do humano presente no Renascimento, onde passamos a ter um antropocentrismo.
Em sua obra destaca que é pelo uso da razão que este humano tende a tomar consciência de sua liberdade e por tal modo temos presente a dignidade humana. Este humano na escala da criação, encontra-se entre os anjos e o mundo natural, sendo mediador justamente por possuir a capacidade de construir a si próprio. O animal só pode ser aquilo mesmo, não evoluindo, preso a sua natureza, da mesma forma que o anjo, nada mais pode ser além de anjo. Mas o humano é diferente, pois nele há um poder que se assemelha ao divino, que lhe permite ser quem este quiser ser, se autoconstruindo no decorrer de sua vivência. Por não possuir seu destino previamente traçado, podendo escolher viver como um animal na natureza ou se aproximar do divino, este mesmo humano possui uma dignidade que lhe é própria, sendo o mais digno de toda criação de Deus.
O humano é o grande milagre na criação de Deus justamente porque todas as demais criaturas, ao nascer, já possuem um destino traçado que não poderá ser modificado, estas demais criaturas são o que são e não podem ser outra coisa além do que lhes é dado por seu destino ao nascer, diferentemente do humano, que possui a capacidade de escolher por meio de sua razão, se irá viver no nível da natureza dos demais animais ou se irá viver de modo a se aproximar de um ser divino. Não estando, portanto, preso e ocupando um lugar fixo na cadeia de criação feita por Deus.
O humano possui uma natureza indeterminada, indefinida, já todos os demais seres, estejam abaixo (animais, plantas) ou acima (anjos) do humano possuem uma natureza determinada, fixa, necessária, não livre. Um gato é um gato e um cão é um cão, e nada mais, pois suas naturezas são determinadas e definidas desde o nascimento, isto não ocorre com o humano. O humano é livre, capacidade esta que nem os anjos possuem. A tese presente na dignidade do homem é que o humano é um milagre vivente. O humano é um ser intermediário entre o tempo e a eternidade.
Tendo Deus feito toda sua obra maravilhosa de criação, encontrou um lugar e destino para cada elemento nela presente, fossem astros, anjos, animais ou plantas, mas faltava algo. Faltava alguém fora da cadeia de criação, que tivesse a liberdade de contemplar a obra majestosa da criação e admirá-la. Neste momento Deus cria o humano, um milagre. O humano é o último ser a ser criado e não possui um lugar fixo na criação, pois, esta já estava realizada quando ele foi criado. O humano em si mesmo é um milagre que por meio da sua razão pode escolher como viver, se como animal ou como ser divino, um ser com liberdade, e que pode contemplar a criação de Deus e se maravilhar da mesma.
Silvério da Costa Oliveira.
Prof. Dr. Silvério da Costa Oliveira.
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