Por: Silvério da Costa Oliveira.
Jan Hus, ou Jan Huss (em tcheco)
John Hus, ou John Huss (em inglês)
João Hus, ou João Huss, ou João Ganso (em português)
John Hus (Husinec, Boêmia, 1369, 1372 ou 1373 – Constança, 6 de julho de 1415) anteriormente era conhecido como Jan Husinecký, ou, em latim, Johannes de Hussinetz. Hus ou Huss é a abreviatura, feita por ele mesmo, da “cidade” onde nasceu, Husinec (que significa terra dos gansos, em tcheco). Filho de camponeses, se formou em Artes/Letras e Teologia, tendo sido ordenado sacerdote da Igreja Católica Apostólica Romana em 1400. No ano de 1401 ocupou o cargo de reitor da faculdade de filosofia. Em 1402 foi nomeado pregador da igreja de Belém, em Praga. Entre 1409 e 1410 foi eleito e ocupou o cargo de reitor da universidade Charles (Carlos), de Praga, onde também atuou como mestre. Foi acusado de heresia e excomungado pela Igreja no ano de 1412 e queimado na fogueira em 6 de julho de 1415.
Hus foi condenado pelo Concílio de Constança. Ocorre que na época estava ocorrendo o “cisma do ocidente”, situação na qual havia três papas em exercício em cidades diferentes da Europa (por Avignon, papa Bento XIII; por Roma, papa Gregório XII; por Pisa, papa João XXIII). O Concílio de Constança foi organizado em 1414 para resolver esta situação (convocado pelo papa João XXIII, único a comparecer. Os outros dois papas também foram convidados, mas não compareceram ao concílio) e aproveitou, também, para julgar casos de heresias, dentre os quais o de Hus. Quando convocado a se apresentar no Concílio, foi munido de um salvo-conduto dado pelo então rei Sigismundo de Luxemburgo, pelo qual poderia se apresentar e defender suas ideias, mas tal salvo-conduto não foi obedecido, tendo sido Hus preso e julgado, ficando assim por sete meses, quando então foi condenado à fogueira.
Quando atuava na universidade de Praga, seus professores e alunos estavam divididos entre os que defendiam o nominalismo e os que defendiam o realismo em filosofia. Quando as obras de Wycliffe começaram a ser discutidas na universidade (trazidas por Jerônimo de Praga em 1402, após seus estudos em Oxford), seu nome foi associado ao realismo, corrente filosófica que naquele momento histórico não estava na moda pelos pensadores de origem alemã. Parte do corpo docente e discente era de origem alemã e adotava o nominalismo, se opondo neste tocante também às ideias realistas de Wycliffe, consideradas por estes como ultrapassadas. Ocorre que os professores e alunos de origem tcheca se identificavam com o realismo e ficaram encantados ao descobrir um pensador proveniente de um centro cultural respeitável, a prestigiosa universidade de Oxford, um famoso mestre, que também defendia ideias baseadas no realismo em filosofia. Os alemães tendiam a ver nos tchecos um grupo de bárbaros antiquados que precisavam se atualizar no tocante as principais ideias em voga na filosofia e na teologia. Estava instaurado o conflito, de início, com forte base em questões e discussões acadêmicas. Este conflito iria se ampliar, incluindo o apoio ou a neutralidade na questão envolvendo os três papas então existentes (o cisma papal, de 1378 a 1417), o rei Venceslau havia exigido neutralidade do corpo docente da universidade de Praga, o que os tchecos fizeram, mas não os de origem alemã, que apoiaram o papa da cidade de Roma, Gregório XII. Isto desagradou o rei, pois, este papa não o apoiava em seu governo, o que culminou com a saída do corpo docente e discente de origem alemã da universidade de Praga no ano de 1409, que posteriormente fundaram a Universidade de Leipzig.
Huss atuou como reformador religioso tcheco, tendo como base de suas ideias o pensamento de John Wycliffe. Teve vários seguidores, os quais eram conhecidos como Hussitas. Foi preso e condenado a ser queimado vivo em uma fogueira, quando da execução de sua sentença, ficou cantando o “Cântico de Davi” (Jesus filho de Davi tem misericórdia de mim).
Após sua morte os conflitos na Boêmia se intensificaram, culminando na Revolução Hussita. Suas ideias não foram interrompidas e seus seguidores na Boêmia participaram de várias batalhas, no que caracterizou as guerras Hussitas, que começaram por volta de 1419 e se estendem até 1434, com um acordo em novembro de 1436.
Hus defendia o sacerdócio universal dos crentes e adotava para si algumas das ideias presentes no pensamento de John Wycliffe. Entendia que a Bíblia tinha primazia sobre qualquer outra autoridade da Igreja, defendia a justiça social e uma sociedade igualitária, bem como, também defendia a comunhão dada a todos. Criticou o poder terreno da Igreja em prol da justiça social. Hus só reconhecia os Escritos Sagrados como autoridade nas questões de fé. Repudiava os tribunais de inquisição, bem como os juízes terrenos.
Hus criticou a venda de indulgências, criticou a enorme riqueza da Igreja diante da existência da pobreza. Entendia que a comunhão não somente deveria ser dada a todos, mas que deveria incluir para todos o pão e também o vinho. Suas pregações eram feitas na língua tcheca e não em latim, como determinava a Igreja Católica Apostólica Romana na época.
Hus também condenava a prática então comum, de comprar cargos eclesiásticos, conhecida como simonia, e o estilo de vida imoral e corrupto do clero de sua época, pois, Hus pensava que o religioso deveria levar uma vida simples, de pobreza e de humildade, coerente com os ensinamentos das Sagradas Escrituras.
Hus entendia que a situação vivida pelo mundo cristão de sua época era um indício da vinda do anticristo. Defendia um mundo de justiça social, sem a exploração e miséria a qual estavam então submetidos os camponeses da Boêmia.
O trabalho desenvolvido por Hus também exerceu forte influência na fixação da ortografia e na reforma da língua literária tcheca. Hus é o responsável pela introdução do uso de acentos na língua tcheca, de modo a fazer corresponder cada som a um único símbolo.
Alguns comentadores defendem que Hus entendia que as mulheres tinham direitos já presentes na Bíblia, pois, também foram feitas à imagem e semelhança de Deus e nada devem temer ao homem. Segundo sua opinião, as mulheres poderiam pregar o evangelho e também lutar em batalha, o que de fato ocorreu após sua morte, pois, mulheres participaram das guerras hussitas.
No tocante a transubstanciação do pão e vinho na eucaristia, negada por Wycliffe e posteriormente por Lutero e os demais membros da reforma protestante no século XVI, Hus adota uma posição teológica na qual aceita o entendimento católico sobre a transubstanciação, apesar de negar que o sacerdote tenha o poder de realizar a transubstanciação. Já com relação à doutrina protestante de sola fide, ou seja, que só há salvação pela fé, negando a prática das obras para a salvação, entende que a caridade desempenha, sim, um importante papel instrumental na justificação dos pecadores. Hus também criticou a veneração dos santos e de Maria.
Há a crença de que quando estava para ser queimado, no ano de 1415, fez a seguinte profecia: "Vocês hoje estão queimando um ganso, mas dentro de um século, encontrar-se-ão com um cisne. E este cisne vocês não poderão queimar." Esta frase foi direcionada ao seu carrasco e o termo “ganso” é o significado de “Hus” na língua boêmia e como ele era conhecido. Exatos 102 anos depois, no ano de 1517, Martinho Lutero prega na porta da Igreja do castelo de Wittenberg as suas famosas 95 teses sobre a venda de indulgências, que há de começar a reforma protestante, deste modo, a profecia é associada a Lutero, que passa a ser entendido como o “cisne”. Há, no entanto, os que defendem que no lugar de pronunciar tal frase, teria escrito algo semelhante falando sobre pássaros, numa carta que escreveu durante a sua prisão, a esperança de que “pássaros” mais fortes do que ele surgiriam para continuar seu trabalho.
Silvério da Costa Oliveira.
Prof. Dr. Silvério da Costa Oliveira.
Site: www.doutorsilverio.com
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